IPCA deve alcançar máxima de 7,81% no acumulado de 12 meses

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Felipe Sichel (Foto: Divulgação)
Felipe Sichel (Foto: Divulgação)

Apresentamos neste relatório as principais alterações em relação às nossas projeções de inflação, destacando os determinantes da dinâmica de preços e os principais riscos para o IPCA este ano e ano que vem.

O indicador deve alcançar uma máxima de 7,81% no acumulado de 12 meses ao final do primeiro semestre e recuar até 5,5% no final do ano. Para 2022, o IPCA projetado é de 3,9%. Assim, adiciona-se claro viés altista para nossa projeção de taxa de juros.

Para o restante do ano, vemos pressão inflacionária centrada nos preços administrados. Sem embargo, nossa projeção encontra-se abaixo da expectativa divulgada pela pesquisa Focus do Banco Central para esta abertura. Entre os principais riscos para está uma intensificação da presente crise hídrica.

Nos preços livres vemos o início de um movimento de estabilização nas commodities ao longo das últimas semanas (CRB FOOD Index) que, caso perdure, poderia ajudar a aliviar o cenário no começo do ano que vem. Ao mesmo ano, o câmbio tem dinâmica melhor do que o que antecipamos e, na ausência de novas rodadas de desvalorização, também auxiliaria a uma projeção mais baixa do IPCA.

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Um dos maiores desafios para projeção da inflação é o impacto da reabertura ao longo dos próximos meses. Evidentemente, descasamento de oferta e demanda provocarão volatilidade nos dados.

A inflação de administrados acumulada até o mês de abril encontra-se em 4,6%. Destaca-se, por um lado, os aumentos até então da gasolina (21,22%), do óleo diesel (17,79%), do gás de botijão (12,85%) e de cartório (8,05%). Por outro, energia elétrica residencial (-5,6%) e ônibus interestadual (-5,09%) apresentam as maiores quedas.

Nota-se o forte impacto dos combustíveis na alta dos preços administrados até abril, resultado da desvalorização cambial e recuperação do preço do barril do petróleo no mercado internacional. A variação negativa na energia elétrica residencial se deve à mudança da bandeira de vermelha 2 de dezembro de 2020 para amarela em janeiro de 2021. Para o final do ano, projetamos a inflação de administrados em 7,55% ou 198 bps do IPCA. Este valor representa a maior alta do grupo desde 2017, quando subiu 8,3%. Além das altas da gasolina, do óleo diesel e do gás de botijão, que projetamos chegar em 23,1%, 23,4% e 14,2%, respectivamente, vemos também a aceleração do gás encanado (de 4,02% acumulado até abril para 18,3% no ano) e do gás veicular (de 2,74% para 21,9%).

Entre os fatores de risco para a projeção dos preços monitorados do ano, indicamos a suspensão do reajuste dos medicamentos como o principal fator para baixo. Caso o PL 939/21 seja aprovado, vemos um impacto um impacto de -20 bps no IPCA que, provavelmente, seriam transferidos para o ano seguinte. Contemplamos ainda um reajuste nulo de planos de saúde. Especula-se, contudo, que este sofra um reajuste negativo, sendo assim, calculamos que a cada 1% de variação negativa nos preços dos planos de saúde retiram-se 2,3 bps do IPCA em 2021 e 1,6 bps em 2022.

Já do lado altista, a crise hídrica pode implicar o encerramento do ano em bandeiras tarifárias acima da amarela, como projetado por nós para dezembro. Pelos novos valores das bandeiras tarifárias, o impacto no IPCA seria de mais 26 bps no ano se encerrarmos em dezembro com a bandeira vermelha patamar 1 ou mais 47 bps para o patamar 2. Ou seja, 6,07% ou 11,07%, respectivamente, de aumento da energia elétrica residencial no ano.

Em 2022, projetamos um recuo na inflação dos preços administrados para 4,6%. Esse valor acima da meta se deve a, primeiramente, os reajustes de alguns itens represados este ano por conta da pandemia (como passagens de ônibus em algumas cidades) ou apresentam reajuste menor do que deveriam (a Aneel vem limitando o reajuste de energia elétrica em um dígito, por exemplo). Em segundo lugar, o fator de reajuste de vários dos componentes dos administrados se dá pelo IGP-M do ano anterior, que neste momento já acumula alta de 13,6% em 2021.

A inflação dos preços livres acumulada no ano até abril encontra-se em 1,57%, bem abaixo da de administrados. Para o final do ano, projetamos o indicador em 4,79%, já para 2022, em 3,65%. Para melhor entender a dinâmica inflacionária dos próximos meses, divide-se a análise dos preços livres em alimentação no domicílio, bens industriais e serviços.

A alimentação no domicílio acumula alta no ano de 1,64% e está pressionada no curto prazo. O IPA-M de produtos agrícolas, medido pela FGV, acumula alta no ano de 12,2%, já o IC-Br agrícola do BCB tem alta de 22,6%. Em específico, os preços do milho, da soja, de grãos e do açúcar devem continuar impondo uma tendência altista na inflação de alimentos. Somam-se a eles, as elevações nos preços das carnes bovina, suína e de frango explicadas, em parte, pelo aumento nos custos de produção (soja e milho, principalmente).

Para a projeção da inflação de alimentos no domicílio, levamos em consideração a inflação de alimentos passada, a expectativa de inflação, o IC-Br agrícola, o câmbio e variáveis climáticas. Temos ainda um cenário de depreciação cambial até o final do ano e um recuo no preço das commodities agrícolas ao longo dos próximos três anos. Com isso, projetamos uma inflação de alimentos no domicílio de 7,95% em 2021 e 6% em 2022.

A inflação dos bens industriais soma 2,77% em 2021, sendo uma parcela significativa desse aumento atribuída ao etanol. Nota-se, contudo, que uma outra parte se deve ao repasse do aumento dos custos ao produtor para o bem final. O IPA-M de produtos industriais subiu 39,8% nos últimos 12 meses e entre as causas estão os reajustes dos insumos, a escassez de materiais, como semicondutores, e a desvalorização cambial. Pontuamos que os repasses dos custos não devem parar pelos próximos meses, indicando nova pressão altista para o IPCA.

Para a modelagem da inflação de bens industriais utilizamos como variáveis sua própria inflação anterior, as expectativas do IPCA, o IC-Br de materiais, o câmbio e o hiato do produto. Além da depreciação cambial, assumimos ainda uma trajetória de desvalorização das commodities minerais pelos próximos três anos. Assim, projetamos a inflação industrial de 2021 e 2022 em 6,35% e 2,6%, respectivamente.

Por fim, a inflação de serviços acumula 0,78% de alta até abril no IPCA. Diferente dos outros dois grupos, vemos uma situação mais benigna para os serviços. A reabertura da economia, o avanço do ritmo de vacinação e a demanda reprimida por serviços até podem pressionar a inflação desse grupo no segundo semestre (reopening shock).

Acreditamos, porém, que o desemprego e o hiato na economia devem segurar um avanço mais forte. O modelo para a inflação de serviços considera valores passados do IPCA e dos serviços, a expectativa de inflação e o hiato do produto como variáveis. A projeção da abertura para 2021 encontra-se em 2,41% e para 2022 em 3,25%.

Levando em conta todo o cenário exposto acima, agregam-se as projeções de administrados e livres para a obtenção da projeção do IPCA de 2021 em 5,5% e de 2022 em 3,9%. No valor acumulado em 12 meses, o índice alcançará um máximo de 7,81% ao final do segundo trimestre de 2021 e começará a recuar na sequência.

No cenário base, assumimos uma trajetória de queda no preço das commodities com o índice CRB retornando gradualmente à média a partir do segundo semestre de 2021. Esse cenário entende que o choque sobre commodities é temporário e será eventualmente revertido. Avaliamos, contudo, que esse ponto é delicado e estressamos os valores analisados. No Cenário 2, assume-se que a desvalorização das matérias primas só virá em 2022, já no Cenário 3, os preços permanecem no patamar atual sem alterações.

O cômputo do IPCA de 2021 sobe para 5,54% em ambos os cenários alternativos, uma vez que a variação da trajetória das commodities no ano é a mesma em relação ao modelo base. Por sua vez, o IPCA de 2022 iria para 3,92% e 4,03% para os Cenários 2 e 3, respectivamente. Assim, uma rota mais forte das matérias primas pode influenciar o IPCA desse e do próximo ano para cima.

Por último, dado a trajetória de inflação do modelo base, realizamos um novo exercício com a Selic subindo até 6,5% em altas consecutivas de 75 bps e permanecendo nesse patamar em 2022. Ajustamos também o câmbio apreciando para refletir esse novo patamar do juro base.

Como resultado, temos o IPCA de 2021 recuando para 5,47% e o de 2022 para 3,75%, ambos ainda acima do centro da meta. Ou seja, fica justificado, portanto, um cenário de normalização mais acelerada da Selic, ainda que o Banco Central não queira assumir este cenário no momento.

Em suma, os principais riscos altistas dessa projeção concentram-se em: (i) as commodities agrícolas e minerais não desacelerarem como o previsto; (ii) a crise hídrica implicar no acionamento da bandeira vermelha 1 ou 2; (iii) o repasse de o aumento de custos dos bens industriais para o consumidor final ser maior e mais persistente que o previsto; (iv) a reabertura da economia provocar uma pressão sobre os preços dos serviços; e (v) uma desvalorização cambial mais acentuada provocada por novos desequilíbrios fiscais ou antecipação do ambiente eleitoral de 2022.

Por outro lado, os riscos baixistas mais importantes seriam causados por uma queda das commodities e da persistência dos efeitos desinflacionários como vista no início da pandemia.

Dado o cenário global de saída conjunta da crise sanitária, de expansão fiscal nas economias desenvolvidas e de reajuste monetário pelos bancos centrais ao redor do mundo, o balanço de riscos para a projeção está definitivamente enviesado para cima, conforme ilustrado nos exercícios da seção anterior.

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Felipe Sichel

Estrategista-chefe do Banco Digital Modalmais

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