O retorno do Estado

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A crítica neoliberal e conservadora, com relação ao funcionamento da economia afirma sempre que o mercado aloca recursos para todos os usos de modo mais eficiente do que as instituições políticas. Assim sendo, o processo democrático é defeituoso e o Estado, uma fonte de ineficiência.
Como decorrência deste pensamento, transferências de renda e subsídios à produção são ineficazes. Por outro lado, os mercados deixam de funcionar de modo efetivo na presença de restrições, tais como externalidades e custos de transação, por exemplo.
Portanto, deve-se confiar ao mercado o dever de prover bens privados, enquanto o Estado deve prover bens públicos e corrigir disparidades entre as taxas privadas e sociais de retorno através de uma adequada tributação.
O neoliberal convicto afirma, sem pestanejar, que a alocação de recursos resultante do processo político democrático é inferior ao do mercado, por produzir desperdício de recursos. Além do mais, a intervenção governamental gera rendas de monopólio e desperdiça o excedente gerado pela sociedade.
A crise sistêmica do capitalismo auto-regulado deste início de século põe por terra muitos destes argumentos. O magnata das finanças é agora, ao mesmo tempo, herói e vilão deste mundo em crise.
O setor financeiro, que está sendo salvo com o dinheiro do contribuinte, é o motor da acumulação capitalista, ao propiciar o adiantamento de recursos para os novos empreendimentos, através do crédito de capital.
Para Keynes, não é uma dedução correta dos princípios da teoria econômica afirmar que o egoísmo – marca do mercado – leva sempre ao interesse público. Nem é verdadeiro que o auto-interesse é, em geral, esclarecido.
O “amor ao dinheiro” é o sentimento que move os indivíduos na economia mercantil-capitalista dos tempos atuais. Se por um lado esse sentimento é fator de progresso e mudança social, de outro seus efeitos negativos precisam ser neutralizados mediante ação política do Estado.
As decisões de gasto estão sempre subordinadas às expectativas dos capitalistas de abrir mão de liquidez, criando crédito e incorporando novos títulos de dívida à sua carteira de ativos.
Nos momentos em que o medo atropela o espírito de iniciativa, como nesta crise financeira geral, a demanda capitalista por riqueza pode se concentrar em ativos líquidos já existentes – como é o caso, no momento presente, da forte atração por títulos do governo norte-americano – inchando a circulação financeira e jogando para baixo os preços dos papéis negociados em bolsa, com prejuízo para o investimento, bem como para o emprego e a renda da comunidade mundial.
Na medida em que a lógica dos mercados por si só é incapaz superar a incerteza e a ignorância sobre o futuro, o investimento não deve ser deixado exclusivamente aos caprichos do ganho privado. O Estado tem que promover políticas fiscais ativas e expandir a demanda agregada.
Joseph Schumpeter nos mostrou que o capitalismo requer mudança constante, destruindo a velha estrutura econômica e criando uma nova, através do processo intitulado “destruição criativa”. Keynes, por seu lado, tratou do caráter instável do investimento privado, em função da incerteza quanto ao futuro que preocupa o espírito empreendedor do empresariado.
É exatamente a tensão não mensurável entre as expectativas a respeito da evolução dos rendimentos do novo capital produtivo e o sentimento de segurança proporcionado pelo dinheiro que vão determinar, em cada momento, o desempenho das economias de mercado. O destino da economia é, na verdade, decidido pelo lado mais íntimo do possuidor de riqueza entre as forças de criação de nova riqueza e o “amor pelo dinheiro”.

Ranulfo Vidigal
Economista, mestrando do programa de Políticas Públicas, Estratégias e Desenvolvimento do Instituto de Economia da UFRJ.

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