A inadimplência entre as famílias de menor renda alcançou 37,7% em outubro, refletindo o impacto dos juros elevados e das condições de crédito mais restritivas sobre o orçamento dos mais vulneráveis. Esse aumento ocorreu apesar de uma redução geral do endividamento, que recuou para 76,9%, semelhante ao nível registrado em outubro do ano passado, indicando maior cautela das famílias com o uso de crédito.
O levantamento, realizado mensalmente pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), mostra que, enquanto o percentual de famílias endividadas recuou, a inadimplência voltou a crescer, atingindo 29,3% em outubro, a maior taxa desde outubro de 2023. Além disso, a parcela de famílias que afirmam não ter condições de quitar suas dívidas em atraso aumentou para 12,6%, também o maior índice desde outubro do ano anterior, refletindo um cenário de dificuldade generalizada para os consumidores.
“A dependência de crédito em um cenário de juros elevados torna a quitação de dívidas um desafio ainda maior para as famílias mais pobres”, explica o presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, José Roberto Tadros. “Acreditamos que, com medidas voltadas para a redução de gastos públicos, é possível abrir espaço para uma possível queda dos juros, o que traria um alívio significativo para os consumidores e para a economia como um todo”, acrescenta.
A análise por faixas de renda mostra que as famílias com renda superior a 10 salários mínimos conseguiram reduzir seu endividamento para 67,1%. Esse grupo também apresentou um dos menores índices de dívidas em atraso, com 14,3%, refletindo uma postura mais conservadora em relação ao uso do crédito. Por outro lado, o endividamento dos mais pobres foi contra a tendência e aumentou de 78,7% em outubro de 2023 para 80,8% em outubro de 2024. No mês, o aumento foi de 0,4 ponto percentual.
O cartão de crédito continua liderando o ranking, com 83,5% das famílias endividadas utilizando essa forma de pagamento em outubro, embora tenha apresentado uma queda em relação aos 87% no mesmo mês do ano passado. Por outro lado, o crédito pessoal registrou um aumento, passando de 9,4% em outubro de 2023 para 12% em outubro de 2024, atingindo o maior nível do ano. Esse aumento reflete uma preferência dos consumidores por modalidades de crédito com taxas mais competitivas em um cenário de juros elevados. Em contraste, o uso de cheque especial caiu para 3,6%, o menor índice desde o início deste ano.
Ainda segundo o estudo, o tempo médio de pagamento em atraso entre as famílias inadimplentes subiu para 66 dias em agosto, o maior valor do ano, refletindo a dificuldade das famílias em regularizar suas contas. A parcela média da renda comprometida com dívidas também aumentou, atingindo 29,9% no mês passado, próximo dos maiores níveis registrados ao longo do ano, o que mostra a pressão das dívidas sobre o orçamento familiar.
Projeções da CNC indicam que o endividamento pode voltar a crescer no último trimestre de 2024, impulsionado pelas compras de fim de ano. “O crédito tem um papel fundamental no consumo, mas os juros elevados impõem restrições”, avalia Felipe Tavares.
A Intenção de Consumo das Famílias (ICF), calculada mensalmente pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), diminuiu 0,6% em outubro, marcando o quarto mês seguido de retração. A principal causa foi a visão negativa sobre o momento para adquirir bens duráveis, com queda de 1,8%, além da percepção do nível de consumo atual, que caiu 1,2%. Apesar disso, o índice se mantém acima do nível de satisfação, com 103,2 pontos, o menor valor desde março, quando alcançou 104,1 pontos.
A desaceleração econômica, o aumento da Selic e o encarecimento do crédito têm enfraquecido o consumo, especialmente entre as famílias de maior renda. Quase todos os componentes da ICF apresentaram queda, exceto a perspectiva profissional, que permaneceu inalterada. A percepção sobre a renda atual, embora tenha tido uma leve queda de 0,6% no mês, ainda registra crescimento anual de 3,7%.
Essa conjuntura levou a uma redução de 0,9% no subindicador de acesso ao crédito, marcando o segundo mês consecutivo de retração. A Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), também conduzida pela CNC, indica que o nível de endividamento das famílias permanece elevado, afetando de forma mais expressiva a intenção de consumo, especialmente de bens duráveis, que recuou 1,8% em outubro.
A análise por faixas de renda revela que as famílias com ganhos superiores a 10 salários mínimos registraram uma redução de 1% na intenção de consumo, enquanto aquelas com renda inferior a esse valor apresentaram uma queda menor, de 0,8%. A perspectiva de consumo entre os mais ricos caiu 1,5%, refletindo os impactos do cenário econômico e do aumento do custo de crédito. Em comparação, para as famílias de menor renda, a perspectiva recuou 0,5%.
Quanto ao momento para compra de bens duráveis, a retração foi mais pronunciada entre as famílias de maior renda, com queda de 2,7%, enquanto as de menor renda registraram uma redução de 1,6%. Isso reflete a maior cautela das famílias mais abastadas, que são mais sensíveis às mudanças das condições de crédito e ao ambiente econômico instável.
“As famílias com maior renda estão mais cautelosas, especialmente em relação ao crédito para bens duráveis. Com a perspectiva de novas elevações da Selic, a tendência é uma retração ainda mais acentuada nesse setor”, ressalta Felipe Tavares, economista-chefe da CNC.
Os indicadores de mercado de trabalho mostraram um leve recuo em outubro, com o indicador de emprego atual caindo 1,1%, refletindo a cautela dos consumidores em relação à estabilidade no emprego. Em termos anuais, esse indicador permaneceu estável, sem variação significativa. No entanto, a perspectiva profissional apresentou uma queda de 4,1% em comparação ao ano anterior, revelando a crescente insegurança dos trabalhadores em relação ao futuro, em um cenário de desaceleração econômica e incertezas sobre a geração de novos postos de trabalho.
















