Recebi de colegas uma mensagem no YouTube do ministro Paulo Guedes tecendo comentários sobre o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações e sobre vacinas para Covid-19. Como a mensagem está eivada de informações incorretas, gostaria de comentá-las, até para esclarecê-lo, pois obviamente não conhece em profundidade o FNDCT.
Inicialmente, cabe esclarecer que no momento atual o FNDCT é praticamente a única fonte de recursos que o Governo Federal conta para apoiar a Ciência e Tecnologia em todas as áreas do conhecimento, já que o orçamento do MCTI é suficiente apenas para as despesas administrativas, salários etc. O mesmo acontece com o orçamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), praticamente restrito hoje à manutenção do programa de bolsas.
O ministro Paulo Guedes parece desconhecer que a partir deste ano o FNDCT é um fundo financeiro que não pode ser contingenciado. Graças à intensa mobilização da comunidade científica e empresarial, bem como o respaldo do Congresso Nacional, a Lei Complementar 177/2021 mudou as regras que regem esse fundo, que não pode mais ser contingenciado, cabendo exclusivamente ao seu Conselho Diretor estabelecer o destino dos recursos em consonância com a legislação em vigor de cada fundo setorial que compõe o FNDCT.
A previsão de recursos para 2021 é da ordem de R$7,4 bilhões. O ministro equivocadamente afirma que liberou R$ 2 bilhões. Ele não precisa liberar nada, pois como fundo financeiro os recursos são arrecadados diretamente pelo FNDCT em conta específica administrada pela empresa pública Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). A liberação a que se refere o ministro foi feita ao arrepio da Lei e mesmo assim destinada, equivocadamente, para operações de crédito pela Finep, com valores bem acima do que essa empresa pública precisa.
A demanda da comunidade científica é, sobretudo, pelos recursos não reembolsáveis, que são fundamentais para o apoio direto às instituições científicas e às empresas que contam com programas de inovação tecnológica. Caso o Ministério da Economia continue com essa prática, a comunidade terá que ir ao Poder Judiciário, inclusive em ações contra as pessoas físicas envolvidas com essa prática ilegal.
O ministro Paulo Guedes avança em críticas infundadas ao MCTI e a seu ministro, atitude ética incompatível com o respeito e consideração que se espera entre colegas do mesmo governo. Tece, ainda, comentários equivocados em relação ao importante projeto do MCTI de estimular o desenvolvimento em algumas instituições brasileiras de novas vacinas para Covid-19 com tecnologia própria.
Em nenhum momento se pensou que chegaremos rapidamente à produção de vacinas para a atual pandemia. Esta, obrigatoriamente, precisa ser enfrentada com as vacinas já existentes. No entanto, precisamos estar prontos para o enfrentamento de novas variantes do SARS-CoV-2 e de outros agentes biológicos que poderão surgir a qualquer momento.
Sugiro que o ministro Paulo Guedes abra um canal de comunicação com as sociedades científicas e se atualize em relação às tendências da Ciência contemporânea. É o que se espera de um ministro com formação acadêmica. Afinal, atravessamos um momento em que Ciência e Tecnologia são reconhecidas por todos como fundamental para alcançarmos um desenvolvimento econômico e social.
Wanderley de Souza é professor titular da UFRJ e membro da Academia Nacional de Medicina e da Academia Brasileira de Ciências.