Mobilidade social no Rio

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A mobilidade social ascendente se dá quando as circunstâncias de qualidade de vida dos filhos e dos netos é melhor do que seus pais e avôs. Na Cidade do Rio de Janeiro, é descendente: para uma parcela substancial da população – passando pelas classes mais desfavorecidas, as classes médias baixas e as médias – a mobilidade social é descendente. Pasmem vocês: na Cidade do Rio a qualidade de vida dos filhos e dos netos hoje é pior do que aquela que tiveram seus pais e avôs.

À guisa de ilustração, imagine-se no seguinte exemplo: no Campo do Manufatura, 1960, assistindo ou jogando num dos melhores campos de futebol da cidade, local onde se revelaram grandes jogadores do futebol brasileiro por décadas a fio. O Campo do Manufatura era da GE – General Electric, uma das maiores empresas mundiais, com subsidiária no Rio, localizada no sopé da Favela do Jacarezinho.

Próximas estavam também as fábricas da Coca Cola, da Gillette, da Indústria Klabin, da VilleJack Jeans e outras fábricas, e muitos empreendimentos industriais e comerciais complementares, de menor porte, a serviço do complexo industrial ali existente. O Jacarezinho cresceu assim: os operários e funcionários habitavam na favela e nos seus arredores trabalhando pertinho de onde moravam.

Hoje esse complexo econômico gerador de emprego e renda não mais existe. Os filhos e netos dos antigos empregados não têm mais onde trabalhar. São sustentados pelas aposentadorias e pensões de seus pais e avôs ou se tornaram soldados e aviõezinhos do tráfico e da bandidagem que tomou conta do lugar. Pior: muitos morrem todos os dias em combates com outras facções e milícias, ou por ação da polícia na luta cotidiana contra o crime disseminado em nossa cidade. Claro, o Campo do Manufatura, com o gramado à época melhor do que o do Maracanã, também “foi para o beleleu”.

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Transfira esse exemplo para quaisquer bairros da cidade e você constatará a repetição do mesmo enredo: em Santo Cristo e na Saúde, em São Cristóvão, São Januário e Benfica, no Centro da Cidade e na Tijuca, no Grajaú e Vila Isabel, em Olaria, Penha ou Irajá, em Madureira, Rocha Miranda e Bangu. Aonde quer que você vá!

Bloquear a mobilidade social significa cortar a esperança e desintegrar a juventude pela frustração das expectativas de uma vida melhor. O Rio se torna assim um lar muito pouco acolhedor para a sua população, que nega oportunidades de emprego e renda a seus filhos.

A perda de dinamismo econômico da cidade nas últimas décadas, principalmente a partir da fusão do Estado da Guanabara com o antigo Estado do Rio de Janeiro, contribuiu enormemente para a baixa ascensão social do carioca. Afinal, a Cidade do Rio sofreu e sofre ainda um verdadeiro sucateamento de bombas de sucção a tirar recursos da cidade para sustentar o novo estado, criado a partir de 1975. Somente a riqueza posterior dos poços de petróleo veio amenizar um pouco esse quadro de desalento.

Alguns governos municipais e estaduais populistas – nem todos, pelo menos – sem quaisquer compromissos com o bem comum, também têm parcela substantiva responsabilidade nesta senda de desatinos e de decadência. São muitos governos bem ruins para muito poucos razoáveis ou bons.

Muitos cariocas deixam o Rio para trabalhar em outras cidades e estados, onde, o mais das vezes, obtêm ascensão social, movidos não só pela falta de oportunidades, mas também pelo temor da violência. O efeito demonstração se realiza e levas de quadros qualificados deixam o Rio em busca de melhoria de vida.

As escolhas fazem o destino. O futuro do Rio dependerá do que fizermos no presente. A efetivação de um desempenho de sucesso não se circunscreve a um ou outro êxitos imediatos. Isto temos feito muitas vezes. O verdadeiro sucesso é uma relação de longo prazo. E geralmente decorre de nossa habilidade em conviver com momentos favoráveis e difíceis em absorver as subidas e descidas da montanha-russa do cotidiano, mantendo a trajetória em direção ao nosso sonho de recuperar o Rio em plenitude como Cidade Maravilhosa.

Muitas são as nossas vocações, maiores ainda os nossos recursos humanos e de instituições, ambientais e urbanísticos. O Rio dispõe de condições objetivas invulgares para sair da crise. É necessário, mais do que nunca, um projeto macroestruturante que viabilize as inúmeras vocações da cidade, através de um pacto carioca de consenso capaz de fazer interagir as instâncias de governo e todas as forças vivas da sociedade.

Wagner Siqueira

Diretor-geral da UCAdm – Universidade Corporativa do Administrador.

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