Há poucos dias, o Carlos Azevedo, da MarketUp, e o Alfredo Soares, da VTEX, fizeram uma live (disponível em @marketupoficial, no Instagram) excelente sobre as mudanças que estão se impondo aos varejistas nesse “novo normal” trazido pela pandemia. Nunca a máxima americana “Retail, Detail” fez mais sentido. Só que hoje os detalhes cresceram muito, agora não se aplicam apenas ao Produto, Preço, Praça e Promoção. Uma excelente plataforma de comércio online é indispensável, e atrás dessa plataforma há um mundo de escolhas a serem detalhadas que vão definir o nível de êxito de um negócio.
O ponto é que mudaram as variáveis usadas para calcular o custo de aquisição e de manutenção de clientes. Uma pergunta interessante é se cabe aos pequenos e médios negócios investirem em branding ou se devem apenas cuidar de iniciativas de marketing direto.
Abrir um comércio não é mais sinônimo de abrir uma loja, muito pelo contrário. E aí se pode pensar que se não precisa de uma loja, não precisa pagar luvas, aluguel, financiar estoque, empregar vendedores, então ficou mais barato começar um negócio, certo?
Pode ser que sim, mas hoje para um negócio aparecer com suas ofertas nas pequenas telas dos celulares, que são o meio preferido de compra dos clientes online, já pode custar tão caro, mesmo se utilizando plataformas desenhadas para pequenos e médios negócios, que pode ser que a loja seja até mais barata. Depende do que se vende, para quem se vende, onde se vende e quanto se pode vender.
E há casos em que o correto é uma solução mista, quando se abre uma loja onde o cliente possa ter uma experiência de compra tradicional, possa tocar o produto, experimentá-lo, e na hora da compra ele, em vez de se dirigir ao caixa, faz a compra no celular e recebe o produto em casa. Evita-se estoque nas lojas, dinheiro vivo na caixa, simplificam-se os controles e a contabilidade.
As lojas Amazon Go são outra experiência que vale a pena conhecer. Nesses estabelecimentos o cliente quando entra na loja registra o seu celular em um leitor de códigos QR. A partir daí ele passeia livremente entre as gôndolas e coloca na sacola de compras o que quiser. Depois é ir para casa, não há nenhuma caixa, nenhum pagamento a ser feito, minutos após ele sair vai receber no celular um recibo descriminando todas as suas compras. O conceito é resumido em “Just Walk Out Groceries”. O ponto fraco é que por trás da operação existe uma sofisticadíssima plataforma tecnológica que não é acessível ao pequeno ou médio comerciante.
As tecnologias deixam óbvio que o sucesso do pequeno comerciante repousa hoje na sua capacidade de se integrar às grandes cadeias de venda. Há cada vez menos espaço para o lojista da esquina, o dono de uma só pequena loja que vive de atender a uma clientela que reside a menos de 500 metros do seu estabelecimento. Esse comerciante está perdido no novo ambiente de vendas, e com muita dificuldade de manter preços e serviço competitivos para atrair a clientela.
As novas dúvidas são muitas: o lojista deve criar o seu serviço de entregas, ou deve se associar ao Rappi, ao Uber? Se o lojista estabelecer o seu sistema de entregas, vai diminuir bastante o tamanho de sua área geográfica de vendas, sem falar que ele arrumou uma nova encrenca para administrar, qual seja um departamento de entregas que pode facilmente comprometer seus lucros.
Por outro lado, se o cliente pagar via WhatsApp, receber via Rappi, a marca da loja vai diminuir no contexto da compra, talvez difícil até de ser memorizada pelo comprador. Afinal, a experiência de compra, o serviço da venda, será dividido com marcas muito grandes tais como Rappi, Uber, Whats App, Pay Pal etc.
Dentro desse formato de negócios, o cliente vai escolher baseado no preço, na forma de pagamento e na eficiência na entrega. O comerciante só tem comando no terço que lhe cabe, os outros dois terços, os que estão mais próximos do cliente, são independentes e com marcas próprias. Ou seja, a pessoa encomenda um item, tudo sai certo e em poucas horas ela está em casa abrindo a embalagem. Essa experiência bem sucedida será atribuída não somente a loja, mas também ao meio de pagamento e à entrega rápida e segura.
Nesse ambiente multimarca, como sobressair a marca do lojista, para o cliente final principalmente se estamos falando de um comércio pequeno ou médio? A pergunta é se vale a pena tentar criar uma marca em um ambiente desses, ou se o mais inteligente é tentar lucrar o máximo possível com as vantagens logísticas oferecidas por um Rappi, um Uber, um Whats App, um PayPal.
Muitas vezes você compra na Amazon, mas o verdadeiro lojista é outro que utiliza a logística da Amazon para escoar seus estoques. Se você estiver desatento não vai perceber que não está comprando da Amazon. Há muita gente vendendo e lucrando nesse formato. O ponto aqui é que são maneiras novas, diferentes de se administrar um negócio. Maneiras que estão, graças à mudança de hábitos trazida pela pandemia, invadindo a rotina do pequeno e médio comerciante.
Não são apenas os pequenos e médios comerciantes que devem abrir o olho. O comércio eletrônico dá para os clientes uma série de conveniências que eram inacessíveis até agora. Isso afeta mesmo os grandes varejistas. Por exemplo, você prepara a sua lista de compras da semana e abre simultaneamente os sites de dois supermercados. Abre um no notebook e outro no celular. E vai comparando os preços e as promoções dos itens que você deseja e colocando os menores preços nos carrinhos correspondentes. Ao final da compra, você vai ter economizado mais dinheiro do que o preço dos dois fretes que você irá pagar. Essa pelo menos foi a minha experiência na semana passada.
Ah, ninguém tem paciência de fazer isso! Verdade, é chato e demora muito mais, mas pode muito bem valer a pena para quem compra para uma família e quer economizar. E o ponto aqui é que os supermercados vão ter de aprender a levar as suas estratégias de ponto de venda para os sites.
A pandemia antecipou diversas mudanças no modo em que vamos viver e consumir daqui para frente. No caso desse artigo estamos falando de marketing direto (o pequeno lojista) versus branding (as grandes marcas). Como sempre acontece nessas horas, quem saltar na frente na direção certa irá estabelecer uma vantagem muito grande sobre a sua concorrência. É hora de ler, se aculturar, se aperfeiçoar, sem preconceitos. Os vitoriosos serão os que se abrirem aos costumes dos novos tempos sabendo manter a prudência de sempre.
José Carlos Meira Mattos
Sócio diretor da Ketchum JCM Comunicação.