MP 1085/21 é um risco ao patrimônio do cidadão

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Assinatura contrato de imóvel (foto Pxhere CC0)
Assinatura contrato de imóvel (foto Pxhere CC0)

Se nem os cartórios estão de acordo com o proposto, quem estaria?

 

A Câmara dos Deputados aprovou a Medida Provisória 1085/21, que tem por objetivo criar procedimentos para o registro de títulos em cartórios, além de normatizar o Sistema Eletrônico de Registros Públicos (SERP) que viabiliza que atos notariais e negócios jurídicos, inclusive títulos e certidões, sejam entregues em formato eletrônico e pela internet. A bola agora está com o Senado.

Os oficiais de registros serão os operadores do sistema, que deverá estar em funcionamento até 23 de janeiro de 2023, conectando e compartilhando informações presentes em todos os tipos de cartório existentes no Brasil.

Porém o texto da MP permite o uso de assinaturas eletrônicas avançadas. Já diziam os mais velhos que o diabo mora nos detalhes, e eis que o pormenor em questão é uma espécie de salvaguarda para estelionatários e outros tipos de criminosos.

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É preciso entender a assinatura eletrônica avançada. Trata-se de uma manifestação de vontade produzida em meios digitais que garante que o signatário seja quem de fato ele diz ser. Utiliza elementos de segurança, como criptografia, e permite que outras evidências sejam utilizadas para verificar a autenticidade. Todavia há algo de arriscado neste tipo de assinatura, como a inexistência de obrigatoriedade de processos claros e credenciamento de empresas certificadoras pelo Estado. Noutras palavras, qualquer empresa ou mesmo pessoa pode disponibilizar sistema de assinaturas eletrônicas avançadas.

É exatamente a ausência do estado brasileiro neste universo de assinaturas eletrônicas avançadas que põe em risco a celebração de negócios jurídicos complexos, como a transferência de veículos e a compra e venda de imóveis, muitas vezes os únicos patrimônios conquistados a duras penas pelo cidadão.

Os cartórios, que com a pretendida inovação talvez obtivessem simplificação dos processos, melhoria de produtividade de seus profissionais e maior conveniência para seus púbicos, parecem não estar confortáveis com a iniciativa.

Vejamos o que disse, durante audiência pública na Câmara dos Deputados, a presidente do Conselho Federal do Colégio Notarial do Brasil, Giselle Oliveira de Barros, que representa quase 9 mil titulares de cartórios no Brasil:

“Eu acho que não haveria urgência, então deveria ter sido debatido através de um projeto de lei e não de uma Medida Provisória, passando por cima de todo o processo legislativo e dessa câmera também. E, assim, como representante dos quase 9 mil notários do Brasil, eu gostaria de chamar atenção para um único ponto que foi tratado nessa MP e que nos preocupa muito, em especial, seria o debate sobre a possibilidade da assinatura avançada nos termos a serem regulamentados pelo CNJ para a prática dos atos de transferência e/ou oneração de bens imóveis. Este assunto envolve a segurança jurídica de bens imóveis, bens de raízes, bens de grande valor, e muitas vezes, o único bem de valor que o cidadão comum tem durante toda a sua vida. Trata-se de um tema de grande importância e relevância ao interesse público, o Estado, que deve sim garantir a estabilidade destas relações.”

Segundo explicou a presidente do CNB, a Lei 14.063/20, também conhecida como lei das assinaturas eletrônicas, foi sancionada em 2020 quando consagrou que a assinatura eletrônica qualificada deve ser a única para celebração de negócios e transferência de imóveis em meios eletrônicos tendo em vista o modelo usado no mundo e, em especial, na Comunidade Europeia, bem como a garantia constitucional da propriedade.

Segundo a mandatária, essa assinatura “tem uma hierarquia estatal, ou seja, a hierarquia desta assinatura é baseada numa autarquia estatal, federal, o ITI, que credencia e audita todas as autoridades certificadoras desta hierarquia, desta cadeia, ou seja, temos a presença do Estado garantidor através da ICP-Brasil. Mas a MP, menos de 2 anos depois, infelizmente, reedita o tema.”

Se nem os cartórios, que em tese seriam superbeneficiados, estão de acordo com o proposto, quem estaria?

Tomara que o Senado Federal tenha mais prudência e dê ouvidos ao que uma das maiores instituições representativas do Brasil.

Tomara.

 

Edmar Araujo é jornalista, presidente-executivo da Associação das Autoridades de Registro do Brasil (AARB) e membro titular do Comitê Gestor da ICP-Brasil.

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