Conversamos com Ilan Arbetman, analista de research da Ativa Investimentos, sobre os impactos da guerra comercial entre Estados Unidos e China no setor siderúrgico brasileiro.
Já é possível traçar um cenário das consequências da guerra comercial entre Estados Unidos e China no setor siderúrgico dos dois países?
Não há como precisar, mas a direção é negativa para os dois países. A China, já há algum tempo, está com um forte nível de produção siderúrgica, mas como o seu consumo doméstico segue fraco, grande parte da sua produção de aço é exportada. O problema é que como em um mundo de tarifas se comercializa menos, o país pode ter mais dificuldades para exportar o seu aço, o que pode dificultar ainda mais a sua meta de crescimento anual, que é de 5% para este ano, além de levar a uma diminuição da demanda por minério de ferro, o que seria muito ruim para o Brasil.
Com relação aos Estados Unidos, como o país importa cerca de 1/4 do aço que consome, seria muito difícil mudar a sua cadeia de produção de forma tão rápida. Assim, as novas tarifas de 25% sobre o aço vão criar uma inflação de custos no setor. Além disso, como o spread metálico, que é a diferença do preço do aço para o seu custo, seja ele sucata ou minério de ferro, tende a ser comprimido, isso vai criar uma dificuldade a mais para o setor, que, de alguma forma, vai ter que se ajustar aos preços mais caros dos insumos, o que pode impactar os times de trabalho e os investimentos. As tarifas estão criando empecilhos para a indústria siderúrgica do país, que está sendo levada para um nível pior do que o atual.
O setor brasileiro de siderurgia e, aproveitando a sua menção, o setor de mineração já estão sentindo os impactos da guerra comercial entre os dois países?
Por mais que ainda seja cedo para fazermos uma avaliação, já que isso começou no dia 2 de abril com o Liberation Day, nós podemos classificar esse tema como um dificultador de negócios para a frente. Nesse clima de incerteza, quem tinha que comprar, segura, o que faz com que os preços venham para baixo. Como o principal player que compra da Vale é a China, uma China mais fraca, que compre menos, é um risco. Por mais que não haja nada de concreto, nós temos que ficar de olho, pois há uma luz amarela.
Com relação às siderúrgicas nacionais, nós temos um problema relacionado à origem do aço que está sendo consumido no país. Nós não temos um problema de demanda, já que o consumo aparente de aço cresce. Não a taxas muito grandes, mas cresce. O grande problema é a imensa quantidade de aço chinês. Como em 2023 e 2024 nós tivemos um crescimento muito grande nas importações de aço, sobretudo em aços planos, o governo chegou a criar cotas para 11 produtos de aço plano, mas que não foram efetivas, tanto que membros do setor reclamaram que elas não haviam salvaguardado a indústria nacional como deviam.
Isso também explica o motivo pelo qual, nesse primeiro momento, o governo adotou um tom conciliatório, optando por esperar para não criar uma questão diplomática, diferentemente do que havia acontecido com a China. Isso porque, depois de muito tempo, e com um volume de importação muito grande de aço em 2023, o governo estipulou cotas em 2024, o que gerou um desgaste institucional com o país. Para evitar um novo desgaste, principalmente depois dessa experiência que não deu certo, já que o aço chinês continuou chegando, praticamente, do mesmo jeito, o governo preferiu esperar.
Na minha avaliação, o Governo Federal tem a expectativa de que os Estados Unidos fiquem mais flexíveis e criem cotas, da mesma forma como aconteceu no passado, quando o país colocou em vigor a seção 232, mas depois acabou fazendo concessões.
O que um investidor, que possui ações de siderúrgicas brasileiras, deve fazer nesse momento?
A Usiminas e a CSN têm sofrido muito com o aumento da importação de aço chinês, sobretudo de aços planos. A Gerdau também sofre, mas se protege um pouco mais por dois motivos. O primeiro é que mais de 1/3 do seu resultado é produzido em plantas na América do Norte, que, em alguns trimestres, possuem um backlog superior a dois meses. O segundo é que a companhia possui uma exposição maior a aços longos, que são menos complexos em termos de produção que o aço plano. É por isso que o aço plano chinês é mais competitivo, pois ele chega aqui mais barato que o seu custo de produção. Como no aço longo os preços são mais próximos, não há tanto incentivo para a importação em termos de preço, o que faz com que a Gerdau sofra menos. A Gerdau também produz aços planos, mas, em termos proporcionais, menos que a Usiminas e a CSN.
Como já estávamos acompanhando uma desaceleração nos spreads, as tarifas reforçam uma cautela que eu já tinha com o setor há bastante tempo. Particularmente, eu prefiro ver os desdobramentos de fora.
Considerando a conversa que tivemos, você gostaria de acrescentar algum ponto à sua entrevista?
Nós temos que ficar de olho no relativo quanto ao aço e ao alumínio. Por enquanto, as tarifas de cada um são de 25%, mas pode ser que haja uma flexibilização no futuro. No momento, eu não vejo isso, mas se exceções forem feitas, isso pode se tornar um risco ou uma oportunidade a depender do relativo.