No Brasil, não temos o ‘new normal’, temos o ‘never normal’

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Restaurante durante a pandemia (Foto: Tânia Rêgo/ABr)
Restaurante durante a pandemia (Foto: Tânia Rêgo/ABr)

Sem nenhuma dúvida, 2020 foi um ano desafiador para todos. E colocou os profissionais de finanças, especialmente os CFOs, no epicentro das empresas durante a crise. Muitas delas, depois de assegurarem a segurança física e saúde dos talentos, focaram em gerenciar a liquidez dentro de um ambiente extremadamente incerto. Administrar investimentos, reduzir despesas operativas, ajustar capital de trabalho, assegurar linhas de crédito e obter suporte foram as principais prioridades.

Mas a importância e o papel central do CFO só tendem a aumentar em 2021 e no futuro. Logicamente que o foco muda muito de empresa para empresa, setor da economia, entre outros aspectos. Mas eu diria que, de uma forma ou outra, algumas ações prioritárias formam parte da agenda desse líder.

Se olharmos as prioridades do CFO para o futuro, as competências necessárias e o entorno político, econômico e social atual, o profissional de finanças mais qualificado para o desafio, sem dúvida, estaria no pódio o CFO brasileiro.

Quem já teve a missão de explicar para o CFO global ou para o Headquarters a complexidade de impostos e as constantes mudanças na legislação no Brasil, sabe bem do que estou falando. No Brasil, já vivemos constantemente um “never normal”. Abrir o jornal é um ato de fé: novas medidas provisórias que mudam tudo viraram um ritual diário.

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Os gestores no Brasil dedicam muito tempo – cerca de 2 mil horas por ano, segundo o Banco Mundial – apenas para lidar com questões burocráticas e com o pagamento de impostos.

Volatilidade cambial, inflação, complexidade fiscal, multiplicidade de regimes tributários, regulações alfandegárias, medidas do Banco Central, mudança constante de regras, insegurança jurídica, mandados de segurança, burocracia, travas para fazer negócios, infraestrutura colapsada e outros fatores fazem parte da “normalidade” do trabalho do CFO no Brasil. E é justamente nesse cenário de falta de normalidade é que o executivo brasileiro se desenvolve e cria as skills necessárias para sobreviver e ter êxito.

O CFO brasileiro tem que se adaptar rápido e constantemente. Também precisa ser extremadamente criativo, inovador e achar soluções rápidas para a empresa sobreviver e crescer. Além disso, necessita estar um passo à frente na digitalização e automatização. O Brasil, sem dúvida, está entre os países mais avançados em informatização fiscal. O CFO brasileiro sabe que transformação digital é um requisito essencial para estar no jogo.

Ao mesmo tempo, o CFO brasileiro precisa ter excelentes habilidades de comunicação, pois precisa explicar como funciona o Brasil. Para completar, o executivo deve atrair e desenvolver talentos em um ambiente cultural tão diverso e tão rico como é o Brasil. Também necessita criar uma cultura de diversidade e inclusão como pilares para maximizar a criação de valor.

Assim, na agenda de prioridades, é essencial investir no desenvolvimento de talentos. O gestor precisa ser um “servant leader”. Investir tempo em entender como realmente os talentos do time estão se sentindo. É fundamental que o CFO seja o líder da transformação digital da empresa. As transações serão touchless, e a informação será cada vez mais em tempo real.

A forma tradicional de reporte mensal, trimestral e anual não é mais o driver para as decisões. Ao mesmo tempo, com a crescente automação, como o uso de data analytics, AI, robotics, vemos que o perfil e as skills dos profissionais de finanças deverão mudar dramaticamente.

Sobreviver provavelmente tenha sido bom em 2020 e também nesse início de ano, mas, em breve, isso não será o suficiente. O objetivo do CFO para 2021 é retomar o crescimento da empresa. Muito provavelmente a inovação será para a maioria das empresas o maior motor de crescimento, mas não falo apenas em produto.

Em 2020, nós, CFOs, aprendemos muitas lições, como a necessidade de gerenciar liquidez. Nesse aspecto, é importante um maior fluxo de caixa de operações. Provavelmente, a maioria ajusta capital de trabalho, linhas de crédito e alavancagem. Sem dúvida, continuaremos com um foco maior no caixa gerado pelas operações, capital de trabalho e níveis de alavancagem. Fazendo uma analogia: dirigindo, de nada serve olhar apenas o velocímetro. Se não olhar o indicador de combustível, vai ficar sem gasolina.

Fundamentalmente, o CFO precisa ter em mente que é preciso ter modelos flexíveis de negócios. As organizações mais exitosas são as que mais rapidamente se adaptam. O perfil de talento e a transformação digital são pilares fundamentais para modelos de negócio mais flexíveis. Ele não tem que se preparar para o “novo normal”, mas sim para o “nunca normal”.

 

Carlos Bibi é CFO da The Lycra Company.

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