Conversamos sobre o resultado do 4T24 do Nubank com Júlio Vieira, gestor e contribuidor do TC.
Qual a sua avaliação sobre o desempenho do Nubank no 4T24 e em 2024?
Há um consenso de que o resultado do Nubank foi muito bom em 2024. O banco tem mostrado uma boa eficiência operacional, com uma forte alavancagem operacional e com o crescimento contínuo do seu lucro.
Quando pegamos o índice de eficiência, que mede quanto o banco gasta para conseguir extrair receita do cliente, nós vemos que o Nubank tem melhorado esse índice frente aos seus pares listados ao longo do tempo. Essa pode ser uma métrica que fica escondida, mas como a receita média mensal por cliente ativo do Nubank, tanto no trimestre, quanto no ano, vem subindo, isso faz com que o banco gaste menos para extrair receita dos seus clientes.
Com relação a inadimplência, ela se mostrou bastante controlada no 4T24, principalmente na inadimplência de longo prazo. que, geralmente, exige mais garantias e mais provisionamento. Aqui, nós temos um ponto interessante, que traz uma certa vantagem para o Nubank em relação aos seus pares: o custo de servir mais barato. Como o Nubank traz os clientes de forma mais barata e extrai muita receita deles, por mais que haja um aumento na inadimplência dos clientes de baixa renda, o banco consegue fazer um contrapeso positivo com os clientes de tickets maiores. Isso faz com que o Nubank consiga absorver mais a inadimplência enquanto expande a sua carteira de crédito.
Outro ponto interessante é a expansão do Nubank na América Latina, que tem Brasil, Colômbia e México como principais destinos operacionais. Olhando para o México, a curva de crescimento do banco é muito alta, tanto que ele teve um crescimento de 91% da sua base no ano contra ano. Essa base, que fechou 2024 em 10 milhões de clientes, representa 12% da população adulta do país. Além disso, há um gigantesco espaço de crescimento para o Nubank no México, já que o PIB per capita do país é muito maior que os PIBs per capita do Brasil e da Colômbia.
A base de depósitos também cresceu bastante, sendo que o Nubank ainda pode crescer muito nesse quesito, principalmente no Brasil, já que a regulamentação ainda não bate no banco como bate em bancos incumbentes como Itaú, Bradesco, Santander e Banco do Brasil.
Para finalizar, no final de 2024 o Nubank divulgou que pretende mudar o seu domicílio para o Reino Unido de forma a ampliar a sua expansão internacional. Veja que o mercado já vem pagando esse crescimento na frente, tanto que o múltiplo do Nubank é muito maior que os múltiplos dos seus pares.
O que mais lhe chamou a atenção nos números do Nubank?
Os números são muito bons, mas o que estava gerando um pouco de dúvida no mercado era a inadimplência. O UBS, por exemplo, soltou um relatório que dizia que o PDD do Nubank poderia subir 20% ao longo de 2025, o que exigiria um provisionamento muito maior por parte do banco, contudo, nós vimos a PDD sendo reduzida ao passo em que a sua eficiência aumentou bastante. Dessa forma, eu ainda não vejo a inadimplência como um problema.
O Nubank tem muitos desafios para crescer e “desruptar” o mercado, mas eu tenho a opinião de que o problema da inadimplência reportada no 4T24 é muito mais um ruído do que um sinal de risco.
Outro ponto é a ARPAC (Average Revenue Per Active Customer), a receita por cliente ativo, que, como comentei, está subindo. Por mais que a ARPAC do Nubank tenha aumentado de forma consistente, ela ainda é muito baixa frente às APACs dos bancos tradicionais. Contudo, como o Nubank é um banco digital, que não tem agências, mesmo que a sua ARPAC fique em 40%, 50% do patamar dos bancos tradicionais, o Nubank consegue dobrar ou até triplicar a sua receita.
Como você avalia a qualidade dos clientes que o Nubank tem colocado para dentro da sua base?
Historicamente, o Nubank é muito mais focado nos clientes de baixa renda. O banco oferece o cartão de crédito como primeiro contato para tentar entender o cliente, mas na medida em que esse cliente utiliza o cartão, pega empréstimos pessoais e aproveita o ecossistema do banco, ele é convertido em um cliente bancário, o que traz receitas de serviços para o banco. Esse é o método que o Nubank utiliza para crescer a sua base.
Como o Nubank não tem agências e não paga comissão para profissionais que vendem esse crédito na ponta, o seu custo para avançar nesse nicho é de R$ 10 mensais por cliente, enquanto os “bancões” possuem custos de R$ 40, R$ 50 mensais. Isso fez com que o Nubank, nos últimos 4 anos, capturasse muito mais clientes de baixa renda que os bancos tradicionais.
Agora, o fato de um percentual relevante da carteira do Nubank ser formado por clientes de baixa renda significa que existe um desafio para o banco frente aos clientes de alta renda. Se pegarmos a fatia de brasileiros que ganham entre 5 e 10 salários mínimos, a participação do Nubank nesse mercado não chega a 6%. Por exemplo, os “bancões” possuem convênios com a União, estados e prefeituras que lhes permitem capturar clientes de renda e capacidade de pagamento muito maiores. Esses clientes geram receitas significativas, possuem ticket médio muito alto e dificilmente ficam inadimplentes, já que esses convênios são de empréstimos consignados descontados na folha de pagamento. O Nubank tem muita dificuldade para crescer nesse nicho.
Em suma, apesar de o cliente do Nubank ter uma tendência a ficar inadimplente, a baixa estrutura de custos do banco lhe ajuda a manter um baixo nível de provisionamento enquanto ele cresce, exponencialmente, a sua carteira de crédito e rentabiliza os clientes ao longo do tempo.
Como você avalia a evolução do lucro líquido do Nubank?
A trajetória é positiva e o lucro ainda é bastante saudável. O crescimento exponencial do Nubank, aliado a um custo muito baixo para extrair receita dos seus clientes ativos, faz com que o banco não precise provisionar tanto, o que acaba fazendo com que ele tenha um lucro de fato, e não, digamos, fabricado.
Além desse lucro, como disse, ser bem saudável até o momento, nós não vemos a inadimplência pesando tanto a ponto de fazer o banco entregar um prejuízo, como aconteceu com alguns incumbentes no pós-pandemia.
O que é correto: considerar o lucro líquido ou o lucro líquido ajustado do Nubank?
O lucro líquido ajustado dá uma visão mais transparente em relação ao resultado corrente do banco. Isso porque ele exclui eventos não recorrentes, como algumas contabilizações de impostos e programas de opções para a diretoria. O lucro líquido não vai mostrar isso, mas o lucro líquido ajustado tira isso da conta e dá uma visão mais clara da operação.
O aumento da Selic favorece, atrapalha ou é indiferente a um banco como o Nubank?
Devido ao modelo de operação do Nubank, o aumento ou a queda da Selic é indiferente. Isso porque o Nubank estuda o cliente, dá o cartão como primeiro contato e depois tenta convertê-lo para aproveitar o ecossistema do banco. Diferente dos “bancões”, que enxugam os empréstimos quando a Selic aumenta, a operação mais enxuta do Nubank exclui esse fator mais sazonal.
Como você avalia o desempenho das ações do Nubank, inclusive a queda das ações após a divulgação do lucro líquido de 2024, que aumentou pouco mais de 91% em comparação a 2023?
É preciso entender que o mercado antecipa os movimentos futuros. Logo após o seu IPO, o Nubank foi negociado a um múltiplo muito alto frente aos bancos incumbentes, mas como ele ainda não havia se provado, ele saiu de R$ 12 para R$ 4, já que o mercado havia pago muito na frente por algo que ainda não havia acontecido. Na medida em que o banco foi se provando, esse múltiplo foi se depreciando.
Por mais que o resultado do Nubank seja impressionante, é preciso verificar se o banco vai manter a sua eficiência com uma carteira de crédito 10, 12 vezes maior. Isso porque com uma carteira muito maior e exposta a crédito pessoal, o Nubank poderia ver o crescimento da sua inadimplência e da sua necessidade de capital regulatório.
Assim, é muito difícil estimar que o Nubank vai valer muito mais que os bancos tradicionais sem que ele tenha uma diversificação operacional e uma previsibilidade de que vai continuar crescendo de forma exponencial enquanto a inadimplência e a eficiência vão seguir em linha.
O que um investidor, que compra uma ação do Nubank, deve esperar?
O investidor que compra Nubank precisa ter claro dois pontos. O primeiro é que ele está comprando um banco com alto potencial de retorno, mas que tem um risco maior. O segundo é que o mercado vai precisar pagar um múltiplo cada vez maior, dado que o banco vai seguir crescendo. Para isso, o pensamento do investidor tem que ser mais alongado.
Isso é diferente de um banco tradicional, que tem uma carteira amplamente consolidada e que paga bastante dividendos. Esses bancos, que são mais ligados ao value, não possuem tanto espaço para crescer de forma significativa como o Nubank.
Se o investidor tem um perfil mais agressivo e aguenta uma volatilidade maior no curto prazo, para, de repente, capturar um desempenho operacional muito maior lá na frente, o Nubank faz sentido para a carteira. Agora, se o investidor é mais comedido e não está disposto a tomar um risco muito significativo, o Nubank pode não ser uma ação interessante para a sua carteira, mas se for para colocá-la, que seja com um peso um pouco menor.
Como você está vendo as perspectivas do Nubank para 2025?
As perspectivas são muito positivas, mas o Nubank tem o desafio do múltiplo, já que não é possível saber se o mercado vai seguir pagando na frente a partir de agora.
Para este ano, os resultados operacionais vão melhorar, já que o banco vem crescendo a carteira de forma exponencial nos países onde atua. O ponto é que o mercado vai ficar com a régua alta em relação à inadimplência.
O Nubank está conseguindo se provar com o seu crescimento agressivo ao mesmo tempo em que mantém um nível de eficiência muito alto, mas como o valuation está precificando a perfeição, qualquer piora na inadimplência pode ser um detrator do múltiplo, mas, na minha opinião, como disse no começo da entrevista, a inadimplência deve cair.
















