O que fazer com a malha da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA)?

Mercado não é capaz de atender às necessidades do país Por José Augusto Valente e Carlos Santana

502
Foto aérea tirada em 31 de março de 2023 mostra uma grande ponte da ferrovia de alta velocidade Laixi-Rongcheng em Laixi, Província de Shandong, leste da China. (Xinhua/Zhu Zheng)

O Governo Federal está realizando audiências públicas para definir o futuro do contrato de concessão da FCA, um dos ativos da VLI, que se encerra em 2026. Uma das possibilidades é a renovação da concessão por mais 30 anos, com algumas contrapartidas ou obrigações de investimento da parte da concessionária, conforme demanda da sociedade.

Segundo o Ministério dos Transportes, o “gerenciamento de desejos” dos governos e empresas nos estados por onde passa a ferrovia é a grande questão do processo de renovação antecipada dessa malha ferroviária, a maior do país, com 7,2 mil quilômetros.

Atualmente, a gestão da malha é feita pela concessionária, que define o que fazer e o que rejeitar, sem grandes restrições a esse respeito, pois a agência reguladora entende que não é necessária a “mão forte do Estado”, uma vez que o mercado seria capaz de resolver todos os problemas. Porém, isso não ocorre, já que quem atende às demandas do transporte regional de passageiros, assim como às necessidades de desenvolvimento regional, a partir da logística ferroviária de cargas e de passageiros, é o setor público, por meio de políticas públicas.

Além disso, as atuais concessões da malha ferroviária nacional operam de acordo com o interesse de seus clientes e muito pouco com o interesse dos consumidores e das regiões. O caso da soja produzida no Mato Grosso é um exemplo claro disso. Grandes volumes de carga são destinados a portos distantes da região produtora, como Porto Velho (RO), Miritituba (PA), Santos (SP) e Paranaguá (PR), utilizando caminhões, em vez de trens, que seriam mais adequados e sustentáveis para essa logística, conforme a boa prática mundial.

Espaço Publicitáriocnseg

No caso da FCA, como consequência da “mão fraca do Estado”, foi possibilitado à concessionária o abandono de longos trechos ferroviários, por considerá-los antieconômicos para o seu negócio. A estimativa é que, da atual malha de 7,2 mil quilômetros da FCA, 30% sejam devolvidos à União.

A questão central é: como será a gestão dessa malha, para atender às necessidades dos usuários e das cidades ao longo dessa via, visando ao desenvolvimento social e econômico, local e regional? Como precificar e destinar essa estrutura para atender ao interesse público? A solução mais viável, para atender a todas as necessidades, pode ser simples e não exige reinventar a roda, pois ela já existe.

A Infra S/A é uma sociedade anônima de capital fechado, controlada pela União e vinculada ao Ministério dos Transportes. Por ter incorporado a Valec S/A, tem como principal objetivo fomentar a logística ferroviária do Brasil e possui as seguintes competências:

  • Administrar os programas de operação da infraestrutura ferroviária nas ferrovias a ela outorgadas;
  • Coordenar, executar, controlar, revisar, fiscalizar e administrar obras de infraestrutura ferroviária que lhe forem outorgadas;
  • Desenvolver estudos e projetos de obras de infraestrutura ferroviária;
  • Construir, operar e explorar estradas de ferro, sistemas acessórios de armazenagem, transferência e manuseio de produtos e bens a serem transportados e ainda instalações e sistemas de interligação de estradas de ferro com outras modalidades de transportes;
  • Promover o desenvolvimento dos sistemas de transporte de cargas sobre trilhos, objetivando seu aprimoramento e a absorção de novas tecnologias;
  • Celebrar contratos e convênios com órgãos nacionais da administração direta ou indireta, com empresas privadas e com órgãos internacionais para prestação de serviços técnicos especializados;
  • Exercer outras atividades inerentes às suas finalidades, conforme previsto em seu estatuto social.

Atualmente, a Infra S/A é gestora das seguintes ferrovias:

  • Ferrovia Norte–Sul (FNS)
  • Ferrovia de Integração Oeste–Leste (FIOL)
  • Ferrovia de Integração Centro-Oeste (FICO)

Por outro lado, a FCA definiu os trechos que considera lucrativos o suficiente para investimentos nos próximos 30 anos, focando na logística de cargas, pois não deseja operar transporte de passageiros nem de cargas pouco lucrativas. Isso é justo do ponto de vista da concessionária. No entanto, a sociedade organizada, nos estados que podem ser atendidos por essa malha, reivindica outros serviços.

Nossa proposta

A nosso ver, a melhor solução para otimizar necessidades e custos é a seguinte:

  • Toda a malha ferroviária, atualmente sob operação da FCA, seria assumida pela Infra S/A, que passaria a ser a única gestora da malha;
  • Os trechos desejados pela FCA para operar nos próximos 30 anos seriam subconcedidos a ela, que pagaria um montante necessário para revitalizar os trechos abandonados e em vias de devolução, garantindo um fluxo de caixa justo para todas as partes, especialmente para o poder público;
  • Os demais trechos seriam objeto de planejamento e encaminhamento de soluções pela Infra S/A, via PPP patrocinada ou mesmo licitação direta;
  • Os trechos para passageiros seriam delegados à Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), que seria retirada do PND, para cumprir essa missão adicional;
  • A Infra S/A implementaria um sistema em toda a malha hoje sob concessão da FCA, destinando um pequeno percentual das receitas das diversas cargas para garantir o subsídio do transporte de passageiros.

José Augusto Valente é membro da Divisão Técnica de Transporte e Logística do Clube de Engenharia. Foi secretário de Política Nacional de Transportes e presidente do DER-RJ.
Carlos Santana, ferroviário, advogado e professor, foi deputado federal pelo Estado do Rio de Janeiro entre 1991 e 2011.

Siga o canal \"Monitor Mercantil\" no WhatsApp:cnseg

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui