“A equidade de gênero no mundo corporativo ainda está longe de se concretizar nas esferas de maior poder.” Essa é uma das principais conclusões da nova edição da Pesquisa Panorama Mulheres 2025, realizada pelo Instituto Talenses Group em parceria com o Núcleo de Estudos de Gênero do Insper. A partir de uma amostra coletada em 2024 de 310 empresas, de diferentes setores e portes, o levantamento traça um retrato da participação feminina na alta liderança das empresas, além de avaliar as práticas institucionais voltadas à promoção da diversidade.
Entre as 224 empresas que possuem Presidência formalizada, apenas 39 são lideradas por mulheres, o que representa 17,4% do total. O número permanece praticamente inalterado em relação às edições anteriores e reflete uma estagnação no avanço feminino rumo ao topo das companhias. O dado também acompanha a média global apontada pelo Global Gender Gap Report 2023, que estima em 29% a participação de mulheres em cargos de liderança no mundo. No ritmo atual, a paridade levaria mais de 160 anos para ser alcançada.
“Historicamente, os homens chegaram à Presidência com mais facilidade porque sempre tiveram maior acesso a redes de poder e oportunidades de promoção. As estruturas corporativas foram criadas por homens e para homens”, afirma Carla Fava, diretora executiva do Instituto Talenses. Ela destaca ainda que muitas mulheres veem no empreendedorismo uma alternativa para conquistar espaços de liderança com mais autonomia e menos dependência de estruturas excludentes, diante das barreiras enfrentadas no ambiente corporativo, como o teto de vidro, viés inconsciente, falta de flexibilidade para equilibrar trabalho e vida pessoal, entre outras limitações.
A pesquisa também mostra que cerca de 90% das Presidências, tanto femininas quanto masculinas, continuam sendo ocupadas por pessoas brancas, reiterando o padrão homogêneo que domina a alta gestão brasileira. Mulheres indígenas, pretas e amarelas seguem praticamente invisíveis nesses espaços.
“Embora muitas vezes se trate a agenda de gênero como um tema já superado, os dados mostram o contrário. Observamos uma estagnação preocupante na subrepresentação feminina, que persiste ao longo do tempo – especialmente no caso de mulheres negras, indígenas e com deficiência. Isso evidencia um problema ainda não resolvido. Mas se a pesquisa aponta desafios, ela também revela caminhos: sabemos que ações estruturadas, aliadas a compromissos públicos, são fundamentais para promover avanços concretos”, afirma a professora Ana Diniz, coordenadora do Núcleo de Estudos de Gênero do Insper.
Nos Conselhos de Administração, a presença feminina também é tímida. Das 61 empresas com Conselhos ativos, apenas 17,1% das cadeiras são ocupadas por mulheres. Em mais da metade desses Conselhos (57,4%) não há nenhuma mulher entre os conselheiros. Mesmo entre empresas que adotam compromissos públicos ou estratégias ESG, a representatividade feminina nesses espaços permanece baixa, reforçando a necessidade de intencionalidade e estrutura. “Um dos pontos que merece destaque é que, embora o percentual geral de mulheres em cargos de liderança já indique uma baixa representação feminina, essa presença ainda é distribuída de forma bastante desigual entre as organizações. Quando olhamos especificamente para Conselhos e Vice-presidências, mais de 55% das empresas não têm nenhuma mulher nesses níveis de gestão”, completa Ana.
Até 2026, as companhias em todos os níveis de listagem da bolsa terão de contar com pelo menos uma mulher e um membro de comunidades sub-representadas no Conselho de Administração ou na Diretoria estatutária. A medida foi proposta pela B3, e avaliada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), para estimular a diversidade na alta liderança das empresas listadas.
“As exigências regulatórias representam um avanço importante, mas não podem ser vistas como solução única. A presença feminina nos Conselhos ainda depende, em grande parte, da vontade política das empresas. Sem metas claras, critérios objetivos e compromisso real da alta liderança, o risco é que a inclusão se limite ao cumprimento formal da regra, sem gerar transformação estrutural,” analisa Carla.
Outro ponto de destaque da edição 2025 da pesquisa é a diferenciação entre lideranças que ascenderam via carreira executiva e aquelas que chegaram à Presidência por meio do empreendedorismo. Entre as mulheres, há uma proporção significativamente maior de trajetórias empreendedoras, indicando que muitas encontram nesse caminho uma alternativa às barreiras corporativas tradicionais. Esse perfil também está relacionado ao porte das empresas. Cerca de 36% das mulheres estão à frente de negócios com até 200 colaboradores, enquanto 40% dos homens lideram grandes organizações com mais de mil funcionários. “Empreender é uma forma de contornar esses obstáculos e construir o próprio espaço de liderança, com mais autonomia e menos dependência de estruturas que historicamente excluem as mulheres”, explica Carla.
A desigualdade de gênero se intensifica à medida que se sobe na hierarquia. Em 2024, mulheres ocupavam apenas 20% dos cargos de Vice-presidência, uma queda em relação aos 34% registrados em 2022. Já nas Diretorias, houve crescimento de 26% para 30%. Ainda assim, 58,9% das empresas não possuem nenhuma mulher na Vice-presidência e 32,5% não têm diretoras. Esses dados evidenciam um funil de liderança que se estreita para as mulheres.
O estudo também investigou a adesão a práticas formais de equidade. Das empresas ouvidas, 54,2% afirmaram ter estratégias ESG estruturadas (apesar de expressivo, o índice marca uma leve queda em relação a 2022, quando o percentual era de 59%), 38,7% adotam compromissos públicos e 54,2% possuem planos de ação voltados à equidade de gênero. Apenas 24,5% reúnem os três pilares. Entre as ações mais comuns estão a revisão de políticas de recrutamento, treinamentos sobre vieses inconscientes, canais de denúncia e flexibilização de jornadas. No entanto, somente 29,2% mencionam políticas de promoção de mulheres a cargos estratégicos.
A pesquisa aponta ainda que empresas lideradas por mulheres tendem a apresentar maior presença feminina em todos os níveis da liderança e governança. No entanto, esse cenário não implica, necessariamente, maior estruturação institucional. Enquanto 61,7% das empresas presididas por homens adotam estratégias ESG, o índice entre as presididas por mulheres é de 59%. Por outro lado, o percentual se inverte quando se trata de planos de ação, com adesão de 64,1% das empresas lideradas por mulheres frente a 60,7% nas lideradas por homens.
A Panorama Mulheres 2025 reforça que, embora o debate sobre diversidade tenha avançado, o topo das organizações ainda é predominantemente masculino e branco. A presença feminina precisa ser acompanhada por políticas concretas, metas bem demarcadas e compromissos institucionais que levem a transformações reais. A combinação entre discurso, estrutura e ação continua sendo o caminho mais promissor para reverter o quadro de desigualdade que persiste no alto comando das empresas brasileiras.
Já pesquisa realizada este ano pela plataforma Infojobs apontou que 72,4% dos entrevistados acreditam que mulheres e homens não possuem as mesmas oportunidades dentro das empresas.
Ana Paula Prado, CEO do Infojobs, acredita que “mesmo com uma maior presença feminina no mercado de trabalho, a equidade plena ainda está distante da realidade de muitas profissionais. Estruturas desiguais continuam refletindo diretamente nas carreiras das mulheres. A pesquisa revela como o mercado evoluiu em alguns aspectos, mas ainda não colocou em prática tantos outros pontos necessários para que as mulheres possam alcançar seu pleno potencial.”
Com a participação de mais de mil pessoas, o estudo revela outro dado alarmante, 66,7% das mulheres acreditam que a maternidade e fatores pessoais externos ainda influenciam negativamente suas chances de contratação ou promoção. Este é um reflexo claro de um cenário que muitas vezes não reconhece o valor do papel multifacetado das mulheres no ambiente de trabalho, em especial quando se trata da conciliação entre carreira e família. Para a executiva, é fundamental que as empresas implementem políticas que realmente compreendam e apoiem as realidades das mulheres, especialmente em relação à maternidade.
Entre os desafios específicos apontados pelas mulheres, destacam-se a falta de reconhecimento e oportunidades de crescimento (49,4%), a diferença salarial entre colegas do gênero masculino (38,1%), e a necessidade de provar mais suas competências do que os colegas homens (34,8%).
Esses dados demonstram que, embora as mulheres ocupem posições significativas no mercado de trabalho, elas ainda são constantemente desafiadas a superar barreiras para atingir o mesmo nível de reconhecimento que os homens.
A pesquisa também revela uma desconexão entre o que as empresas afirmam fazer e o que as mulheres realmente vivenciam. Embora 42,5% das companhias aleguem trabalhar ativamente em temas como combate ao assédio, equidade salarial e de oportunidades, mais da metade dos entrevistados (57,5%) acredita que essas questões ainda não são tratadas de forma eficaz. Para Ana, isso é um sinal claro de que as políticas corporativas precisam ser mais do que apenas discursos: precisam ser aplicadas de forma concreta e eficaz no dia a dia das organizações.
O estudo também evidencia que 66,3% das mulheres acreditam não ter oportunidades em cargos de liderança e investimento em seus desenvolvimentos. Este dado é seguido pela demanda por igualdade salarial e de oportunidades transparentes (55,5%) como uma das mais urgentes. Além desta, políticas de combate ao assédio e apoio à maternidade também são vistas como fundamentais para criar um ambiente mais igualitário e justo.
O Brasil ainda enfrenta uma grande desigualdade de gênero no mercado de trabalho. De acordo com dados do IBGE, embora as mulheres representem 44% da força de trabalho formal, elas ocupam apenas 30% das posições de liderança, um reflexo claro das barreiras institucionais e culturais que precisam ser superadas. Isso não é apenas uma questão de justiça social, mas também um imperativo econômico. Um estudo da McKinsey aponta que, se as mulheres ocupassem a mesma quantidade de posições de liderança que os homens, o Brasil poderia adicionar até 12% ao seu PIB até 2025.
“As barreiras que ainda existem são muitos desafiadoras, mas também oportunidades de transformação. O mercado de trabalho brasileiro precisa disso, e esse processo começa com uma mudança cultural dentro das empresas, que devem ser cada vez mais comprometidas com a equidade de gênero. É essencial que companhias e governos invistam em políticas de inclusão práticas, ou seja, para além do discurso, e que assegurem a igualdade de oportunidades e a valorização das mulheres, não só em cargos de liderança, mas também em todos os níveis organizacionais. Só assim, as mulheres poderão realmente assumir o protagonismo em suas carreiras, contribuindo para um mercado de trabalho mais justo e para o crescimento econômico”, conclui.
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