Nas primeiras semanas de intensificação dos efeitos da pandemia que assola o país, o Estado do Rio de Janeiro perdeu cerca de 100 mil vagas de empregos formais, segundo os dados do Caged. Os setores mais atingidos na economia fluminense são serviços domésticos, arte, cultura, esporte, recreação, hotelaria, alimentos/restaurantes, atividades imobiliárias e construção civil. Nesse contexto, a estratégica indústria de petróleo e gás amarga uma interrupção de sua produção na Bacia de Campos, e o segmento de transformação pode registrar um recuo acima de 4% este ano.
Não bastasse esse problema, a sociedade convive com fortes denúncias contra o poder público estadual e atuações do aparato policial gerando mortes de pessoas humildes nas comunidades populares devido ao chamado instituto da “guerra às drogas”.
O modelo de proibição, criminalização e repressão às drogas, surgiu nos EUA e foi exportado, quando não imposto, pela política externa ianque, se tornando o modelo hegemônico de política de drogas no mundo. Sob a justificativa de se proteger a saúde pública e individual contra os malefícios do uso de drogas, o proibicionismo levou ao que seus críticos denominam de “efeitos colaterais”, nos quais se destaca a violência do sistema penal, sobretudo pela violência policial e carcerária.
Tal violência, contudo, recai sobre a população de maneira seletiva, se entrelaçando de maneira interseccional com diferentes tipos de dominações sociais. A criminalização das drogas, exemplar da atuação do sistema penal, gere diferencialmente as ilegalidades, estruturalmente punindo uns enquanto imuniza outros.
Ao mesmo tempo em que contribui para o controle social repressivo sobre grupos subalternos nessas relações de poder, outros efeitos colaterais vinculam o proibicionismo a interesses de grupos poderosos, como os governos e elites sociais na periferia latino-americana empreendedores do tráfico no topo da hierarquia organizacional, grandes bancos que lavam o dinheiro do negócio no sistema financeiro, a indústria do controle do crime vinculada ao sistema penal, que se expande e se legitima com base na guerra às drogas entre outros atores.
Assim, ao contribuir simultaneamente para o controle social de grupos sociais subalternos enquanto beneficia materialmente elites sociais direta ou indiretamente envolvidas com o modelo proibicionista, a guerra às drogas desponta não por possuir uma paradoxal permanência a despeito de efeitos colaterais socialmente indesejados, mas sim por possuir uma eficácia invertida voltada para a dominação social.
Vivendo momentos de crise sanitária, política, financeira e social, a segunda unidade da federação brasileira precisa superar seus entraves e buscar um desenvolvimento equilibrado de suas forças produtivas ajustando as relações de poder à nova realidade que surgirá na pós-pandemia.
Ranulfo Vidigal
Economista.