A desigualdade na distribuição de médicos atuando no Brasil é ainda mais evidente no Norte e Nordeste, regiões com o menor número de profissionais na ativa, segundo dados da Associação dos Mantenedores Independentes Educadores do Ensino Superior (Amies). Ambas as regiões contam com menos de dois médicos por mil habitantes, número muito abaixo da recomendação de 3,73 médicos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Estados como o Maranhão, na Região Nordeste, e o Pará, na Região Norte, contam com os menores índices de médicos por mil habitantes: 1,13 e 1,22, respectivamente. Outros estados também se destacam negativamente pela falta de profissionais, como o Piauí, com 1,40 médico por mil habitantes, Acre com 1,46 médico, Bahia com 1,90 médico e Ceará com 1,95 médico.
Somando as regiões Norte e Nordeste, são mais de 71 milhões de habitantes e apenas 130 mil médicos, números que reforçam a carência de profissionais. Para atenuar esse cenário, há diversas faculdades que estão com processos em tramitação no MEC para abertura de novos cursos de medicina e também para aumentar as vagas nos cursos já existentes em ambas as regiões.
No Nordeste, são 50 pedidos de criação de novos cursos e 32 pedidos de ampliação das vagas, como na Universidade Federal de Campina Grande, na Paraíba, e na Faculdade de Medicina de Olinda, em Pernambuco.
Já no Norte, são 24 pedidos de criação de novos cursos e cinco pedidos de ampliação das vagas, como na Faculdade de Ciências Médicas de Palmas, no Tocantins, e no Centro Universitário Ceuni – Fametro de Manaus, no Amazonas.
“Em abril de 2018, o MEC publicou a Portaria MEC nº 328/2018 suspendendo por cinco anos a criação de novos cursos de medicina e o aumento de vagas em cursos já existentes”, explicou o advogado Esmeraldo Malheiros. “Nesse sentido, diversas instituições de ensino, fundada no direito de petição e na livre iniciativa no campo do ensino, assegurada no art. 209, II da Constituição da República, pleitearam ao MEC autorização para a implantação de curso de medicina, tendo em vista a demonstração da demanda e da necessidade social do curso na região, bem como a carência de profissionais médicos e a existência de equipamentos públicos de saúde e de infraestrutura preparada exclusivamente para a oferta do referido curso, tais como laboratórios, corpo docente, biblioteca”, afirmou.
Para o advogado Edgar Jacobs, especializado em Direito Educacional, “O MEC não parece preocupado com isso no caso dos cursos de Medicina. Sua avaliação, que até 2023 tentava fazer algum sentido, tende a ser uma análise enfermiça desde que o Supremo Tribunal Federal garantiu o seguimento de processos de autorização protocolados a partir de ações judiciais.”
O STF assegurou esse andamento em parte por conta dos erros da União. No acórdão final do julgamento da ADC nº 81, o Tribunal aponta a omissão da AGU e a moratória de cinco anos implementada pelo Ministério como motivos para preservar as justas expectativas, da sociedade e das Instituições de Ensino, quanto aos novos cursos.
“Porém, portando-se como mau perdedor, o MEC tenta barrar os cursos na via administrativa. Com isso, o que deveria ser um processo de avaliação de qualidade passou a ser uma sequencia de ilegalidades voltadas a evitar os efeitos pretendidos pela decisão do STF, avalia.
Ainda segundo ele, “o cálculo do número de médicos por habitantes é feito considerando como um ‘médico’ a atribuição de 40 horas semanais de trabalho a um profissional. Assim, pela metodologia adotada, 400 horas semanais contratadas por um município equivaleriam a 10 médicos. Mas esta é uma comparação inviável em muitas cidades brasileiras. Na cidade de Lages, por exemplo, onde o dado foi usado para indeferir um curso, o município confirmou que os profissionais prestam, em média, mais de 20 horas-extras por semana. Ora, um profissional que atua 60 horas semanais, mesmo merecendo que seu esforço extra seja valorizado, não é equivalente a ‘um profissional e meio’, ele é, na verdade, um médico sobrecarregado, porque provavelmente faltam profissionais na cidade.”