Conectividade em áreas remotas e dependência de um único provedor são as duas faces da moeda Starlink. A emissora ABC, a estação de televisão global dos EUA, conversou com vários especialistas. Aqui está o que emergiu, entre os temores pela segurança nacional e a necessidade de competição.
O dilema de vários países quando se trata do serviço de internet via satélite Starlink, de Elon Musk, envolve, por um lado, as necessidades de conectividade nas zonas mais remotas e, por outro, o risco de depender de um único fornecedor.
Esse impasse está sendo discutido na Austrália. Trata-se, de fato, de um país que, por razões geográficas (grande superfície e baixa densidade populacional), é particularmente adequado para comunicações por satélite.
Desde o seu lançamento em 2021, o Starlink tornou-se essencial nas telecomunicações, com 200 mil utilizadores em áreas remotas, incluindo emergências. O NSW Rural Fire Service (o maior serviço de bombeiros voluntários do mundo), em Nova Gales do Sul, por exemplo, investiu 41 milhões de dólares australianos (pouco menos de 25 milhões de euros) para integrar o Starlink nos seus veículos, facilitando, assim, a transmissão de vídeo em tempo real dos locais de incêndio, além de equipar 50 unidades da Defesa da Marinha com esse sistema.
Segundo Luke Coleman, CEO da Communications Alliance na Austrália, as redes móveis cobrem 99,5% da população, mas apenas 30% do território. A Starlink entrou, portanto, num importante vazio de mercado, oferecendo internet rápida graças aos satélites de órbita baixa.
Contudo, alguns analistas encaram essa dependência crescente com preocupação. Malcolm Davis, analista do Australian Strategic Policy Institute, teme que depender de uma única operadora, como a Starlink, possa ser arriscado. Segundo Davis, se Musk decidir interromper o serviço, a Austrália poderá ficar sem infraestrutura vital de comunicações, especialmente em caso de crise.
Experiências passadas, como a limitação do serviço Starlink na Ucrânia durante o conflito, mostraram como o magnata sul-africano pode usar o controle das suas empresas para perseguir objetivos políticos pessoais, tornando a estabilidade do serviço potencialmente imprevisível.
Paul Budde, analista de telecomunicações, defende que essa dependência é “muito perigosa”, considerando que o Starlink representa, hoje, um serviço essencial para muitas comunidades e serviços críticos. Budde sugere que o governo australiano não deve ignorar esses riscos, especialmente levando em conta o papel crítico que a Starlink adquiriu rapidamente.
A crescente proeminência da Starlink levantou questões sobre a soberania tecnológica da Austrália. Coleman e outros especialistas acreditam que a melhor solução para reduzir os riscos de soberania é a competição. Alternativas como o Eutelsat OneWeb e o Project Kuiper da Amazon estão desenvolvendo serviços semelhantes, embora nenhum ainda tenha uma presença estável comparável à do Starlink. Embora alguns analistas, incluindo Davis, proponham a criação de uma rede soberana de satélites, isso envolveria custos e dificuldades significativas. A Starlink, por exemplo, opera com mais de 6 mil satélites, enquanto uma constelação australiana exigiria centenas de satélites para garantir uma cobertura constante em todo o país. Por fim, os lançamentos espaciais são dominados pela SpaceX, controladora da Starlink, que lidera o setor graças à tecnologia de foguetes reutilizáveis, oferecendo preços bastante competitivos em relação aos concorrentes.
Edoardo Pacelli é jornalista, ex-diretor de pesquisa do CNR (Itália), editor da revista Italiamiga e vice-presidente do Ideus.