Conversamos com Rodrigo Cardoso de Castro, sócio-fundador e CEO do Clube FII, sobre investimentos em fundos imobiliários. Fundado em 2015, o Clube FII possui mais de 354 mil investidores cadastrados.
Como você começou a investir em Fundos de Investimentos Imobiliários (FIIs)?
A minha formação não tem nenhuma relação com o mercado financeiro. Eu sou um cara de TI, e a minha família já investia em imóveis há algumas décadas. Eu comecei a operar no mercado de ações em 2008, no momento da Crise do Subprime nos Estados Unidos, e meses depois conheci os FIIs, que eram uma forma de você participar do mercado imobiliário subtraindo todas as sua inconveniências. Eu me apaixonei, instantaneamente, por esse mercado, que dava acesso a empreendimentos de qualidade, isenção de Imposto de Renda (IR), fracionamento e maior diversificação, e comecei a investir valores pequenos para entender a sua dinâmica. Isso porque, independente de você investir R$ 1 mil ou R$ 100 milhões, o resultado proporcional é o mesmo.
Em 2009, eu sugeri à minha família para que fizéssemos um processo de migração de investimentos, trocando os imóveis que tínhamos por FIIs. A minha sugestão foi aceita, e esse processo foi até meados de 2013. A cada imóvel vendido, nós tínhamos um alívio, pois nos livrávamos de inquilinos problemáticos e de problemas de manutenção.
Quando os imóveis da minha família estavam muito bem alugados, nós tínhamos, no máximo, uma renda de 0,4% ao mês em relação ao valor dos imóveis, mas como ainda tínhamos que pagar IR, isso fazia com que a renda líquida ficasse em torno de 0,3%. Com os FIIs, nós conseguimos empreendimentos de muito mais qualidade sem que tivéssemos que pagar IR, com uma rentabilidade mensal de 0,7%, 0,8%, o que mais do que dobrava a renda da minha família.
Como escolher um FII para investir?
Nós costumamos dizer que não existe o melhor ou o pior fundo, mas o fundo que vai se adequar ao perfil do investidor. Como nós estamos tratando de um mercado que tem lastro imobiliário, é muito mais fácil para o investidor entender esse mercado e, eventualmente, fazer a sua própria análise para ver se aquilo cabe ou não no seu perfil. Um exemplo simples: há um fundo chamado Pátio Shopping Higienópolis que é do shopping de mesmo nome localizado em São Paulo. Eu digo isso, pois em um um FII, você pode, literalmente, entrar dentro dele para ver como ele é. Se a pessoa tiver conhecimento sobre o público que frequenta o shopping e que mora na região de Higienópolis, ela já pode entender se aquilo pode fazer parte do seu perfil de investimento ou não.
Um ponto importante é que por mais que o ativo seja muito bom, ele pode estar sendo negociado por um preço muito alto. É por isso que é muito importante que o investidor tenha acesso a uma casa de research que faça a avaliação do preço da cota que está sendo negociada na Bolsa para saber se é uma boa ou uma má escolha.
Nós também sugerimos que seja feita uma diversificação. Se a pessoa vai entrar no mercado de FIIs, ela deve comprar, pelo menos, 15 FIIs de setores diferentes, como shoppings, lajes comerciais, galpões logísticos e de certificados de recebíveis. Outro ponto: muitos investidores, quando fazem uma análise, costumam olhar para um indicador de forma isolada, quando o importante é olhar para toda a história do FII.
Esse é um mercado tangível, muito mais fácil de ser compreendido e com um número de variáveis infinitamente menor que o mercado acionário, ou seja, ele tem um grau de previsibilidade muito maior.
O nível de complexidade de um fundo aumenta à medida em que ele tem mais imóveis, mas a sua essência é a mesma de um imóvel, ou seja, ele vai comprar um imóvel, alugá-lo e haverá uma renda mensal. A maioria das pessoas sabe, mais ou menos, como funciona essa dinâmica.
Na própria plataforma do Clube FII, nós fornecemos todos os indicadores, informações e análises completas para ajudar os investidores a tomarem suas decisões.
Quais cuidados um investidor deve ter antes de adquirir as cotas de um FII?
Eu vou falar de alguns erros bastante comuns, sendo que alguns deles seriam facilmente evitáveis se o investidor lesse, minimamente, o relatório gerencial do fundo que comprou.
O erro mais comum é olhar apenas os dividendos. Vamos imaginar um fundo que tem um imóvel que está alugado para apenas um inquilino, e que esse inquilino anunciou a sua saída antecipada que vai gerar uma multa. Quando essa multa for paga, o seu valor será distribuído para os cotistas. Esse investidor, que só olha dividendos, vai ver que houve uma distribuição equivalente a 2% da cota, concluir que o fundo dá muito retorno e investir nele. O ponto é que a informação de que o inquilino havia saído e que havia pago a multa estava na primeira linha do relatório gerencial do fundo. Se esse investidor tivesse lido esse relatório, ele teria visto que esse investimento não era sustentável.
Quando um investidor olha apenas para dividendos, ele pode tomar as piores decisões, pois, geralmente, os fundos que possuem os maiores dividendos são os que estão com problemas. Depois de um, dois meses, essa renda pode cair até zero. Como disse, não adianta olhar de forma isolada, pois é preciso olhar o conjunto da obra.
Outro erro bastante comum é o investidor ver que o valor de mercado do fundo está muito abaixo do seu valor patrimonial, concluir que ele está com um desconto muito grande e comprar as suas cotas. Isso aconteceu muito com os fundos que investem em imóveis no Rio de Janeiro. Como a crise imobiliária do Rio foi muito prolongada, e ainda continua muito grave, existem fundos que estão sendo negociados com um desconto muito grande sobre o seu valor patrimonial. O problema é que esses fundos estão com esses descontos há pelo menos 10 anos.
Quando um investidor compra a cota de um fundo descontado, achando que a tendência é que ela se aproxime do seu valor patrimonial, isso pode até acontecer, mas não é uma certeza. Isso pode fazer com que o investidor se frustre, pois o tempo para que isso aconteça pode ser infinitamente maior do que ele esperava.
Outro erro é apostar todos os ovos em uma única cesta. Por maior que seja a qualidade do fundo que está sendo comprado, esse fundo pode apresentar problemas. Eu costumo dizer que a escolha de um FII é como se fosse uma aposta na seleção que vai ganhar a próxima Copa do Mundo. Como você tem uma ideia de quais são as melhores seleções, você sabe em quais vale a pena apostar. Diversificando entre esses players, você tem mais probabilidades de que o seu investimento dê certo, pois não adianta dar tiros aleatórios. Contudo, como pode acontecer de você apostar em um bom time e ele dar errado, como o 7×1 que o Brasil tomou da Alemanha na semifinal da Copa de 2014, se você diversificou o investimento, o impacto no seu patrimônio será muito baixo.
Outro problema é pensar nos FIIs como investimento de curto prazo. Se a renda variável é um investimento de longo prazo, mais ainda são os imóveis. Como você não compra um imóvel para vender daqui a 6 meses, um FII tem o mesmo racional. O investidor vai receber a renda, mas ele não vai ficar milionário investindo em FIIs da noite para o dia, pois esse é um investimento que demora muito tempo para ter um resultado espetacular.
O que o histórico de variação das cotas de um FII pode dizer a um investidor?
Em geral, e isso também acontece no mercado de renda variável, um investidor olha apenas para o retrovisor, e não para as perspectivas do fundo. Por exemplo, o ALMI11 é um FII mono ativo cujo prédio, localizado no Centro do Rio, era alugado pela Petrobras. Na época, esse fundo era um Triple-A, e ninguém acreditava que a Petrobras fosse sair, só que ela rescindiu o contrato, pagou a multa, e até hoje o fundo está com uma vacância muito elevada.
Um ponto importante: eu sempre sugiro que o investidor não olhe para o inquilino, e sim para a qualidade do imóvel, pois a questão não é se o inquilino vai sair ou não, mas quando ele vai sair, o que ninguém sabe.
A análise do histórico não quer dizer muita coisa para o futuro, pois ninguém sabe o que vai acontecer. Nesse caso, uma análise completa da foto teria mostrado que o fundo havia entregue muito resultado desde o seu início, mas que ele era mono ativo, com um mono inquilino e que a situação imobiliária do Rio estava muito mal, ou seja, que essa trajetória de bonança poderia acabar a qualquer momento, e foi justamente isso o que aconteceu.
Você pode olhar o passado como um case do que pode acontecer, como os motivos que levaram a alta ou a queda da cota do fundo. Olhando para o passado, o investidor começa a entender a dinâmica do mercado, o que pode enriquecer muito os seus estudos.
Como está esse fundo hoje?
O imóvel está com uma vacância de 53% e não paga dividendos desde 2017. Isso porque, por mais que a vacância não esteja em zero, o imóvel fica com os custos de condomínio e de IPTU dos espaços vazios, o que faz com que a ocupação de 47% não seja suficiente para cobrir todos os custos do imóvel. Além disso, para que o gestor conseguisse locar esses espaços, ele teve que oferecer carências muito longas para os novos inquilinos.
Como avaliar se os dividendos pagos por um FII são bons ou ruins?
Para isso, é preciso olhar a composição do dividendo, e não o seu valor. Geralmente, essa informação é colocada no relatório gerencial. Se 30% do dividendo vier de alugueis e 70% de uma multa, você já sabe que a multa não vai se repetir. Para saber se o dividendo é sustentável, você tem que analisar se a renda é plausível de ser repetida no longo prazo.
Melhor do que avaliar o dividendo, é olhar a capacidade que o fundo tem de gerar renda. Se um fundo, que tem 80% de ocupação e gera uma renda de R$ 1 por cota, chegar a 100% da sua ocupação, até quanto ele pode gerar de renda? Esse é o principal ponto que o investidor deve olhar, pois a rotatividade de inquilinos é muito comum.
Por exemplo, o RCRB11, um dos primeiros FIIs lançados na Bolsa pela Rio Bravo, estava com uma vacância bastante elevada de 28% em fevereiro de 2022, o que fazia com que ele tivesse dividendos mais baixos. No entanto, é preciso entender que se os imóveis e a gestão forem de boa qualidade, a vacância pode diminuir e a renda aumentar bastante. Se você se posicionar no momento em que a vacância está muito alta, você está fazendo o que chamamos de Compra de Vacância, ou seja, você se posiciona no fundo antes dele locar os espaços. Desde fevereiro de 2022, o RCRB11 foi diminuindo a sua vacância, que hoje está em 1,8%, o que fez com que os seus dividendos passassem de R$ 0,55 por cota para quase R$ 1.
O problema é que, muitas vezes, o investidor faz o contrário do que tem que ser feito. Quando o dividendo está alto, ele compra, mas quando o dividendo está baixo, ele não quer saber.
Essa análise é muito interessante para o investidor que se posiciona em ativos de qualidade e foca no longo prazo. Isso porque, por mais que o ativo seja de qualidade, nós não temos como saber quando ele será locado, mas a probabilidade de um ativo de qualidade ser locado de forma mais rápida que um ativo ruim, é muito maior.
Considerando a conversa que tivemos, você gostaria de acrescentar algum ponto à sua entrevista?
Entre 2015/2016, o Brasil atravessou a pior recessão da sua história com a Dilma. Como eu estava lançando o Clube FII naquele momento, as pessoas me perguntavam se eu era maluco. O ponto é que 2016, quando muitos estavam arrancando os cabelos, foi o melhor momento para se posicionar no mercado de FIIs, pois até 2019 esse mercado teve a maior alta da sua história. Aconteceu exatamente o que o Warren Buffet sempre disse: “compre ao som dos trovões e venda ao som dos violinos.
Nós estamos em uma situação, que não é tão grave quanto 2016, mas o mercado já começa a apresentar grandes oportunidades de investimentos para quem pensa no longo prazo, pois é em momentos de pessimismo generalizado, como esse que estamos vivendo hoje, que temos os melhores preços.
Eu costumo dizer que o mercado de renda variável é o único que quando aparece uma promoção, todo mundo sai correndo, e é isso o que está acontecendo hoje. O mercado está cheio de promoções, com fundos sendo negociados a preços bastante convidativos, mas os investidores estão com medo de se posicionar. Eles só vão se posicionar depois que a situação estiver resolvida, mas aí as cotas já terão subido bastante. Foi o que aconteceu em 2019, quando muita gente entrou no pico. Naquele ano, o mercado teve o maior volume de crescimento da sua história e o IFIX apresentou a sua maior alta.
Nós estamos em um momento com grandes oportunidades, ainda não tão boas quanto em 2016, mas não é por isso que as pessoas vão sair comprando aleatoriamente. É sempre importante fazer um mínimo de análise, ler os relatórios gerenciais e consultar as casas de research para que se possa fazer as melhores escolhas que se adequem ao seu perfil de investimento.