Embora o Brasil tenha grande disponibilidade hídrica, a distribuição de água não é igual em todo o território. De fato, nem todos os locais dispõem de recursos hídricos suficientes para os usos consuntivos, seja por uma grande demanda em face da concentração populacional, seja por eventos climáticos como a diminuição ou falta das águas das chuvas nos leitos dos rios, o que demanda uma infraestrutura hídrica adequada para seu aproveitamento e conservação.
O uso consuntivo se dá quando a água é consumida, parcial ou totalmente, não retornando ao corpo d’água de que foi retirada, como o abastecimento urbano e rural, o abastecimento animal e para indústria, termelétricas, irrigação, além da evaporação líquida de reservatórios artificiais.
Em meio ao cenário atual que compreende a água como um bem ambiental finito e dotado de valor econômico, e diante das recentes crises hídricas em mananciais de abastecimento como enfrentadas pelas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, a cultura de abundância hídrica vem cedendo a novas formas de gestão. Nesse ponto se coloca a questão do reúso da água.
A questão merece séria reflexão pois, a partir da década de 1970, houve forte decréscimo da população rural com o respectivo aumento da população urbana, o que exigiu uma mudança nos sistemas de abastecimento e no padrão de consumo das famílias. Também os usos agropecuários demandam grande quantidade de água, sendo que a irrigação no Brasil corresponde a quase 70% da vazão consumida, segundo dados da Agência Nacional de Águas (ANA), havendo, a cada ano, grande aumento das áreas irrigadas.
Nesse panorama de aumento da demanda dos usos da água, deve-se destacar a importância do reúso da água num sistema de gestão eficaz, tema abordado por especialistas da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes) durante seminário no final de novembro. A temática foi desenvolvida em diversos painéis acessíveis no YouTube. Foi ressaltada a demanda pelo reúso especialmente em áreas de escassez hídrica, a logística necessária e a eficácia, em tese, do programa de reúso como instrumento de gestão. Também, a importância do reúso mesmo em grandes regiões metropolitanas que vem sofrendo por escassez de água, muitas vezes resultante da pressão populacional aliada a baixa vazão dos rios e de sua capacidade para o despejo de efluentes. Foi ainda salientado que as exigências ambientais para as estações de tratamento estão cada vez mais restritivas, exigindo que as outorgas estejam integradas ao saneamento, o que significa que, em vez de gerar efluentes deve-se pensar em produzir água para reúso.
Especialistas da Abes explicaram que existem tecnologias para produção de água para reúso, com aplicabilidade na irrigação, nas indústrias, na lavagem de ruas e veículos públicos dentre outros, mas que as iniciativas em nível governamental dependem de um maior engajamento da população e dos gestores públicos. Dependem também de uma base legal aliada às peculiaridades locais, a uma economia circular, a projetos de cidades sustentáveis, ao uso racional da água e à educação ambiental.
De fato, cidades inteligentes necessitam de tecnologias sofisticadas voltadas para o futuro que ajudem a prevenir e ultrapassar períodos de escassez hídrica que já se anunciam com certa frequência no Brasil até em locais que detinham certa fartura há poucos anos atrás. Por isso é necessário não só atuar contra as causas que levam à escassez de água especialmente o seu uso inadequado, o desperdício, a poluição dos rios e mares com o despejo de esgoto e lixo in natura além dos dejetos agroindustriais. É necessária uma consciência coletiva voltada para o desenvolvimento sustentável que compreenda o abastecimento pleno e isonômico das cidades e campos, com o máximo reaproveitamento desse imprescindível recurso ambiental essencial à qualidade de vida de todos.
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