Nepotismo à brasileira e a falsa meritocracia na política

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Plenário do Congresso Nacional (Foto: Edilson Rodrigues/Ag. Senado)
Plenário do Congresso Nacional (Foto: Edilson Rodrigues/Ag. Senado)

Há bastante tempo a credibilidade geral dos políticos brasileiros anda depauperada e, com o progresso da democratização do acesso à informação através da internet (porém, em um ritmo não tão animador), a aproximação crítica dos eleitores com seus representantes tem sido cada vez maior.

Embora muitos políticos façam bom uso dessa ferramenta, trazendo o eleitor cada vez mais para o centro dos debates e pautando as demandas que são facilmente observadas, algumas figuras bastante conhecidas da política nacional pouco se importam com a propagação de suas opiniões nada populares e que, em alguns casos, ferem vários princípios da administração pública.

Recentemente, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, defendeu abertamente o nepotismo: “Se o parente é qualificado, qual é o problema?”. A brecha foi aberta pela versão atual da proposta apresentada pelo deputado Carlos Zarattini (PT-SP). O substitutivo de Zarattini acaba com as punições do artigo 11, restando apenas a possibilidade de condenar gestores públicos se o ato tiver causado prejuízo financeiro ou houver enriquecimento ilícito. Caso o texto seja aprovado como está, condutas como o nepotismo deixarão de resultar em sanções de improbidade, que podem levar à perda da função pública e dos direitos políticos.

O caso emblemático mais recente foi em 2017, quando o ex-prefeito do Rio Marcelo Crivella nomeou o filho, Marcelo Hodge Crivella, para o cargo de secretário da Casa Civil. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar para suspender a nomeação do filho do, até então, prefeito.

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Em tempos onde pautas pouco prioritárias como, por exemplo, a PEC da Imunidade, vêm ganhando espaço no Congresso Nacional – mesmo em meio aos muitos problemas decorrentes da maior pandemia mundial em quase um século – não surpreende que parlamentares acelerem a discussão sobre o afrouxamento da Lei de Improbidade Administrativa de 1992, que visa beneficiar, exclusivamente, os próprios membros da classe política.

Em Economia e Sociedade, de Max Weber (1922), o autor diz que a modernidade traz a separação entre o administrador e a administração pública, ou seja, a superação da burocracia patrimonialista (onde o Estado era tratado como patrimônio daqueles que o ocupam).

Entretanto, o caso brasileiro se aproxima mais da concepção de Schwartzman (1982), que cita que posições de privilégios são uma avaliação específica diretamente relacionada com o monopólio na oportunidade de acesso a bens materiais e ideais, configurando assim características de sociedades vigentes sob um regime neopatrimonialista.

No Brasil, é bem comum políticos em exercício usarem de suas influências para promoverem candidatos cujo sobrenome é similar. Para o professor Ricardo Costa de Oliveira, no campo político, a perpetuação do poder familiar significa a manutenção, pelas mesmas pessoas, do controle do Estado, do orçamento e das políticas públicas. É um círculo vicioso de concentração de recursos e poderes em poucas famílias, algo que, inclusive, permite diferentes formas de corrupção.

Segundo levantamento da Revista Congresso em Foco, em 2017, na Câmara dos Deputados e no Senado, 62% e 73% dos congressistas tinham, respectivamente, laços de sangue com outros políticos. O campo político reflete o problema da gigantesca desigualdade social brasileira e, pelo visto, inverter as prioridades em prol de sua própria classe parece ser a grande especialidade da casa do povo.

 

Marlon Cecilio de Souza é economista pela Uerj e pós-graduando em política e sociedade pelo Iesp-Uerj. Atualmente trabalha como analista de crédito no Bank of New Yok Mellon.

As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não refletindo, necessariamente, as opiniões das instituições das quais ele faz parte.

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