O Governo Federal deve encaminhar ao Congresso Nacional, nos próximos dias, um projeto para ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, ao passo em que se propõe o aumento da tributação sobre os mais ricos. A medida, no entanto, levanta questionamentos sobre a compensação fiscal, que pode ocorrer por meio do aumento da tributação sobre rendas superiores a R$ 50 mil mensais.
Na visão do especialista tributário e CEO da Tax All, Eduardo Araújo, no entanto, a medida pode não ter o efeito esperado para a economia se não for acompanhada de uma reforma administrativa que reduza os custos da máquina pública. O objetivo da isenção, segundo o governo, é aumentar o consumo e reduzir a desigualdade. Entretanto, Araújo alerta para desafios como risco de queda na arrecadação, dificuldade na compensação apenas com a taxação dos mais ricos, um possível desincentivo a investimentos e o aumento da evasão fiscal.
Ele ressalta que, ao propor a isenção, o governo deve assumir o compromisso de reduzir gastos, demonstrando eficiência na gestão dos recursos públicos.
“Custo é igual unha, tem que cortar todo dia. A proposta de isenção é bem-vinda, desde que não aumente a carga tributária de quem já paga muito imposto, como empresas e empresários, e que o governo apresente uma proposta efetiva para o desinchaço da máquina pública, eliminando penduricalhos e mostrando que é possível fazer mais com menos”, afirma.
Uma das propostas em discussão é a implementação de um imposto mínimo para pessoas com renda mensal a partir de R$ 50 mil. No entanto, o especialista da Tax All explica que “o universo de contribuintes nessa faixa é relativamente pequeno, estimado em cerca de 100 mil pessoas. O imposto sobre esta parcela da população provavelmente não consegue cobrir totalmente o custo da isenção, que é em torno de R$ 40 bilhões”.
“Se o governo tiver uma medida que não cubra completamente a isenção, a perda de arrecadação, ele vai ter que buscar outros caminhos”, alerta Araújo. Ele menciona que, para cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal, o governo poderia recorrer a mecanismos como aumento de CSLL para bancos ou IOF, o que poderia gerar distorções no mercado. “Essas medidas, embora possam aumentar a arrecadação no curto prazo, podem ter efeitos colaterais negativos, como a redução da competitividade e o aumento dos custos para os consumidores”, pontua.
Outro ponto destacado por Araújo é a complexidade jurídica de tributar dividendos, uma das possíveis fontes de receita para compensar a isenção. “Se a empresa já é tributada no seu lucro, então o dividendo não deveria estar sendo tributado depois, seria uma tributação dupla”, explica. Ele ressalta que essa medida poderia desincentivar investimentos e prejudicar o crescimento econômico.
Para ele, o papel do governo é criar mecanismos de combater a desigualdade social, como a proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, mas sem aumentar tributos para ninguém.
“Para que a proposta seja viável, é essencial que o governo busque um equilíbrio entre a necessidade de arrecadação e os impactos econômicos e sociais. Isso pode incluir a proposta da reforma administrativa para o desinchaço da máquina pública, ou seja, o governo ter o compromisso que é enxugar as contas públicas, mostrar que consegue fazer mais com menos, como o setor privado precisa fazer sempre que está em crise ou precisa de novos investimentos”, conclui.
Já para Marcelo Costa Censoni Filho, sócio do Censoni Advogados Associados e CEO do Censoni Tecnologia Fiscal e Tributária, “essa é mais uma proposta que visa a redistribuir a carga tributária, aliviando as faixas de menor renda e aumentando a contribuição das camadas mais altas. No entanto, sua eficácia depende do número de contribuintes impactados. Se houver poucos declarantes na faixa acima de R$ 50 mil, o aumento da alíquota pode não ser suficiente para cobrir a perda de arrecadação.”
Outro ponto de preocupação é a possível mudança de comportamento dos contribuintes atingidos pela nova tributação.
“Histórica e globalmente, observa-se que o aumento de impostos sobre as faixas mais altas pode estimular a adoção de estratégias de planejamento tributário mais agressivas ou até mesmo evasão fiscal, reduzindo a arrecadação esperada”, alerta Censoni.
O especialista também destaca que, caso a nova arrecadação não seja suficiente para compensar a isenção, o governo pode se ver forçado a buscar outras fontes de receita, incluindo novos aumentos de impostos ou cortes de gastos. “Contudo, a ampla base de tributação prevista na reforma tributária reduz esse risco de forma significativa”, pondera.
Outro desafio da proposta é evitar que o peso da arrecadação recaia desproporcionalmente sobre aqueles que já pagam altos tributos. “Para garantir um sistema mais justo, seria necessário ampliar a base de contribuintes, reduzir tributação indireta e reforçar o combate à elisão e à evasão fiscal. Além disso, qualquer alteração deve ser discutida de forma transparente, com ampla participação da sociedade”, argumenta o tributarista.
Estados e municípios também devem sentir o impacto da isenção, já que parte do Imposto de Renda compõe os repasses do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). “A redução da base de contribuintes pode diminuir esses repasses, afetando a capacidade de investimento e manutenção de serviços públicos. Para mitigar esse impacto, o governo pode revisar as regras de repartição de recursos ou aumentar as transferências voluntárias”, explica Censoni.
A reforma tributária, que estabelece a incidência dos novos tributos no local do consumo, também pode ajudar a equilibrar essa equação, garantindo uma maior participação dos estados e municípios na arrecadação. “Ainda assim, sem uma compensação adequada, os entes federativos podem acabar absorvendo o impacto da renúncia fiscal, o que poderia resultar em cortes de gastos e prejuízos para os serviços públicos”, conclui o especialista.
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