Governo prepara MP para recalibrar IOF e aumentar arrecadação

Bets também serão tema de medida anunciada por Haddad; 'proposta de IOF sobre ativos virtuais é vista como ilegal e agrava insegurança no setor', diz especialista

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Fernando Haddad na sanção da reforma tributária (Foto: Ministério da Fazenda)
Fernando Haddad na sanção da reforma tributária (Foto: Ministério da Fazenda)

O Governo Federal enviará ao Congresso Nacional Medida Provisória voltada para o mercado financeiro, anunciou ontem à noite o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, depois de reunião com os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).

“É uma medida que corrige distorções no sistema de crédito, na cobrança de impostos de rendimentos sobre títulos e temas afins. Inclusive vai entrar um aspecto na questão das bets”, disse Haddad. “O que essa medida provisória vai nos permitir? Recalibrar o decreto do IOF, fazendo com que sua dimensão regulatória seja o foco da nova versão e possamos reduzir as alíquotas previstas no decreto original, que vai ser reformado conjuntamente”.

Entre as mudanças, segundo Haddad, está o fim da parte fixa do risco sacado e a recalibração da parte diária.

“Todos os itens vão ser revistos”, disse.

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O ministro afirmou ainda que a MP passará a cobrar tributo de 18% sobre o Gross Gaming Revenue (GGR) das empresas de apostas (ou seja, sobre a diferença entre o que as bets arrecadam e aquilo que elas pagam de prêmio), em vez dos 12% cobrados atualmente. Além disso, a medida tributará títulos que hoje são isentos, como LCA e LCI, em 5%.

“Eles continuarão a manter uma distância grande em relação aos títulos públicos em geral, mas não permanecerão mais isentos, porque estão criando uma distorção no mercado de crédito no Brasil, inclusive com dificuldades para o Tesouro Nacional”.

A Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) cobrada de instituições financeiras passará a ser de 15% ou 20%. A taxa de 9% não existirá mais.

Haddad explicou ainda que há um compromisso de reduzir gastos tributários em pelo menos 10% de natureza infraconstitucional e de conversar, com o Congresso, sobre gastos primários.

“A questão do gasto primário, tem muitas iniciativas que já mandamos para o Congresso. Algumas já estão em tramitação. O que nos dispusemos a fazer é fazer uma nova reunião sobre gasto primário, mas já tendo um feedback das bancadas sobre os temas que vão ser enfrentados”.

O ministro explicou que mostrou ao Congresso as evoluções de despesas obrigatórias, contratadas no passado por governos, que hoje estão pressionando as receitas da União.

“São despesas contratadas quatro, cinco, seis anos atrás e que a conta está chegando sem que a fonte de financiamento dessa despesa tenha sido contratada no mesmo momento”, disse. “Às vezes eu vejo no jornal: ‘está tendo uma gastança’. Mas quando foi contratado o gasto? Qual era a previsibilidade que nós tínhamos?”

O presidente da Câmara, Hugo Motta, disse que o decreto do IOF causou um grande incômodo no Congresso Nacional.

“Tanto na Câmara como no Senado, o ambiente se tornou muito adverso a essa medida. E nós colocamos que essa medida precisaria ser revista. Com o governo, atendendo a posição do presidente do Senado e do presidente da Câmara, hoje trouxe essa alternativa, de que o decreto será refeito, com uma calibragem diminuindo de forma significativa seus efeitos”.

Segundo Motta, a MP traz uma compensação financeira para o governo, mas “muito menos danosa do que seria a continuidade do decreto do IOF, como foi proposto de forma inicial”.

O presidente da Câmara afirmou ainda que o Congresso fará, nos próximos dias, uma revisão das medidas de isenção fiscal, que segundo o Governo Federal, pode chegar a R$ 800 bilhões.

A proposta ventilada por Hugo Motta, de ampliar a cobrança do IOF para incluir operações com ativos virtuais tem gerado forte reação no setor de criptoativos. Apresentada como alternativa ao aumento linear de 3,5% sobre operações de câmbio e cartões, a medida é considerada inconstitucional e contrária às melhores práticas regulatórias globais.

Especialistas afirmam que a proposta não apenas carece de base legal, como também agrava a insegurança regulatória em um setor ainda em consolidação.

“A tentativa de tributar operações com ativos virtuais deturpa a natureza jurídica e a finalidade extrafiscal do IOF. Trata-se de um esforço puramente arrecadatório, disposto a contornar a legalidade em prol de um Estado excessivamente gastador que se recusa a cortar primeiro das próprias regalias”, aponta Pedro Torres, advogado especializado em blockchain e criptoativos.

A motivação por trás da proposta, segundo o advogado, está relacionada ao uso crescente de stablecoins – criptoativos pareados ao dólar – como alternativa para reduzir a incidência de IOF em operações de câmbio. No entanto, o sentimento é de imposição de um ônus fiscal desproporcional. “Não faz sentido tributar um mercado ainda sem definição jurídica adequada. Primeiro impõe-se a construção de um arcabouço normativo-regulatório robusto, capaz de conferir segurança jurídica e previsibilidade a todo o ecossistema. Não faz sentido marcar falta em um jogo que ainda não começou”, argumenta.

O IOF, instituído pela Lei nº 5.143 de 1966, tem função híbrida – arrecadatória e regulatória – e incide sobre operações de crédito, câmbio, seguros e títulos ou valores mobiliários. O imposto pode ter suas alíquotas moduladas por decreto presidencial, o que lhe confere flexibilidade como instrumento de política econômica. Ainda assim, sua aplicação é limitada por exigências constitucionais.

“O texto legal não menciona ativos virtuais – e nem poderia, pois estes sequer integram formalmente o Sistema Financeiro Nacional. Qualquer tentativa de alargar a base de incidência exigiria nova lei aprovada pelo Congresso, em respeito ao princípio da legalidade estrita”, destaca Torres. “Além disso, a regulamentação cambial em vigor confirma que stablecoins não se enquadram como moeda estrangeira. A Resolução BCB 277/2022 apenas faz referência genérica à compra ou venda de moeda estrangeira, sem contemplar ativos virtuais”, aponta.

Para ele, impor um ônus fiscal desproporcional a um mercado que ainda busca estabilidade regulatória é um contrassenso, que apenas penaliza a inovação e afasta investimentos.

“Antes de discutir qualquer tipo de tributação sobre criptoativos, é essencial que o Brasil avance em um marco regulatório claro e juridicamente sólido, que delimite responsabilidades, proteja os usuários e incentive o desenvolvimento tecnológico do setor”, complementa.

Com informações da Agência Brasil

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