Com absoluta certeza algo de muito positivo ocorreu com toda essa situação que vivenciamos a quase dois anos, e não digo isso sem propriedade, pois em meu formato de negócios lido com uma infinidade de empresas, dos mais variados portes, e com diversos modelos de gestão. Obviamente que aquilo de positivo citado, não traz de forma alguma um entendimento que despreza todos os aspectos negativos, quer seja esse elemento prejudicial econômico, social, ou particular/específico, mas nosso ponto aqui é falarmos de gestão, de entidades empresariais e de gestores.
É ímpar e notório que, não necessariamente por vontade, mas sim por necessidade, várias organizações se voltaram para o gerenciamento interno, cuidando mais dos aspectos do negócio, zelando mais por seus clientes, se colocando mais aberta às negociações, as circunstâncias, e criando um ambiente muito mais direcionado para elementos de gestão. Contudo, essa motivação não foi criada, como já elucidado, por vontade, e sim por inevitabilidade, sobrevivência, e aqui criou-se uma imensa lacuna entre a gestão e o profissional que exerce a gestão.
O problema criado pela necessidade urgente de mais controle foi de encontro com a fragilidade de processos, pessoas e ferramentas, e para que esse controle seja exercido com eficiência (rápido) e eficácia (certo) esbarramos em muitos conflitos, do mais simples aos mais complexos. Podemos, por exemplo, citar que muitas empresas ainda não possuíam o mínimo de projeção de fluxo de caixa, ou não tinham a menor noção dos seus índices de lucratividade e rentabilidade, tampouco sabiam distinguir se seria necessário captar recursos de terceiros, vender mais, reter mais, dar descontos, preservar contratos a qualquer custo. Muitos foram os questionamentos e todos acabaram se afunilando em um único ponto: o gestor. Afinal de contas, como gerenciar, ser o gestor? Quem gerencia o que e quando? E de que forma?
Gerenciar não é o ato de conduzir os melhores recursos tendo as melhores pessoas e contando com as melhores ferramentas; gerenciar, ser gestor é justamente o contrário, é ser capaz de conduzir os resultados em um ambiente menos favorecido, onde recursos são escassos, onde as pessoas ainda não estão prontas e num ambiente que as ferramentas não resolvem todas as coisas. Aqui mora o problema: do dia para a noite encaramos a necessidade de fazer gestão, mas esquecemos de criar, de preparar os gestores, e nos deparamos com um ambiente altamente complexo, desde o comportamento ao resultado proposto.
Sim, esquecemos de fazer gestores, e só gestores praticam a gestão. Para que isso ocorra, são necessários vários atributos, técnicos, comportamentais, motivacionais, de resultado, de escolha, de responsabilidade. Queremos mais gestão e menos desculpas, mas estamos em uma fase em que todos têm desculpas para tudo, o que faz o ato de gerenciar enfraquecer, e por consequência fragilizar o ambiente empresarial.
O essencial não é a gestão, é o gestor. Essa pequena frase resume e responde a muitos dos problemas que diversas empresas tiveram e ainda tem, porque não basta ser líder, não basta ser chefe, é preciso e necessário ser ambas as coisas, pois há momentos que não temos tempo hábil de fazer que sigam conosco pelo exemplo, e sim pelo comando, e há outros em que pelo exemplo se demonstra o caminho. O ponto é que aceleramos por dois anos a correção de um déficit de capacitação que só se alcança, estatisticamente falando, em dez, doze anos (período mínimo de uma graduação, de uma especialização, mais um mínimo de prática de mercado).
O essencial está sem a essência, então temos, sim, um enorme desafio, que é capacitar líderes/chefes. Pessoas capazes de interpretar cada momento, cada situação, cada possibilidade. Pessoas capazes de decidir, de assumir riscos, de aprender, repreender, reaprender, ensinar, adaptar, enxergar limites.
Não temos fórmulas milagrosas para ambientes que necessitam de gestão, tudo se pode, nem tudo se deve, e nesse difícil caminhar de riscos, caberá ao gestor determinar o que se apresenta como oportunidade e o que está revestido meramente por um entendimento circunstancial.
Oportunidade e circunstância são díspares. Oportunidade é o que se busca, baseado em métricas, em análises, em informações capazes de medir resultados. Circunstâncias são as tentativas de se encontrar a possibilidade em tudo aquilo que se apresenta. Dar o entendimento de uma mera fase circunstancial como uma oportunidade longínqua, pode ser um grande erro conceitual, que pode estar motivado pelo fato destacado nesse breve artigo, pois estamos buscando o essencial sem essência.
Não digo aqui que nossos gestores são ruins, incapazes, ou despreparados, mas afirmo que por uma necessidade externa, que fugiu de nosso controle, necessitamos fazer doze anos em dois, e que agora o mais importante é o acompanhamento mais exato, mais curto, mais preciso, adaptando todos os dias, modificando formatos sempre que necessário, mas sempre, sem exceção, com essência.
Busquemos nossos propósitos, e nada mais precisamos buscar. Busquemos gestores capazes de avaliar oportunidades e circunstâncias, e por fim, que possamos entender que fórmulas milagrosas não se traduzem em oportunidades, são meros formatos circunstanciais, que você leitor até pode aproveitar, mas fatalmente não irá perpetuar nele, e um dos quesitos elementares para um bom gestor, é visão de longo prazo, com ações de curto prazo que motivam e buscam aquele propósito que lá está, cinco, dez, quinze anos à frente.
Sérvulo Mendonça é fundador e CEO do Grupo Epicus.