As Lojas Americanas divulgaram nesta quinta-feira em que patamar se encontra o seu problema financeiro. Na verdade, a nota divulgada pela empresa é pouco esclarecedora, mas fica evidente que o prejuízo de R$ 12,9 bilhões no ano passado, o maior rombo anual da história da empresa, deixa poucas margens para uma mudança substancial nos próximos meses.
A informação de que companhia revisou o seu lucro líquido de R$ 544 milhões registrado em 2021 para prejuízo de R$ 6,2 bilhões e que também calculou em R$ 12,9 bilhões o resultado negativo de 2022, fez com que seus papéis fechassem, nesta quinta-feira, com ganhos de 6,25%, a R$ 0,85, após uma máxima de R$ 0,89 (+11,25%), comportamento verificado após a apresentação dos balanços de 2021 e 2022, além de projeções para 2025.
Prestes a ter o plano de recuperação judicial votado, a empresa – que há exatos 10 meses divulgou descobertas de fraudes contábeis – segue com um futuro incerto. Contratada em junho para auditar a contabilidade das Lojas Americanas, a firma de auditoria BDO não deu o aval para os números. Em relatório anexo aos resultados, os auditores informaram não expressar opinião sobre as demonstrações contábeis porque “não nos foi possível obter evidência de auditoria apropriada e suficiente para fundamentar nossa opinião de auditoria sobre essas demonstrações contábeis individuais e consolidadas”.
Entre os principais questionamentos da BDO estão o teste de valor recuperável dos ativos (valor que pode ser recuperado), que, segundo os auditores, não se baseou em premissas que não considerassem as inconsistências contábeis. A BDO substituiu a PwC, responsável por auditar os balanços anteriores das Lojas Americanas.
“A projeção ora divulgada é baseada nos resultados da companhia no exercício social findo em 31 de dezembro de 2022 e assume, dentre outras, as seguintes premissas: A aprovação do plano de recuperação judicial da companhia substancialmente nos termos e condições atualmente em discussão com os principais credores; lojas físicas com crescimento de vendas e massa de margem através da ampliação de sortimento e da participação de itens de variedade nesse sortimento; Negócio digital buscando neutralidade de resultados, através de migração para um modelo que substancialmente espelha o mix do físico e que será complementado por ampla oferta através de sellers com produtos variados; Ame continuando a ser um link entre o físico e o digital, bem como uma forma de rentabilizar nossa base de clientes, mas passando por um processo de reestruturação financeira e operacional para ser autossustentável em um ambiente de restrição de capital; Revisão da estrutura de despesas para buscar ganhos de produtividade num curto espaço de tempo”, destaca a nota.
Retrospectiva
Em 19 de janeiro, as Lojas Americanas entraram em recuperação judicial, com dívidas declaradas de R$ 49,5 bilhões. Uma semana antes, em 11 de janeiro, o então CEO da companhia pediu demissão ao descobrir “inconsistências contábeis” em torno de R$ 20 bilhões. Depois, assessores jurídicos envolvidos no plano de recuperação judicial apontaram que as gestões anteriores inflaram os lucros das Lojas Americanas em R$ 25,3 bilhões. O valor refere-se há vários anos, mas a empresa não informou por quantos anos perdurou a maquiagem contábil.
Em 2021 e 2022, a companhia acumulou prejuízo de R$ 19,1 bilhões, dos quais R$ 6,2 bilhões em 2021 e R$ 12,9 bilhões no ano passado, o maior rombo anual da história da empresa. O balanço de 2021, que originalmente apontava lucro de R$ 544 milhões, foi revisado.
Adiado por quatro vezes, o balanço de 2022 ainda não tinha sido divulgado. A divulgação dos resultados é condição para que o plano de recuperação judicial possa ser votado pela assembleia de credores. A votação está prevista para ocorrer na terceira semana de dezembro.
Plano estratégico
A Americanas divulgou ao mercado seu plano estratégico de negócios com previsão de geração de Ebitda de mais de R$ 2,2 bilhões (ou mais de R$ 1,5 bilhão depois do pagamento de aluguéis) em 2025. “Após sofrer fraude de resultados praticada pela antiga diretoria, a companhia tem centrado esforços na continuidade do negócio, que ganhará mais fôlego a partir do aumento de capital de R$ 12 bilhões que será realizado pelos acionistas de referência e capitalização de dívida concursal por parte dos credores também no valor de R$ 12 bilhões, assim como com a aprovação do Plano de Recuperação Judicial pelos credores”, diz o comunicado da Americanas, divulgado nesta quinta-feira junto com a publicação do balanço de 2022.
O plano de negócios do que a atual diretoria chama de “a nova Americanas” está voltado à “fortaleza e resiliência do canal físico, apoiado pela excelência operacional do digital, pelo portfolio de serviços financeiros customizados da Ame e pela diversidade de seu retail media, que rentabiliza seus ativos por meio de advertising”.
“Essa transformação dará maior protagonismo ao seu DNA figital (físico + digital) gerando um pacote consistente de entregas aos clientes e parceiros, com todos os modelos possíveis de um varejo de variedades como a Americanas”, prossegue o comunicado. O plano, que já está em curso, promove “maior assertividade nos produtos para revenda, assim como novos modelos de precificação e modulação de sortimento para ampliar as vendas no canal físico e a margem bruta da companhia. Outros pilares importantes são a renovação das lojas físicas, a otimização dos custos de ocupação e revisão de processos para oferecer excelência na jornada dos consumidores”.
Além disso, a plataforma digital da Americanas terá também foco no marketplace e no online to offline (O2O), oferecendo mais sortimento e conveniência para os clientes. A Ame atuará como alavanca para o fortalecimento da marca Americanas, com ampliação de seu programa de fidelidade para aumentar o engajamento de clientes, além de estímulo ao cashback e meios de pagamento.
“A transformação da Americanas, já iniciada pela nova gestão, também envolve uma reestruturação de forma a ajustar a companhia para este foco de atuação. Foram realizados ajustes e melhorias em áreas como marketing, tecnologia e estrutura logística a partir do novo contexto de atuação da plataforma digital, da renegociação de contratos e mudanças na estrutura organizacional, com melhora da despesa operacional”, garante a empresa.
“Acreditamos que, com este plano, a Americanas estará pronta para renovar seu papel de relevância no varejo brasileiro. Não será fácil, não será simples, mas será feito”, afirma Leonardo Coelho, CEO da Americanas. “A Americanas tem a expectativa de que a Assembleia Geral de Credores seja realizada ainda em 2023” para aprovar o plano de recuperação.