Impasses da governança corporativa

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Notícias sobre fraudes e conflitos de interesse vindas dos EUA não param de chegar. Testemunhamos casos de analistas de investimentos que emitem opiniões conflitantes com suas convicções, histórias de fraudes contábeis e de favorecimentos pelos que deveriam cultivar sua reputação de isenção perante o público. Estes casos ilustram problemas de governança corporativa.
A governança corporativa consiste no conjunto de regras, procedimentos, atitudes e instituições que condicionam a ação dos administradores no sentido de atender os interesses dos financiadores e das partes interessadas na empresa, particularmente os acionistas. Práticas de governança, juntamente com as leis e a atuação dos tribunais e dos legisladores, visam evitar que uma parte seja expropriada por outra.
No Brasil, como em muitos outros países, o controle das empresas é concentrado. Nisto não há novidade. Pesquisas recentes demonstram que os cinco maiores acionistas detêm na média mais do que 85% do capital votante e que a concentração se mostra elevada seja na propriedade direta das ações da companhia seja na propriedade indireta por meio de uma estrutura de empresas holding.
Esta é também conhecida como estrutura de pirâmide, onde várias holding em sucessão possuem participações umas nas outras, permitindo que o acionista no final da cadeia controle a empresa de capital aberto com menos votos do que seria necessário por lei. A concentração de controle minimiza o conflito de interesses entre os acionistas controladores e os administradores, mas pode aumentar os conflitos entre controladores e acionistas minoritários.
Este conflito vem sendo reconhecido no Brasil e várias iniciativas foram tomadas para mitigá-lo, entre elas a criação do Novo Mercado pela Bovespa, a reformulação da Lei das Sociedades por Ações, novas instruções da CVM e novas regras sobre os investimentos dos fundos de pensão. Além disso, o assunto “governança corporativa” ganhou certa popularidade por meio de seminários, eventos e entidades promotoras das boas práticas no Brasil, como o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.
O conselho de administração é percebido como um dos meios para se implementarem melhores práticas de governança corporativa. Uma das prescrições de todos os manuais de boas práticas é que o conselho tenha muitos conselheiros independentes. A própria Bolsa de Nova York, recentemente, passou a exigir que as empresas que negociam por lá tenham a maioria dos conselheiros caracterizados como independentes e procurou definir o que seria esta independência. No Brasil, como seria de se esperar, a maioria dos conselheiros não é independente e mecanismos que poderiam ser usados para instalar estes conselheiros não são usados.
Entretanto, não há uma relação muito clara entre a composição do conselho e o desempenho financeiro da empresa, o que pode ser um balde de água fria para os entusiastas do conselho independente no Brasil. Resultados de pesquisas recentes nos EUA sugerem que as empresas que apresentam desempenho ruim tendem a aumentar o número de conselheiros independentes mas, surpreendentemente, empresas com mais conselheiros independentes não apresentam desempenho diferente das demais.
Que lições podemos tirar dessas pesquisas para as empresas brasileiras que estão procurando se enquadrar às novas recomendações domésticas e internacionais, modificando seus conselhos? Talvez as empresas devam experimentar formatos de conselho diferenciados em vez de se submeter ao mantra do conselho dominado por independentes, consistentemente com a cultura local.

Ricardo P. C. Leal
Diretor do Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppead/UFRJ).

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