Nordeste: problema ou solução?

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Mais uma vez começa a retornar ao noticiário a grave questão da seca no Nordeste do Brasil. O assunto é, ao mesmo tempo, crônico e crítico. Cabe-nos, na qualidade de descendentes, com muito orgulho, de família nordestina , a responsabilidade de analisar o assunto, tecnicamente. A seca é um fenômeno que se repete periodicamente, ao longo do tempo. Sua aparição é perfeitamente previsível. Suas causas são conhecidas e suas conseqüências dramáticas perceptíveis, em todos os níveis.
O interesse da classe política nordestina, com as exceções conhecidas, é o de não resolver os óbices existentes. Assim, adotam medidas clientelistas e assistencialistas, oriundas de recursos da União, que aumentam seus patrimônios individuais ou familiares e são permutados por votos, provocando sua perpetuação no poder político, através de gerações, passando de pai para filho(a). Qualquer analista isento, até não muito perspicaz, é capaz de identificar os feudos instalados em cada região, caracterizando verdadeiras capitanias hereditárias.
Os recursos financeiros já encaminhados para atender às situações de crise, somados no decorrer dos tempos, a pretexto de socorrer as populações “flageladas”, superam em muito o montante de verbas necessário para eliminar as causas das longas estiagens nordestinas. Na realidade, a área submetida ao regime de semi-aridez não ultrapassa 630 mil quilômetros quadrados, espaço submetido ao domínio da caatinga, embora os políticos tenham oficializado um “polígono das secas” de superfície superior a um milhão de quilômetros quadrados.
Cumpre ainda ressaltar que o volume de águas superficiais, no interior desse polígono, corresponde a 175 bilhões de metros cúbicos por ano. Do volume total, somente 17% (30 bilhões de m³/ano) são captados e colocados à disposição da população. Além desta substancial sobra de águas superficiais, o Nordeste é muito bem dotado de aqüíferos subterrâneos, ainda não precisamente dimensionados, mas com vazão estimada superior à das águas superficiais. Os maiores aqüíferos coincidem com as estruturas sedimentares da região. É necessário ainda aumentar o tempo de trânsito dessas águas superficiais, mediante a construção de barragens nos eixos principais da bacia, iniciando programa urgente para delimitação, avaliação e aproveitamento das águas subterrâneas, cujo volume estimado deve ser o dobro das águas de superfície e, para culminar, é preciso assegurar a perenização de rios da região, mediante a transposição de águas do São Francisco e do Tocantins. Uma vez “alagada” a região, o amor do nordestino à terra, a boa qualidade dos solos regionais e a forte insolação, favorável a reação fotossintética, resolverão os obstáculos existentes, permitindo aos nossos irmãos nordestinos sua redenção.
Outro ponto importante a considerar é a questão relativa ao índice pluviométrico da região. A escassez de chuvas deve-se ao alinhamento das cadeias montanhosas regionais, formando barreiras à penetração da umidade a sotavento das elevações e à inflexão brusca do litoral, na altura do paralelo de 05″S, que faz com que os ventos soprem paralelamente à linha da costa, de Natal (RN) até Luiz Correia (PI). O clima nordestino merece atenção por atingir diretamente 30% os brasileiros, incluindo a maioria do segmento populacional submetido à miséria, transformando a região no maior centro de migração interna, responsável pela superpopulação dos centros urbanos em todo o País.
Para minorar este fator adverso, é imperioso amparar os produtores rurais de baixa renda, aqueles com baixa capacitação profissional para a produção rural, que desejam, em princípio, pequenos lotes de terra próximos às cidades. O que pretendem é possuir um meio mínimo de subsistência, necessitando de apoio do Estado e representam a minoria dos produtores. Para estes, poderá ser procedida uma reforma agrária de acomodação. Caracteriza-se por ser uma obra fundamentalmente social, não objetivando necessariamente ao aumento da oferta agrícola. Toda essa população que será assentada não detém a capacitação para um aumento de produção de curto prazo. A meta principal é que o trabalhador do campo e suas famílias sejam assistidos e orientados tecnicamente para a agricultura e a agroindústria , através da criação de mecanismos específicos de financiamento e de suporte material que lhes permitam prover os demais meios de subsistência. Em paralelo, outras atividades deverão ser incrementadas como às ligadas à construção de habitações, à captação e distribuição de água, à coleta e tratamento de esgotos sanitários e industriais, à higiene, à geração e distribuição de energia elétrica, à operação e manutenção de máquinas e implementos agrícolas e manutenção de todas essas instalações. E tudo apoiado na infra-estrutura montada pelo Estado, em especial na saúde (unidades básicas de saúde) e na educação (escolas rurais). Ainda é oportuno lembrar o aproveitamento de outras atividades econômicas como, por exemplo, o turismo, fonte de riquezas de vários países. E o Nordeste é pródigo em sol, praias maravilhosas, povo hospitaleiro.
O Nordeste não é problema e sim solução. O bravo povo nordestino não quer esmola e sim condições de sobreviver dignamente. Chega de humilhação! Vamos agir enquanto é tempo, para evitar a repetição de cenas dantescas, como a de crianças subnutridas, sendo alimentadas por água de plantas, morrendo no colo de suas mães, esquálidas, sem nada poder fazer, a não ser orar a Deus. No limiar do terceiro milênio, o decantado fenômeno da globalização e as imaginárias benesses do neoliberalismo conduzem a isto. É só destinar os recursos apropriados e fazer com que estes recursos cheguem aos destinatários finais incólumes.

Marcos Coimbra
Professor titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes e conselheiro da Escola Superior de Guerra (ESG). Correio eletrônico: [email protected]

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