A B3, com apoio da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), prepara uma nova plataforma voltada ao IPO de empresas de médio porte. A iniciativa promete ampliar o acesso dessas companhias ao mercado de capitais, com regras mais adequadas à sua realidade, e agrada os profissionais que atuam no setor.
“A iniciativa é altamente positiva. Historicamente, o mercado de capitais brasileiro tem sido mais acessível a grandes corporações, deixando de lado empresas menores que também buscam financiamento para expansão. Essa plataforma promete democratizar o acesso ao mercado de capitais, oferecendo regras mais adequadas à realidade de cada empresa”, avalia Marcus Valverde, sócio do Marcus Valverde Sociedade de Advogados.
Samuel Vilarinho, sócio do Vilarinho Advogados, explica que o Fácil – Facilitação do Acesso a Capital e de Incentivo à Listagens é um regime de listagem inovador, que prevê mudanças regulatórias extremamente positivas e necessárias ao ambiente de mercado de capitais brasileiro, e está ancorada em dispositivos legais recentemente introduzidos na Lei das S/A (arts. 294-A e 294-B).
“Tal regime tangibiliza, de forma concreta, o anseio de empresas de médio porte em sua busca por financiamento privado a partir de ofertas públicas, bem como traduz uma tentativa concreta da CVM de modernizar o acesso ao mercado de capitais, especialmente para empresas que usualmente ficam à margem desse ecossistema de mercado de capitais por conta de custos regulatórios elevados e burocracia excessiva no processo de listagem de companhia aberta”, diz Vilarinho.
Para ele, a proposta da CVM é ousada e está em linha com o desenvolvimento dos mercados regulados de outros países, possibilitando um ambiente regulado mais acessível. “A nova norma terá como objetivo dar condições facilitadas para o acesso de companhias de menor porte ao mercado de capitais, que estão em uma faixa intermediária entre o crowdfunding de investimentos e o mercado tradicional de valores mobiliários”, destaca Vilarinho.
Potencial de 500 mil empresas
Conforme os dados recentes do Cadastro Central de Empresas (Cempre) do IBGE, o Brasil possui aproximadamente 5 milhões de empresas ativas, sendo que mais de 99% delas são classificadas como micro, pequenas e médias empresas (MPMEs) – ou seja, com faturamento inferior a R$ 500 milhões por ano. A estimativa é que há um horizonte de aproximadamente 10% – isto é, cerca de 500 mil empresas – que poderiam, imediatamente ou em um prazo de 5 anos, estarem aptas a participarem de um processo de registro de companhia aberta e realizar uma oferta pública nos termos do Fácil.
“A criação de um ambiente regulatório e operacional adaptado às necessidades das empresas de médio porte é crucial para fomentar o crescimento econômico. Ao facilitar o acesso dessas empresas ao mercado de capitais, promove-se a diversificação de investimentos, o aumento da competitividade e a geração de empregos. Além disso, incentiva-se a formalização e a melhoria da governança corporativa dessas companhias. A medida será importante e poderá garantir a rápida expansão de empresas de diferentes portes”, afirma Valverde.
Principais mudanças para facilitar IPO de empresas de médio porte
De acordo com Vilarinho, o Fácil apresenta mudanças estruturais importantes, dentre as quais podemos destacar:
a) Democratização do mercado de capitais: Ao permitir que empresas com faturamento de até R$ 500 milhões acessem o mercado com menos exigências e com menores custos e despesas, o regime amplia o rol de participantes, possibilitando um volume maior de captações em números absolutos e reduz a concentração em grandes corporações
b) Crescimento econômico e inovação: Pequenas e médias empresas são grandes geradoras de emprego e inovação. Com acesso facilitado a capital por meio do mercado de capitais, tais sociedades podem encontrar uma alternativa ao financiamento privado, especialmente ao capital de risco (venture capital), possibilitando a ampliação e scale-up de suas operações, o investimento em expansação e novas tecnologias, e a entrada em novos mercados
c) Crédito privado: o novo regime também implica um novo estímulo ao crédito privado, seja por meio de emissão de equity ou por meio do uso de instrumentos de dívida privada, reduzindo a dependência de crédito bancário e promovendo um mercado mais dinâmico e resiliente
Consulta pública
Além disso, afirma o Vilarinho, há várias mudanças significativas previstas na consulta pública sobre o Fácil que devem estar presentes na norma a ser editada pela CVM, dentre as quais:
- a) Simplificação do processo de listagem por meio do registro automático após listagem em mercado organizado
- b) Substituição de diversos documentos regulatórios por um único formulário anual
- c) Divulgação das informações financeiras e contábeis semestralmente
- d) Ofertas públicas de até R$ 300 milhões por ano sem necessidade de registro prévio na CVM
- e) Menor volume de despesas com a observância regulatória, bem como dispensa da participação de diversos assessores no processo de registro e listagem
“Com a nova plataforma e iniciativas como o regime Fácil da CVM, espera-se uma redução significativa na burocracia e nos custos associados à abertura de capital. O regime Fácil prevê simplificações como registro automático após listagem, documentação única e balanços semestrais, tornando o processo mais acessível para empresas com faturamento de até R$ 500 milhões. Isso representa uma mudança paradigmática, permitindo que mais empresas considerem o IPO como uma opção viável para captação de recursos”, comenta Valverde.
Bolsa de Valores de acesso
Importante lembrar que recentemente, a BEE4 conseguiu as licenças definitivas da CVM para operar como Balcão Organizado e Central Depositária – dando mais um passo para criar uma “Bolsa de Valores de acesso” no Brasil, nos moldes da canadense TSX Ventures e da inglesa AIM.
“A BEE4 tem empreendido um esforço significativo no desenvolvimento de um mercado secundário para ações de empresas de médio porte por meio do sandbox da CVM. Agora, com a licença para operação como Balcão Organizado e Central Depositária, ela dá mais um passo no ambiente competitivo que está se criando para a realização de ofertas públicas por empresas de médio porte”, destaca Vilarinho.
“A BEE4 representa uma inovação significativa no mercado de capitais brasileiro. Ao focar em empresas com faturamento anual entre R$ 10 milhões e R$ 300 milhões, ela preenche uma lacuna existente entre startups e grandes corporações. Ao preencher essa lacuna entre startups em estágio inicial e grandes corporações listadas, a BEE4 cria uma ponte essencial para a capitalização e o crescimento sustentado de empresas emergente”, finaliza Valverde.
Por Gilmara Santos, especial para o Monitor