Inovação no varejo tem espaço entre diferentes classes sociais

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Shopping center (Foto: Valter Campanato/ABr)
Shopping center (Foto: Valter Campanato/ABr)

Condições econômicas não são um fator determinante para recursos inovadores

 

Como observadores e estudiosos do varejo, sempre nos perguntamos quais são as condições que incubam movimentos de inovação do mercado, para compreender se, de fato, há um conjunto de condições que favorecem o movimento dos shoppings e varejistas na direção da digitalização. Curiosamente, as palestras, mesas redondas e conversas entre os pares sempre parecem gravitar para uma grande variável: a classe social do público.

Realizamos um levantamento exclusivo e analisamos se havia algum fundamento factual para a sensação predominante no mercado, de que a classe social do público deve corresponder ao nível de investimento em digitalização para o varejo físico.

Iniciando pela indagação mais simples: varejistas e shoppings, focados nas classes A e B+, tiveram um avanço significativo nos processos de digitalização e inovação nestes últimos anos? A resposta é um sonoro “sim”. O volume de dados capturados por shoppings que atendem a classe A subiu anualmente mais de 200% na comparação com o mundo pré-pandemia, o que, por si só, seria suficiente para comprovar a tese.

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As empresas do varejo físico tiveram que modificar seus processos, suas premissas e, principalmente, seus canais de comunicação puxadas por um público que passou a ter mais acesso ao e-commerce, ou seja, consumidores com acesso a crédito e que moram em áreas nas quais as entregas são realizadas sem muitos problemas.

Apesar disso, o ponto do estudo era entender se a variável “classe social do público” era o fator primordial para gerar novos investimentos em tecnologia e digitalização do setor. Para isso, foram criados dois datasets: um para shoppings e outro para varejistas. Usamos como variável alvo o volume de dados captados de clientes anualmente, limitando aos últimos 5 anos, e outras variáveis que pudessem ter influência como classe social do público, volume de vendas anual, margem bruta do varejista, tamanho da administradora que gere o shopping etc. O resultado foi que, tanto para shoppings quanto para varejistas, a classe social do público tem importância, mas está longe de ser a força motriz do processo.

 

Fatores para o investimento

A parte que não surpreende é que a digitalização está principalmente ligada à capacidade de investimento, e isto pode se traduzir de diversas maneiras. Nos shoppings, questões como o total de lojas ou o fato de estar ligado a uma grande administradora têm um peso importante.

Nos varejistas, a capitalização de mercado da empresa, quando disponível, influencia bastante, assim como o número de operações. Em média, esse fator tem uma contribuição oito vezes maior que a classe social do público.

Já aquilo que não deveria surpreender, mas o fez mesmo assim, foi o fato de a competitividade do mercado ter uma influência razoável, em média três vezes maior do que a da classe social do público.

Varejistas em segmentos de margens apertadas, com fortes concorrentes, tendem a avançar mais na digitalização. Shoppings que têm outros shoppings importantes em sua zona de influência ou que ficam em áreas de muita atividade comercial buscam se diferenciar e entender mais o seu público. Por isso, faz todo o sentido empresas que estão em ambientes competitivos buscarem a inovação, e elas estão.

 

Classes que impulsionam a inovação

Por último, a parte mais surpreendente do estudo foi a constatação de que a classe social do público tem influência sobre a inovação, mas não da maneira imaginada na investigação inicial. Shoppings e varejistas que atendem as classes A e B+ se digitalizaram mais que shoppings e varejistas focados nas classes D e E, mas se digitalizaram um pouco menos que os focados nas classes B e C e bem menos do que aqueles que atendem a todas as classes sociais.

Por experiência, é possível afirmar que as classes B e C são mais diversas em termos de características de consumo, pois também contam com empresas que atendem um público mais diverso e extraem mais valor do dado, porque quanto mais elas conhecem o seu público, melhor elas se comunicam e vendem mais.

Lançando um olhar mais amplo para a sociedade, a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2021 mostrou que 90% dos lares brasileiros têm acesso à internet. Segundo a Fundação Getúlio Vargas, o Brasil tem 1,13 smartphone por habitante e, de acordo com o Speedtest, a velocidade média da internet no Brasil bate 22,09 Mbps, o que é mais do que o suficiente para uma pessoa usar o seu celular para participar de um programa de fidelidade, de uma promoção ou realizar uma compra num ambiente físico ou digital.

Finalmente, a nossa análise é de que esta visão turva vem do preconceito de que classes sociais com menos capacidade de compra estão menos digitalizadas e que as empresas que as atendem não precisam passar por este processo. Mas, o preconceito claramente não é verdadeiro. Na minha visão, o dado sempre ganha da opinião e isso é o que o levantamento mostra.

 

Luiz Friedheim é COO da Spot Metrics.

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