O “X” da questão

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Nos últimos cinco anos, o governo federal deixou de arrecadar R$ 2 bilhões em Imposto de Importação de seis montadoras que prometiam instalar fábricas no Brasil. Apelidado de regime automotivo, este sistema de incentivos fiscais tinha como principais metas ampliar as exportações e atingir em 2000 uma produção total de 2,5 milhões de veículos. Na prática, os resultados ficaram bem abaixo da expectativa. As exportações não decolaram e a produção sentiu um efeito gangorra, ficando em 1,5 milhão, em 1998; caindo para 1,3 milhão no ano seguinte; e devendo bater em apenas 1,7 milhão em 2000. A meta inicial, segundo estimativa da Anfavea, só deve ser alcançada em 2002. A balança comercial do setor registrava, até novembro de 2000, déficit de US$ 200 milhões, metade do valor que se esperava como superávit, em um desempenho pra lá de decepcionante.
Ainda há poucos dias, a estatal brasileira responsável pela pesquisa e extração de petróleo e derivados anunciou que investiria singelos R$ 50 milhões para trocar seu nome de Petrobras para Petrobrax. A justificativa seria a de facilitar a penetração da marca no mercado internacional, em tese avesso à sibilante pronúncia do sufixo que identifica a ligação da empresa a seu país de origem. Aliás, essa vinculação também foi apontada pelos teóricos do marketing contratados pela estatal como um fator negativo, pois alimentaria em nossos vizinhos uma postura “imperialista” (sic) por parte do Brasil.
Mas o debate em torno do sufixo ideal para nossa estatal do petróleo não é – perdoem o trocadilho – o “X” da questão. O que causa indignação é a agilidade e o empenho que setores do governo apresentam quando se trata de investir ou conceder incentivos fiscais para empresas estrangeiras. Não se trata de xenofobismo anacrônico ou defesa de subsídios para setores atrasados da indústria nacional, como houve no passado, mas de cobrar das autoridades um pouco mais de coerência na definição de políticas de curto e médio prazo.
O setor automobilístico é um ótimo exemplo dessa falta de unidade na condução de algumas políticas. Enquanto o regime automotivo vem permitindo a entrada subsidiada no país de autopeças, máquinas e matéria-prima para uso direto na produção de veículos, a indústria brasileira de autopeças aguarda ansiosamente a implantação de um há muito anunciado programa de nacionalização de peças e componentes.
Longe de simplesmente facilitar a vida das autopeças brasileiras – até porque, hoje 69% do capital dessas indústrias está nas mãos de multinacionais – este programa teria como maior mérito livrar as montadoras instaladas no país da grande instabilidade de preços desses insumos no mercado externo.
Atualmente, os carros nacionais têm, em média, 43% de componentes importados, índice quase duas vezes maior que o verificado há cinco anos.
A baixa cotação do euro justifica – até o momento – a manutenção de uma política importadora, mas uma valorização da moeda única européia é esperada para qualquer momento, o que jogaria por terra todo o planejamento e obrigaria as empresas a reverem estratégias de busca a fornecedores, sem falar nos problemas de ajustes a estes novos parceiros.
Investir sério em um projeto de nacionalização de peças e componentes automotivos pareceria o mais sensato a fazer, pensando-se em termos de planejamento de longo prazo e considerando o atual estágio de capacitação tecnológica das empresas brasileiras de autopeças. Entretanto, o que se observa, na prática, é uma despreocupação com o tema, que se reflete no tratamento desigual que mereceram algumas iniciativas.
Enquanto há vontade política e verbas para atrair empresas estrangeiras a todo custo, mesmo assumindo prejuízos fiscais, o governo cria uma linha de crédito no BNDES para nacionalização de componentes, mas que exige garantias de 167% sobre o valor do empréstimo, tornando a alternativa desinteressante e inviável para muitos.
Sem subsídios, reservas de mercado e outras aberrações do passado, é necessário, contudo, conferir às empresas nacionais algumas vantagens competitivas de suas concorrentes multinacionais, que, em seus países de origem, contam com linhas de crédito de longo prazo, com juros compatíveis, carga tributária menor e menos encargos e custos. Está na hora do governo prestar atenção ao seu próprio parque industrial e criar condições para a internacionalização dos produtos brasileiros, que vão muito além de jogadores de futebol, desfiles carnavalescos e belas modelos.

Flávio Marques Ferreira
Presidente da Indústria Marília Autopeças.

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