G20 dá apoio para reforma de fundos climáticos

Proposta estimula países a compartilhar experiências sobre bioeconomia; participação do Brasil no grupo tem amparo constitucional, avalia Instituto dos Advogados

99
Reunião do G20, em Bali, Indonésia (Foto: Xu Qin/Agência Xinhua)
Reunião do G20, em Bali, Indonésia (Foto: Xu Qin/Agência Xinhua)

O Grupo de Trabalho de Finanças Sustentáveis do G20 (SFWG, na sigla em inglês) terminou na quarta-feira a última reunião sob Presidência brasileira, em evento sediado no Rio de Janeiro. Segundo os coordenadores do grupo, a principal entrega é um relatório com recomendações para reformar os fundos ambientais e climáticos. O documento foi encomendado pelo GT a especialistas no tema.

Desburocratizar o acesso do chamado Sul Global aos fundos sempre foi uma das prioridades do Brasil. Atualmente, quatro dispositivos multilaterais financiam a maioria dos projetos que tentam frear a crise climática: o Fundo Verde para o Clima (Green Climate Fund); Fundo de Investimento Climático (Climate Investment Funds); Fundo de Adaptação (Adaptation Fund) e o Fundo Global para o Meio Ambiente (Global Environment Facility).

Os critérios para conseguir recursos desses fundos são considerados burocráticos e difíceis pela maioria dos países do Sul Global, o que o Brasil espera que mude a partir das reuniões no âmbito do G20.

“Nós priorizamos usar o capital político do G20 para impulsionar uma transformação dos principais fundos climáticos e ambientais do mundo. Não é algo trivial o que a gente conseguiu aqui. Temos uma agenda de implementação pela frente, mas a gente conseguiu que todos os membros do G20 apoiassem uma agenda de reforma da arquitetura financeira climática”, disse Ivan Oliveira, coordenador do grupo e subsecretário de Financiamento ao Desenvolvimento Sustentável do Ministério da Fazenda do Brasil.

Espaço Publicitáriocnseg

“Isso se conecta fortemente com uma agenda de solidariedade da política externa do presidente Lula. Essa é uma entrega substantiva e que tem um potencial de destravar o sistema, para que de fato os bilhões de dólares que a gente tem alocado nesses fundos cheguem aos países que precisam, de forma mais rápida e efetiva”, complementou Oliveira.

O Grupo de Trabalho Finanças Sustentáveis foi criado para mobilizar finanças sustentáveis como meio de garantir o crescimento e a estabilidade globais. A ideia é promover transições para sociedades e economias mais verdes, resilientes e inclusivas. O grupo tem a missão de identificar barreiras institucionais e de mercado a estas finanças.

A declaração estabelece 10 princípios para desenvolver a bioeconomia no mundo. A elaboração do documento é resultado das discussões da 4ª reunião da Iniciativa do G20 sobre Bioeconomia (GIB), que vinha ocorrendo no Rio de Janeiro desde o início da semana.

O Brasil, que atualmente preside o G20, celebrou o consenso em torno do texto como uma conquista histórica. A bioeconomia é um conceito que envolve inovações fundamentadas em recursos biológicos, que resultam no desenvolvimento de produtos, processos e serviços mais sustentáveis. Uma das principais discussões associadas ao tema é a substituição de matérias-primas de origem fóssil por outras menos poluentes.

“É a primeira vez que o tema da bioeconomia é objeto de um documento multilateralmente acordado”, diz nota divulgada pela Presidência brasileira no G20.

“A bioeconomia funda-se na ciência mais avançada e no conhecimento tradicional construído ao longo de séculos por povos indígenas e comunidades tradicionais, e representa um caminho promissor para a transição ecológica rumo a uma economia global mais sustentável e inclusiva”, acrescenta o texto.

Intitulada “Princípios de Alto Nível sobre Bioeconomia”, a declaração estabelece a concordância entre os países em desenvolver esforços para erradicar a fome e a pobreza, incluir os povos indígenas e comunidades locais, mitigar os efeitos das mudanças climáticas globais, contribuir com a conservação da biodiversidade, promover padrões de consumo e produção sustentáveis, usar metodologias transparentes para avaliar a sustentabilidade das cadeias de valor e alavancar a inovação através da cooperação internacional, entre outros tópicos.

A criação da GIB para debater questões relacionadas com a bioeconomia é uma das novidades apresentadas pela Presidência do Brasil no G20. Ele surge com a proposta de estimular os países a compartilharem experiências bem-sucedidas relacionadas com o tema.

No G20, têm assento as 19 maiores economias do mundo, incluindo a União Europeia e mais recentemente a União Africana. O grupo se consolidou como foro global de diálogo e coordenação sobre temas econômicos, sociais, de desenvolvimento e de cooperação internacional.

Em dezembro do ano passado, o Brasil sucedeu a Índia na Presidência. É a primeira vez que o país assume essa posição no atual formato do G20, estabelecido em 2008. No fim do ano, o Rio de Janeiro sediará a Cúpula do G20, e a Presidência do grupo será transferida para a África do Sul.

A 4ª reunião da GIB contou com a presença da ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva.

“Nos dedicamos à troca de experiência entre os países, abordando temas fundamentais, como as economias florestais, o uso estratégico da biodiversidade, incluindo o seu patrimônio genético e o conhecimento tradicional associado à biotecnologia, à bioindustrialização e à biossegurança, entre outras áreas essenciais. Nosso propósito hoje é estabelecer princípios orientadores que servirão como base para o desenvolvimento da bieconomia, em suas diversas vertentes”, afirmou Marina.

A participação do Brasil no G20 e a liderança assumida pelo país na Presidência do grupo convergem com os objetivos de protagonismo internacional previstos na Constituição da República. É o que dizem as análises das Comissões de Direito da Integração e de Direito Administrativo do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), aprovadas ontem pelo plenário da entidade.

A relatora pela Comissão de Direito da Integração, Elian Araújo, pontuou que a Carta Magna estabelece dentre os princípios que regem as relações internacionais a autodeterminação dos povos, a igualdade entre os Estados e a defesa da paz. Segundo ela, a atuação brasileira na Presidência do G20 está alinhada com tais objetivos. “Isso significa que o Brasil deve buscar a defesa dos direitos humanos, promover a igualdade entre os Estados e buscar a solução pacífica de conflitos”, defendeu.

A advogada ainda apontou que a Constituição também estabelece que o Brasil deve buscar a integração econômica, política, social e cultural com os demais países da América Latina e do Caribe, bem como com os países africanos de língua portuguesa: “Essa busca por parcerias e cooperação regional e sul-sul mostra o compromisso do Brasil em promover a governança global e fortalecer a sua posição como um ator internacional relevante”.

Os objetivos constitucionais, de acordo com ela, terão eco na Presidência brasileira no G20, visto que o país poderá liderar e influenciar as agendas e decisões do grupo, promovendo temas de interesse nacional e regional. “Além disso, a realização do evento no Brasil certamente trará benefícios econômicos, como o estímulo ao turismo e o fortalecimento da imagem do Brasil como um país capaz de sediar grandes eventos internacionais”, ressaltou.

Analisando a temática sob a ótica do Direito Administrativo, Kézia Sayonara Medeiros apontou o conceito de Direito Administrativo Global (DAG) como relevante para pensar os processos de governança global. As práticas sugeridas pelo DAG, segundo ela, tratam dos fatores de dependência mútua oriundos da globalização, evitando “desequilíbrios nas relações e prejuízos a direitos fundamentais locais”.

Na visão da advogada, o direito brasileiro, especialmente na iminência do encontro do G20 deste ano, deverá se ocupar de pontos de contato entre os países nas ordens cultural, ética e moral, “a fim de otimizar diálogos e adaptar o sistema brasileiro ao DAG, cuja abordagem técnica vem sendo realizada à luz do transconstitucionalismo, que tem por desígnio promover ‘conversações constitucionais’ através de entrelaçamentos de diversas ordens jurídicas”.

Ambos os pareceres sugerem que o IAB se voluntarie na colaboração das atividades do G20. Kézia Medeiros sublinhou que os integrantes das comissões temáticas podem ser ouvintes ou membros em comitês de debate do encontro, além de poderem também contribuir para a estruturação de documentos relacionados ao evento.

Presidente da Comissão de Estudos sobre a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável/ONU, Valéria Sant’Anna apresentou parecer para demonstrar as atividades realizadas pelo grupo com o objetivo de colaborar para os debates relacionados à integração regional. Ela pontuou que a comissão realizou três eventos voltados ao tema desde sua criação, em 2019. No primeiro deles, disse ela, “era confirmado pela ONU o ingresso do Instituto dos Advogados Brasileiros no Pacto Global”.

Segundo o parecer, o Pacto Global transcende a Agenda 2030/ONU e estabelece como princípios a Declaração Universal de Direitos Humanos; a Declaração da Organização Internacional do Trabalho sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho; a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento; e a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção.

O relator da indicação que deu origem aos pareceres, Sérgio Sant’Anna, reiterou o amparo constitucional tido pela Presidência e pela participação do Brasil no G20. Na opinião dele, a liderança nacional do grupo, que é inédita, marca um momento histórico na retomada do protagonismo do país no cenário internacional, após alguns anos sem perseguir a integração regional como objetivo da política externa.

Com informações da Agência Brasil e da Agência de Notícias Brasil-Árabe

Leia também:

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui