Lições da guerra

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Sendo presidente dos Estados Unidos, George Bush, ao tomar a decisão de invadir o Iraque, poderá – independentemente da questão política, de instigar mais violência e de conturbar ainda mais os mercados internacionais – nos dar algumas lições interessantes sobre liderança e gestão de negócios.
O modo de Bush tomar decisões graves como a de determinar uma guerra é análogo ao velho estilo militar: um toma a decisão e todos cumprem a tarefa determinada. Esse anacrônico modelo de liderança vem do século XVIII e foi baseado na estruturação do exército prussiano, no qual existia divisão muito clara nas funções: os oficiais, especialmente os de alta patente, como os generais, decidiam as estratégias e os soldados, cabos e sargentos lutavam. Não existia a proposição, sequer teórica, de que o general ou o coronel lutassem.
É comum vermos em cenas de filmes de guerra um sargento falando para um coronel que este não pode ir para a frente de batalha, pois o exército pode ficar acéfalo. Muitas empresas vivem hoje situações muito semelhantes, em que o presidente toma as decisões e os gerentes e trabalhadores realizam estas decisões.
É muito negativo, contudo, quando as determinações da cúpula são insensatas e, apesar disto e tendo consciência do equívoco, os sargentos, cabos e soldados acabam cumprindo as tarefas para não serem estigmatizados como incompetentes, fracos ou desleais. Em casos como esses, os colaboradores não acreditam nas decisões e não respeitam os líderes, por perceberem que estes não entendem sobre o negócio.
No universo empresarial, contudo, também há o outro lado dessa moeda. Há numerosas organizações em que os presidentes querem convidar os gerentes, supervisores e funcionários em geral para pensar na estratégia da empresa, mas os colaboradores não conseguem imaginar que têm capacidade de participar ativamente desse processo. Assim, cobram que a liderança faça, porque não tomam a decisão e não levam a equipe ao cumprimento das metas da organização.
Assim é importante que as empresas que almejam maior participação de seus colaboradores nas decisões saibam que na implementação dessa estratégia surgem pessoas mais maduras, que não são submissas, sem senso crítico, a ordens. Da mesma forma, há aquelas que não assumem responsabilidade pelas decisões.
Agora, infelizmente, numa civilização em que a cultura ainda parece baseada no poder da força, o que vemos é grande parte de presidentes e diretores empresariais agindo como Bush. Pessoas que não percebem que o mundo mudou. Quando o pai do atual presidente Bush invadiu o Iraque em 92, este país havia acabado de invadir o Kwait, cuja invasão produziu dois fatores motivacionais importantes: primeiro, a defesa de um aliado dos Estados Unidos, que era o Kwait, e, segundo, a tropa do Iraque estava no deserto. Então ficou fácil separar militares de civis, e os aviões dos aliados mataram dezenas de milhares de soldados facilmente expostos aos bombardeios e às bombas.
Neste momento o Iraque não está com o seu exército no deserto, ou seja, está estruturado. Também não existe uma prova concreta de que realmente tenha as armas de destruição em massa, ou seja, não vai ser fácil vencer o exército iraquiano. Para que seja cumprida esta meta, ocorrerão muitas mortes de civis. Por mais belicoso e frio que seja um soldado, nenhum gosta de matar um civil.
A conseqüência de todo esse cenário será uma tropa que irá lutar sem ter certeza de que está realmente fazendo algo em que acredita e identifica como ação em defesa da liberdade. Além disso, a possibilidade de muitas mortes de civis iraquianos e – se as forças dos Estados Unidos invadirem as cidades – a perda de vidas norte-americanas deveria suscitar o diálogo mais sereno com os aliados, a análise de outras estratégias e a consideração à opinião da tropa.
Tudo isso é fundamental. O secretário Colin Powel, como militar que viveu os dramas de guerras, sabe disso. E esta sua consciência sofre o equívoco da decisão do presidente Bush, faz com que muitos comentaristas prevejam que não lhe restará nenhuma alternativa a não ser a renúncia do cargo, após a guerra do Iraque.

Roberto Shinyashiki
Médico psiquiatra, com pós-graduação em Administração de Empresas (MBA USP), escritor, consultor e presidente da Editora Gente e do Instituto Gente.

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