O meio ambiente diante do ‘novo normal’

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Não se sabe exatamente quando tudo voltará ao normal após a maior crise sanitária por conta da pandemia da Covid-19. Todavia, a cada dia e lentamente a vida recomeça sob o signo de um “novo normal”, mais solidário e menos desigual. Espera-se que esse “novo normal” se estenda ao meio ambiente, que há anos vem sofrendo os efeitos da poluição, da degradação, da exploração e apropriação indevidas, gerando injustiças, desigualdades sociais e empobrecimento do país.

Em meio à pandemia, a Amazônia agoniza, com 529 km² de floresta devastados no mês de abril, o maior número em dez anos, equivalente ao município de Porto Alegre, segundo o Imazon. Houve um aumento de 171% em relação ao mesmo mês do ano passado quando o desmatamento foi de 196 km². Saliente-se que 60% desse desmatamento ocorreu em áreas privadas, regularizadas ou mesmo aquelas objeto de posse ou ocupadas.

A fim de combater o desmatamento e focos de incêndio, foi editada em 11 de maio uma ação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) a ser coordenada por militares e que deverá vigorar até 10 de junho desse ano. Coincidência ou não, pode-se ver que já com certo atraso perdeu a validade, na segunda quinzena de maio, a Medida Provisória (MP) 910, que vigorava desde dezembro de 2019, conhecida como MP da Grilagem. Essa MP tinha por objetivo a regularização de grandes porções de terras ocupadas até maio de 2014 na Amazônia Legal, sem necessidade de vistoria prévia, com possibilidade de outorga de títulos a ocupações recentes. Todavia, a empreitada segue adiante por meio de projeto de lei que reduz a área objeto de regularização e aumenta o tempo de posse anterior sobre a mesma. Seria interessante comparar o percentual de desmatamento em épocas de notório estímulo à grilagem de terras, para que esse índice seja agregado às discussões em torno do referido projeto.

Numa toada similar, a Lei da Mata Atlântica foi recentemente “superada” por ato administrativo que cancelou multas e reconheceu as propriedades rurais sobre área pública cuja ocupação tenha ocorrido antes de 2008.

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Nesse “novo normal” que se aproxima, é certo que as florestas brasileiras não podem resistir a tamanha devastação e já chegam a esse atual momento combalidas. Nessa situação, é certo que qualquer concessão de área pública a particulares, seja na Amazônia ou em qualquer outro bioma, tem que ser precedida de vistoria para avaliar dentre outros: o real aproveitamento de áreas antigas já degradadas, a preservação da Reserva Legal, o aproveitamento racional dotado de função social das áreas ocupadas e que serão regularizadas, a preservação das nascentes e cursos de água, tudo em conformidade com as leis em vigor.

Apenas será possível um “novo normal” em sede ambiental com informação, cobrança e participação individual, comunitária ou coletiva. É necessário um debate sério do legislativo acerca de projetos de regularização fundiária de terras da união para a Amazônia Legal e outros biomas com regras claras de preservação da biodiversidade, do solo e subsolo e, essencialmente, de preservação das terras das populações indígenas e povos da floresta. É importante que esses povos não acabem cercados por terras privatizadas, sujeitos, inclusive, ao contágio por doenças desconhecidas e contra às quais não podem lutar. O perigo dessa aproximação veio a lume com a pandemia da Covid-19 e gerou o manifesto dos povos indígenas, ameaçados de genocídio, cujo apelo internacional liderado pelo renomado fotógrafo Sebastião Salgado, ainda carece de resposta pelas autoridades brasileiras.

Espera-se que esse “novo normal”, envolva o meio ambiente, conscientizando os possuidores e proprietários rurais, bem como todos os líderes locais e nacionais de que o avanço da fronteira agrícola não está ligado ao desmatamento, diante da significativa quantidade de áreas já desmatadas e abandonadas, passíveis de reaproveitamento. É essencial a compreensão de que o enriquecimento do país também depende do aproveitamento racional da biodiversidade. Além, que as expressões preservar, prevenir e precaver são dotadas de sentido que concretizam o desenvolvimento sustentável e sem as quais o meio ambiente está condenado a definhar no “velho normal”.

 

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