O novo ciclo de alta da Selic e a renda fixa

Nesta conversa, Jansen Costa explica como um título de renda fixa pode variar como renda variável.

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Jansen Costa (foto Fatorial Investimentos)
Jansen Costa (foto Fatorial Investimentos)

Conversamos com Jansen Costa, sócio-fundador da Fatorial Investimentos, sobre o novo ciclo de alta da Selic e a renda fixa.

Considerando o novo ciclo de alta da Selic, como um investidor deve se posicionar na renda fixa?

No Brasil, nós temos três maneiras de investir em renda fixa. Na verdade são duas, mas o Brasil é tão esquisito que são três: os títulos pós-fixados; os títulos prefixados, cujas taxas, que valem até o vencimento, são definidas no momento da emissão; e a NTN-B, uma invenção brasileira que tem uma parte prefixada e uma parte pós-fixada, que é a inflação.

Basicamente, quem define a forma como a dívida será emitida é o Tesouro Nacional ou a tesouraria de um banco, sendo que, dependendo do momento, os emissores vão ter mais apetite por um tipo de estratégia. Cabe destacar que enquanto o maior objetivo dos investidores é aumentar a sua rentabilidade, o objetivo dos emissores é diminuir o seu custo de captação, sendo que essas duas visões não conversam.

É por isso que um investidor pessoa física precisa entender e casar o seu objetivo com a estratégia de renda fixa. Para isso, ele precisa ter alguns números como referência e entender que, entre esses três produtos, o único que vai lhe dar liquidez para usar o dinheiro a qualquer momento, independente do cenário de juros, é o pós-fixado. Se esse investidor aplicar em um título prefixado ou uma NTN-B, ele deve esperar até o vencimento, e uma vez que ele faz isso, não há motivo para se desesperar com a oscilação das taxas no mercado.

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É possível ganhar dinheiro com títulos prefixados e NTNs-B? É, mas o objetivo do investidor pessoa física deveria ser alocar dinheiro, e não especular nesse tipo de operação, pois ele não vai ter todas as informações necessárias para fazer isso.

Feito esse panorama, para que se possa aproveitar o novo ciclo de alta da Selic, é preciso, primeiro, olhar o prazo de investimento. Atualmente, a Selic está em 10,75%. Se uma NTN-B de cinco anos estiver pagando 6,5%, nós estamos falando de uma inflação de 4,25%. Se o investidor acredita que a inflação será próxima ou maior que esse número, ele terá um retorno maior que 100% da Selic. “Ahhh, mas a Selic também pode subir!”. Pode, mas isso exigiria mais inflação.

No curto prazo, um título atrelado à inflação pode perder para o CDI, como está acontecendo agora, mas se o horizonte é maior que 5 anos, o investidor deveria aplicar em IPCA+ para esperar o vencimento. Isso porque, estatisticamente, quando esse título paga entre 6% e 7% mais inflação, ele bate o CDI em uma janela de três anos. Contudo, se a aplicação for feita a 6,5%, mas o título for, posteriormente, a 7%, o investidor não poderá sacar para fazer uma nova aplicação, pois se ele sacar, ele vai perder dinheiro. Se ele quiser aproveitar o 7%, ele vai ter que fazer uma nova aplicação.

Com relação aos prefixados, eu só compraria esses títulos se estivéssemos em um ciclo terminal de alta de juros. Isso porque, se nós temos um cenário inflacionário ou um cenário em que o governo está gastando mais, como o que temos exatamente agora, os juros terão que subir muito mais. Se isso acontecer, o investidor não deveria comprar um prefixado de 12%, pois os juros desses títulos podem subir para 13%, 14%, 15%. Por exemplo, em momentos de pico, com uma Selic de 14%, você compra uma prefixado de 17%, 18%.

Como um investidor pode administrar os ciclos de alta, manutenção e queda da Selic na renda fixa?

O investidor deve acompanhar, mas ele não deve se preocupar no curto prazo. No início do ano, nós tínhamos um ciclo de corte, sendo que agora temos um ciclo de alta. Isso se deu porque o crescimento do país está sendo feito com base em expansão monetária. Como o governo está colocando muito dinheiro, nós podemos ter inflação ou podemos chegar ao teto da produtividade, o que pode gerar escassez de produtos, e uma vez que temos isso em um cenário de alta demanda, os preços podem subir e gerar pressões inflacionárias. Como consequência, o Banco Central está tendo que subir os juros para tentar reancorar as expectativas de inflação de mais longo prazo.

Se o investidor começar a acompanhar tudo isso, ele vai enlouquecer. É por isso que ele deveria alocar nas três estratégias olhando para os prazos de vencimento em conformidade com a sua necessidade.

Um dado importante: historicamente, 120% do CDI é igual a IPCA + 6%, que é um Santo Graal aqui no Brasil. Todo mundo gosta de aplicar em títulos IPCA+ quando a parte prefixada está acima de 6%, pois pela regressão à média, esse título fica na casa de 5%, 5,5%. O ponto é que o 6% virou 6,5% e pode virar 7%.

Em alguns casos, títulos de renda fixa podem variar como renda variável. Como um investidor pode tirar proveito desses movimentos?

Para que se possa auferir ganhos com títulos de renda fixa, é preciso alongar os seus prazos, em economês, os seus durations. É importante lembrar que se o investidor comprar um título mais longo, e a taxa for contrária a ele, como, por exemplo, o investidor que comprou um título IPCA + 5%, mas que agora está 6,5%, ele vai ter uma perda proporcional a esse prazo. Dessa forma, um investidor não deve especular com um dinheiro que, se der errado, vai ter que esperar até o vencimento para recebê-lo. Comprar um título IPCA+ com vencimento longo é o mesmo que comprar Bolsa. Inclusive, você pode reparar que quando a taxa de juros desse título cai, a Bolsa tem um rally de alta.

Como um investidor pode se preparar para pegar esses movimentos?

Primeiro ponto: um investidor não deve tentar bater o mercado, pois o mercado pode acabar passando por cima dele. Para mim, como assessor, é óbvio comprar um título IPCA + 6%, mas para um cliente isso não é, necessariamente, óbvio, pois ele nunca viu esse tipo de oscilação.

Todo mundo quer ganhar dinheiro quando se está no campo positivo, mas nem todo mundo está disposto a perder dinheiro quando se está no campo negativo. Se o investidor quiser especular em renda fixa, a primeira pergunta que ele tem que se fazer é se ele está disposto a ver sua carteira oscilando negativamente ao longo do período. Como as pessoas não estão acostumadas a isso, eu recomendo que, se o investidor quiser especular, que ele especule com pouco para entender esses ciclos.

Eu estou no mercado financeiro desde 2005 e lembro, claramente, quando tivemos um ciclo de corte de juros que foi de 2011 a 2012, quando a Selic foi de 12,5% para 7,25%. Nesse fechamento, como eu nunca tinha visto um movimento de queda de juros como investidor, eu não ganhei dinheiro, mas aprendi com ele para o próximo. Em 2016, eu apliquei em IPCA + 7,7% e peguei o fechamento inteiro da curva, pois eu já tinha visto e sabia como era a experiência.

Um cliente que já viveu essa experiência pode utilizá-la quando o Brasil voltar para os trilhos, e isso vai acontecer, mas para um cliente que nunca viveu isso, eu lhe digo para não colocar muito dinheiro. Ele não deve fazer um all-in, colocando todas as fichas. Ele pode aplicar, mas com aquele dinheiro que ele não precisa de imediato, como um dinheiro que ele pode esperar até a aposentadoria.

Um investidor pode aplicar em um título IPCA + 6,5%, 7%, 7% mais alguma coisa, mas que seja bem longo até a sua aposentadoria. Se der tudo certo, e os juros começarem a cair no Brasil, ele vai ver o título subindo 10%, 20%, 30%, 40%, 50% em renda fixa. Contudo, se alguma coisa der errado, os juros virarem 14%, 15%, 16%, 17%, e ele ver a sua carteira caindo 10%, 20%, 30%, 40%, 50%, ele não deve sacar os recursos. 

O meu conselho está relacionado à finanças comportamentais. Se o investidor nunca viveu, faça uma experiência pequena, pois o próximo ciclo não será o último. Eu já vivi três. Uma vez que o investidor entende esse ciclo, ele pode repeti-lo para o futuro. Esse é o meu conselho.

Considerando a conversa que tivemos, você gostaria de acrescentar algum ponto à sua entrevista?

Hoje, na minha visão, esses trades táticos sobre os quais conversamos são melhores de serem feitos através de ETFs de renda fixa do que através do Tesouro Direto. Esse é um assunto que vai começar a estar na pauta em algum momento.

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