Conversamos sobre a Haribo com Alexandre Nedel, CCO (Chief Commercial Officer) da operação brasileira da companhia alemã, fundada em 1920, líder mundial na categoria de bala de gelatina.
Como a Haribo avalia a competição nesse mercado?
O mercado brasileiro é bastante complexo. A categoria de balas de gelatina vem crescendo entre 25% e 30% por ano, pois está havendo uma migração do antigo pirulito, da bala dura e da bala mastigável para a bala de gelatina. Esse é um mercado que vem se desenvolvendo, mas isso, logicamente, chama a atenção de novos players brasileiros e estrangeiros. Nesse momento, nós estamos trabalhando muitos mais o conceito de ampliação da categoria, de criação de novos pontos de venda e de produtos, e de presença mais efetiva em vários eventos como Páscoa, São João, Dia da Criança, Black Friday, Natal ou até Volta às Aulas.
Essa é uma categoria bastante competitiva, e ela vai se tornar ainda mais competitiva lá na frente, porém, diferente de outros segmentos que já vêm caindo e que possuem uma tendência de queda e uma canibalização maior, essa categoria cresce e é lotada de oportunidades. Por exemplo, o consumo per capita por ano na Alemanha é de 3 quilos, enquanto no Brasil é de 80 gramas.
Falando um pouco dos consumidores, nós temos pesquisas que indicam que 43% dos consumidores dessa categoria buscam por novidades, já que o brasileiro gosta de inovação. As oportunidades são gigantescas para quem conseguir inovar, tiver produtos relevantes e estiver bem conectado com o consumidor.
Como se ganha e se mantém um cliente nesse mercado?
Aqui eu vou dividir os consumidores e os clientes do varejo. Como disse, para um consumidor, a inovação é muito importante. Ele chega na frente de uma gôndola e se pergunta o que há de novo ali. O que ele vai levar para casa para surpreender sua família. Outro aspecto é a qualidade. A Haribo é uma empresa de 100 anos, onde a qualidade é muito importante. Ao abrir um pacote, um consumidor precisa sentir o cheiro e a textura do produto para que possamos garantir a sua fidelização e uma nova compra. Nós também temos a questão da confiança na marca, pois estamos falando de um produto que é comprado pelos pais para os seus filhos.
Com relação aos clientes do varejo, a Haribo trabalha com uma estrutura de distribuição onde damos todo o suporte para que os varejistas tenham um abastecimento correto de produtos e no tempo perfeito, de forma a que eles possam comprar, vender e ganhar, tendo um resultado financeiro importante. Para isso, a Haribo tem uma malha de distribuidores bem robusta.
Como o Brasil possui, segundo estimativas, um milhão de pontos de vendas para atender a categoria de bala, o grande desafio da Haribo é conseguir colocar o seu produto em, aproximadamente, um milhão de pontos de venda, cobrindo o país de sul a norte. Dada a sua complexidade geográfica gigantesca, nós precisamos ter um cuidado enorme para atender, adequadamente, todo o país, que é, praticamente, um continente. Para mantermos essa operação, nós temos a fábrica em Bauru-SP, onde produzimos 100% dos produtos Haribo no Brasil. Nós não temos um único item importado.
O grande ponto, além de adaptar o produto ao mercado brasileiro, é garantir o correto abastecimento do mercado. Nós temos o domínio da nossa cadeia de supply chain bastante forte de forma a que possamos atender toda a demanda do mercado. Como a categoria está crescendo, é muito importante termos toda a cadeia de abastecimento para evitarmos rupturas, perdas de produtos e de vendas, e a frustração de um cliente na ponta.
A fábrica de Bauru atende apenas o Brasil ou atende também a América Latina?
Grande parte da fábrica atende o Brasil, e uma parte dela atende o mercado americano. O mercado latino-americano ainda não é atendido no Brasil. Nós temos um projeto para avaliarmos o atendimento dos mercados colombiano, argentino e mexicano, mas a prioridade é o Brasil e uma operação para atendimento do mercado americano
Como se compõe o público da Haribo?
O nosso público, baseado em pesquisas de perfil, é composto por famílias com filhos. Nós temos o público infantil, que é importante e faz parte da dinâmica, mas, logicamente, incluímos no nosso target as mães e os pais, pois também vemos o consumo dos adultos no nosso segmento. É por isso que nós temos produtos para compartilhar. Abre-se um saco e se compartilha balinhas de sabores como morango, framboesa e limão, o que cria um momento de consumo familiar.
Lógico que nós temos produtos para consumo totalmente infantil, tanto que, por exemplo, no Brasil nós temos duas licenças da Mattel, sendo uma da Barbie e a outra da Hot Wheels, mas, como um todo, nós prezamos a família. A marca visa a alegria infantil, mas também a alegria do adulto, que ao abrir um saco pode se lembrar do seu momento criança. Entre os adultos, eu diria que o consumo é bem equilibrado, com 50% de homens e 50% de mulheres.
Como funciona o marketing da Haribo. Faço essa pergunta, pois não me lembro de alguma vez ter visto uma propaganda dos produtos da companhia.
Bem colocado. No Brasil, nós temos uma operação relativamente nova, que começou em 2016. Você não se lembra de ter visto uma propaganda da Haribo porque não houve. Nós estamos construindo uma jornada de crescimento da marca que passa pelo ponto de venda, trabalhando muito a sua visibilidade, o que é muito importante para os consumidores.
Com relação a qualidade, nós temos trabalhado com sampling em lojas. Como o brasileiro é muito aberto a degustações, na hora em que ele vê uma, ele prova, o que gera uma taxa de conversão bastante elevada, que, segundo as nossas estimativas, é por volta de 50%. Ou seja, a cada dois consumidores que provam o nosso produto, um compra. Comparando com outras categorias e países, essa taxa de conversão é bastante alta. Nós também trabalhamos com mídias digitais.
O desenvolvimento de uma marca é trabalhado com três pilares: inovação, comunicação e distribuição. No Brasil, nós priorizamos a inovação e a distribuição. Como o pilar da comunicação está sendo desenvolvido, nós vamos começar a trabalhá-lo de maneira mais forte, pois não havia sentido em fazer a comunicação da marca se os produtos não tinham uma presença de forma a que fossem encontrados pelos consumidores. Na medida em que a Haribo cresce a sua distribuição, começa a fazer sentido fazer uma comunicação mais forte e mais intensa.
Para o segundo semestre, nós estamos preparando um dos nossos maiores investimentos no aspecto promocional e de comunicação, então você vai começar a ver a Haribo de maneira mais visível.
Você disse que o mercado brasileiro possui, aproximadamente, 1 milhão de pontos de venda para esse tipo de produto. Para a Haribo, todo ponto é ponto ou a marca escolhe pontos específicos?
No Brasil, nós temos uma malha composta por 55 distribuidores, todos eles exclusivos, ou seja, eles trabalham com outras categorias, mas não com uma marca que seja nossa concorrente. Nós temos todo um trabalho de treinamento, desenvolvimento, incentivo e planejamento de negócios para que eles possam chegar no maior número possível de pontos de venda, que se estima em um milhão.
Essa é uma categoria que ainda tem uma concentração em auto serviço, mas nós estamos percebendo que o seu crescimento está fazendo com que ela comece a entrar um pouco mais em pontos como conveniências, padarias e mercearias, pois na medida em que a categoria vai se desenvolvendo e crescendo, nós temos uma distribuição maior em todos os lugares.
Tanto a Haribo como outros players do mercado têm trabalhado aspectos de embalagem, portfólio e desembolso, ou seja, um produto com desembolso menor para um ponto de venda menor. Por exemplo, no mercado americano existem sacos de 1 quilo de balas. Esse não é o perfil do mercado brasileiro, que possui uma embalagem menor. Para um ponto de venda cash and carry, faz sentido ter uma embalagem maior, mas para um auto serviço tradicional, uma embalagem um pouco menor, e para uma mercearia ou padaria, uma embalagem menor ainda, pois o tema desembolso é muito importante no Brasil.
Como se dá a revisão das fórmulas dos produtos da Haribo?
A Haribo é uma empresa global, mas a independência é um dos seus valores. Isso quer dizer que o país tem autonomia no portfólio. Dessa forma, nós adaptamos as nossas fórmulas ao consumidor brasileiro. Para isso, nós fazemos pesquisas qualitativas para que os consumidores possam provar os nossos produtos.
Lá fora, nós temos um portfólio gigantesco, com produtos que vão muito bem em países como França, Alemanha, Inglaterra e Estados Unidos. Quando nós entendemos que um produto pode ser interessante no mercado brasileiro, nós fazemos o seu teste com pesquisas qualitativas para que o consumidor faça a sua aprovação. Como consequência, isso também nos traz uma revisão de fórmula. Além disso, também existe o lado da legislação brasileira, que sempre evolui.
Com relação à qualidade, nós temos um alinhamento muito forte com os fornecedores locais, mas, para que você tenha uma ideia, nós ainda temos alguns fornecedores de aromas que estão na Europa. Por exemplo, logo que um produto é produzido, ele tem uma qualidade “x”. Depois de seis meses, o produto tem que manter a mesma qualidade e sabor, independente do lugar onde ele esteja. Como nós temos um cuidado enorme com qualidade, nós temos que desenvolver fornecedores aqui e lá fora para que possamos entregar um produto de alta qualidade.
Na visão da Haribo, quem não é desse mercado e não entende suas complexidades, acaba achando que deve ser muito fácil produzir e vender “balinha para criança”?
Existem dias em que nós ficamos o dia inteiro provando produtos, então nós podemos dizer que temos o melhor emprego do mundo. Por outro lado, o Brasil é um país super complexo, tanto que todos os diretores da operação brasileira são brasileiros, pois a Haribo da Alemanha entende que para liderar a operação brasileira é preciso de gente com experiência de Brasil.
Inovar no Brasil não é fácil. Às vezes, nós queremos uma nova embalagem ou uma nova textura, mas não encontramos um fornecedor que possa nos entregar uma qualidade a contento. Isso faz com que tenhamos projetos que não foram implementados, pois não estamos prontos para isso. No nosso mercado, o Brasil possui uma indústria muito boa, porém, como nós temos uma marca de altíssima qualidade, isso nos traz uma complexidade adicional para a nossa operação.
A Haribo quer conquistar uma grande fatia de mercado e ter um posicionamento de liderança no país, mas nós pensamos, e aqui entra um pouco da cultura alemã, a muito longo prazo. A Haribo é uma empresa que trabalha com muita consistência, que jamais toma uma decisão de curto prazo que possa prejudicar o longo prazo.