Conversamos com Maílson da Nóbrega sobre os principais desafios econômicos do Brasil para 2025. Maílson é economista, sócio da Tendências Consultoria e foi ministro da Fazenda entre jan/1988 e mar/1990, durante a presidência de José Sarney.
Na sua avaliação, quais são os principais desafios econômicos para 2025?
O ano de 2025 será caracterizado por três desafios. O primeiro é a inflação, que, provavelmente, vai ultrapassar a meta mais uma vez. Hoje, a nossa projeção na Tendências é de 4,7%, 4,8%, mas o mercado já está falando em 5%, sendo que o limite superior da meta é 4,5%. Provavelmente, nós vamos ter uma nova carta do Gabriel Galípolo em jan/2026 explicando o motivo pelo qual o Banco Central não foi capaz de cumprir a meta de inflação em 2025.
O segundo é o fiscal, o maior problema do Brasil. Como o país já está em crise fiscal, a questão é saber se vamos ter um colapso decorrente dessa crise ou se vamos ser capazes de vencê-la. Para que essa crise possa ser vencida, o mais importante é reduzir a excessiva rigidez do gasto público, já que a União Federal gasta 96% de seus desembolsos em despesas obrigatórias. Isso não tem paralelo no mundo e significa que o governo dispõe de apenas 4% do seu orçamento primário para financiar as suas atividades, que consomem 2% do PIB, o Judiciário, as Forças Armadas, o mínimo de infraestrutura, a Ciência e Tecnologia, a Cultura, e assim por diante.
Não é preciso fazer um curso de economia e de matemática para saber que isso não vai dar certo, até porque esse mínimo de 4% está diminuindo, já que há um grupo de despesas que cresce acima da meta de 2,5% do Arcabouço Fiscal. Recentemente, o Tesouro Nacional calculou que em 2032, 100% do orçamento federal será composto por despesas obrigatórias.
A consequência da situação fiscal é o crescimento ininterrupto da relação dívida/PIB, que é o principal indicador de solvência do setor público. Hoje, o Brasil tem uma dívida pública da ordem de 78%, 79%, mas está caminhando para 85%, 86% no quarto ano do atual presidente. O Brasil está entre os países mais endividados quando é observada essa métrica, junto com o Egito, a Líbia e a Ucrânia, que está em guerra. A média dos países, com os quais nos comparamos, está em torno de 50%, 60%, ou seja, os governos de países emergentes dispõe de 50%, 40% dos seus orçamentos para definir suas prioridades, enquanto o Brasil dispõe de 4%.
O terceiro desafio é que nós vamos ter dólar alto o tempo todo por duas razões. Primeiro porque o Brasil pode caminhar para uma insolvência fiscal. Segundo porque fica claro que o atual governo, com exceção do ministro da Fazenda e da ministra do Planejamento, não tem nenhum compromisso com a questão fiscal. Eu acho engraçado que o presidente e o ministro da Casa Civil fiquem dizendo que possuem um compromisso inarredável com a responsabilidade fiscal, pois isso não existe na cabeça deles, já que eles são contra o corte de gastos e ações mais contundentes na política fiscal, além de serem a favor da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, o que é acima da renda média brasileira. Em resumo, esses são os três desafios que vão nos atormentar nos próximos dois anos.
O grande risco, como disse, é que em algum momento esse conjunto de desafios pode gerar um colapso da economia e uma grande crise financeira, mas ninguém pode dizer, com um mínimo de precisão, se isso vai acontecer e quando vai acontecer. Uma vez, o economista Rudiger Dornbusch, já falecido, estava fazendo uma apresentação sobre uma crise, quando lhe perguntaram quando essa crise chegaria. Ele respondeu que ela demoraria mais do que se imaginava, mas que depois ela seria muito mais rápida do que se pensava.
Para que essa crise não aconteça, e é possível evitá-la, seria preciso adiar algumas medidas. Primeiro, seria preciso que o Governo Lula desistisse da isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil, mas a chance disso acontecer é zero, pois isso faz parte da campanha presidencial de 2026, já que abrange 30 milhões de brasileiros que o presidente espera que votem nele. Essa medida tem pouco a ver com justiça fiscal, mas muito a ver com a eleição.
Segundo, seria preciso que o governo apresentasse uma proposta de emenda à Constituição que desvinculasse o salário mínimo das pensões e aposentadorias, já que o Brasil é, provavelmente, o único país do mundo em que aposentados e pensionistas têm ganhos reais de rendimentos, quando, normalmente, isso é para quem trabalha. O que os governos fazem é proteger as pensões e aposentadorias da inflação, fazendo com que elas sejam reajustadas pela inflação passada, mas não com ganhos reais, o que amplia o problema fiscal, pois a previdência vai avançando como o principal gasto do país, já que ela corresponde a mais da metade do orçamento primário do governo federal, o que não possui paralelo no mundo.
Terceiro, seria preciso que o governo apresentasse uma proposta de emenda à Constituição que desvinculasse o gasto de educação com a arrecadação de impostos. Isso também não tem em nenhum lugar do mundo. A corporação da educação, sobretudo sindicatos e professores mais atuantes, convenceram a sociedade de que se melhora a educação quando se gasta mais, o que não é verdade. Em termos proporcionais, o Brasil gasta em educação uma vez e meia o que gasta a China, que está na vanguarda da tecnologia em vários campos, como 5G e reconhecimento facial, além de já ter mandado um foguete para o lado oculto da Lua. Em quarto, seria preciso fazer a mesma coisa com a saúde.
Desde que os orçamentos surgiram na Mesopotâmia e no Egito antigo, e se consolidaram após a Revolução Gloriosa de 1688, eles são definidos anualmente. Ao contrário do que pensam os deputados e senadores brasileiros, a principal função do parlamento não é mandar dinheiro para os municípios, mas elaborar e aprovar o orçamento que define as prioridades do país.
O problema é que a chance dessas medidas serem propostas pelo Governo Lula é zero. Por exemplo, recentemente, o deputado federal Rui Falcão disse que cortar gasto é contra o ideário do PT, o que é verdade, pois o partido acha que o que impulsiona uma economia é o gasto. Segundo a ex-presidente Dilma Rousseff, gasto é vida.
Desde 1776, quando Adam Smith publicou o seu fantástico livro A Riqueza das Nações, marco fundador das economias modernas, já se sabe que o que impulsiona uma economia é a produtividade, e não o gasto. O problema é que no Brasil a produtividade está estagnada.
A inflação está alta ou a meta de inflação é que está baixa?
A inflação está alta. Eu sou amplamente favorável à meta de 3%, até porque essa meta é o padrão em todos os países com os quais nos comparamos. Ninguém tem meta de inflação de 4,5%, 5%, e sim de 3%, sendo que no Peru é 2%. Claro, aqui é mais difícil de cumpri-la por causa do grave problema fiscal, que turva o ambiente e as perspectivas, além da grande indexação de preços e salários à inflação passada.
Contudo, o Brasil tem que insistir nisso, até porque se o Conselho Monetário Nacional, orientado pelo presidente Lula, alterasse a meta de inflação para 5%, de forma a que o país tivesse uma taxa de juros mais baixa e pudesse crescer mais, a inflação pularia para 5% de forma imediata, já que as expectativas se adaptam. Como ninguém é bobo, se a meta de inflação passa para 5%, e eu estou reajustando o meu preço em 3%, eu passo a reajustá-lo em 5%.
Uma inflação mais alta significa menor capacidade de crescimento, já que a inflação corroi a renda, particularmente a renda dos trabalhadores com menores salários. É por isso que seria um erro mudar a meta de inflação de 3% para um número maior.
Qual a sua avaliação sobre a gestão das contas públicas?
Existe uma marcha da insensatez nas contas públicas, que começou com a Constituição de 1988. Na época da sua elaboração, a Constituinte tinha dois grandes objetivos: acabar com a desigualdade e impedir um novo golpe de estado. A título de comparação, o maior feito social da história da humanidade foi realizado pela China, que, em uma geração, tirou 800 milhões de pessoas da pobreza crescendo muito rapidamente. Aqui, os constituintes de 1988 achavam que isso poderia ser feito com o país gastando mais, com mais dinheiro para os aposentados, funcionários públicos e programas sociais. Nada contra esses gastos, mas na época ninguém perguntou se o Brasil estava na idade de gastar tanto. Para que você tenha uma ideia, recentemente, o Raul Velloso, que é um dos melhores especialistas em finanças públicas no Brasil, publicou um texto mostrando que os gastos sociais do governo federal equivalem a 80% do orçamento. Isso também não tem paralelo no planeta.
Novamente, eu sou inteiramente a favor dos gastos sociais, desde que se faça contas. O problema é que isso nunca é feito. Por exemplo, quando o presidente Lula disse que ia isentar do Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil, qual foi o estudo que embasou essa decisão? Nenhum. Ele tirou isso da cabeça, da mesma forma como se formulam as políticas públicas sociais no Brasil, já que poucas delas passam pelo crivo de um estudo. Quando o governo criou o Bolsa Permanência, fizeram um cálculo sobre quanto o programa ia custar? Provavelmente, não.
Essa cultura, que permeou a Constituição de 1988, está vivíssima no Brasil. Muitas pessoas, que não estão bem informadas sobre as questões fiscais que são cruciais para a estabilidade macroeconômica e para a capacidade do país voltar a crescer, acham que o gasto público resolve, até porque nós estamos celebrando a mediocridade no Brasil.
Por exemplo, o Brasil está crescendo 2%, 3%. Quando se compara com o crescimento da França e da Alemanha, esse crescimento parece robusto, mas como o Brasil é um país relativamente pobre, ele tem que crescer mais do que isso. Se o Brasil pretende se tornar um país rico, a sua economia tem que crescer a um ritmo maior que as economias ricas. Para que você tenha uma ideia, nos últimos 10 anos, o PIB dos Estados Unidos cresceu 23,8%, enquanto o PIB brasileiro cresceu 8,3%.
Essa é uma percepção que ainda não está presente no nosso debate. Para que o Brasil possa crescer muito mais que 2%, 3%, o país precisa fazer novas reformas da Previdência, uma reforma administrativa e eliminar uma série de privilégios, que, geralmente, vão para os príncipes do serviço público. Por exemplo, recentemente eu li que os juízes do Mato Grosso estão ganhando, em média, R$ 200 mil líquidos por mês, oito vezes mais que um juiz do Supremo.
Isso precisa ser combatido, apesar de ser difícil. O governo propôs que os penduricalhos do Judiciário e do Ministério Público somente pudessem ser alterados por lei complementar, e não por decisões dos tribunais dos estados, justamente os que definem os penduricalhos. Os juízes se mobilizaram, foram a Brasília, e o relator fez uma mudança marota no seu relatório. Ao invés de lei complementar, ele colocou lei ordinária. Isso porque, enquanto a lei complementar tem natureza constitucional, sendo ela aplicada à União, aos estados e aos municípios, a lei ordinária somente se aplica à União. Isso fez com a proposta não se aplicasse aos tribunais estaduais, onde estão as maiores barbaridades e os maiores escândalos de remuneração. Com isso, a proposta não vai se aplicar aos juízes estaduais. Pelo contrário, vai até legitimar o conjunto de penduricalhos que eles têm.
O problema fiscal é um conjunto de visões equivocadas do papel do estado, privilégios e a ausência completa, ou quase completa, de avaliações na aprovação de programas do governo desde a Constituição de 1988.
Por que o Brasil precisa operar com juros tão altos, o que tem impacto direto no déficit nominal e na dívida pública?
Primeiro é importante dizer que todos nós somos contra os juros altos, o que é uma desgraça para o país, já que desestimula os investimentos e aumenta os custos para se consumir bens e serviços. O problema é que o Brasil é uma jabuticaba nesse campo. Antes que eu possa explicar, imagine um sistema hidráulico que tem dois canais para levar água para uma caixa d’água. Se um canal está entupido, a bomba tem que ter o dobro da potência para levar a água pelo outro canal. É mais ou menos isso o que acontece com a taxa de juros no Brasil.
Como quase metade do crédito não é afetado pelo aumento da taxa Selic, como os créditos para habilitação, produtores rurais, pequenos produtores e indústrias apoiadas pelo BNDES, ela tem que ter ser maior para encarecer o crédito e desencorajar o consumo e o investimento, e com isso criar as condições para conter o ciclo de alta da inflação.
Como nós estamos cheio de exceções nas regras de funcionamento da economia brasileira, no mercado financeiro e na área fiscal, tudo isso faz com que o Brasil tenha uma taxa de juros mais alta. Coroando tudo isso, existe um risco efetivo, e todo mundo sabe disso, dada a insustentabilidade fiscal, de que em algum momento, se não forem tomadas as medidas estruturais para devolver ao país a flexibilidade na gestão orçamentária, haja um colapso, com as pessoas se dando conta de que o governo não vai pagar a dívida. Como isso significa um risco, há um prêmio por isso. Dessa forma, além de só uma parte do crédito ser afetada pela taxa Selic, existe em cima disso um prêmio, que representa um custo adicional pelo risco de comprar títulos do Tesouro.
Por fim, a taxa de juros pode ser mais alta em um momento de aceleração inflacionária, o que faz com a taxa de juros suba aqui, nos Estados Unidos, no Reino Unido, no Japão, na Coreia do Sul, na Argentina, no Chile ou no México.
Nessa questão, como disse, o Brasil é uma jabuticaba, pois ele tem fatores que interferem no nível da taxa de juros que não estão presentes em outros países.
Não estava na hora de se discutir a segunda etapa do Plano Real? Por exemplo, as indexações ficaram, ninguém discute nada, e elas seguem fazendo estragos, fazendo com que a inflação do ano anterior alimente a inflação do ano seguinte.
Essa é uma herança que nenhum plano conseguiu eliminar, já que ela foi introduzida na cultura brasileira. As indexações começaram, com boas intenções, em 1964, quando o país estava com uma inflação perto de 100% ao ano. Dessa forma, o Governo Militar implementou uma série de ações através do PAEG (Programa de Ação Econômica do Governo), sendo que uma delas era uma regra através da qual ele emitiria títulos públicos, as Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional, ORTN, que seriam indexadas pela inflação passada. O mesmo foi feito para a caderneta de poupança e para a dívida que as pessoas tinham com a União. A ideia era que a correção monetária valesse só para isso.
Como o governo não conseguiu baixar a inflação para menos de 15%, e isso foi em 1973, ficou a necessidade de se proteger renda e contratos. Com isso, começou um processo no setor privado para se criar correção monetária nos contratos de um modo geral, como os contratos de aluguel. Isso foi se generalizando no país, até que em 1979, o Governo Figueiredo criou uma nova política salarial através da qual os salários seriam reajustados de acordo com a inflação dos últimos seis meses. A partir daí, se indexou de tudo. Até os produtos dos oligopólios e monopólios, que tinham seus preços controlados pelo governo, passaram a ter reajustes pela inflação passada. Isso fez com que a inflação se generalizasse no país e fosse introjetada na nossa cultura.
Um ponto importante é que não existe país sem indexação. Por exemplo, nos Estados Unidos, as aposentadorias são indexadas ao custo de vida, mas o que não há é a generalização. Isso você só resolve com o tempo, seja proibindo as indexações, seja adotando medidas consistentes de política macroeconômica para que o Brasil fique longos anos sem inflação acima de 3%. Por exemplo, quando o Alan Greenspan (presidente do Fed de ago/1987 a jan/1996) era questionado sobre qual era a meta de inflação do Fed, ele sempre respondia “a menor possível”. Uma vez, quando um jornalista lhe perguntou sobre o que era a menor inflação possível, ele não teve dúvida em responder que era a inflação que não entra no cálculo econômico.
Como disse, o Brasil precisa de anos e anos sem uma inflação acima de 3% para que essa cultura seja deixada para trás. Hoje, nós temos alguns resquícios de indexação, mas o grosso já desapareceu. Nós não temos mais empresas reajustando preços a cada 30, 60 dias, muito menos diariamente, e os salários são reajustados anualmente. Mesmo nos Estados Unidos, os salários são reajustados anualmente, mas o que não há é uma regra como no Brasil (data base). Em países com inflação mais baixa, os reajustes são negociados, mas eles não têm nada a ver com a inflação passada, e sim com a produtividade, sendo que essa negociação pode envolver a concessão de um benefício, e não um aumento.
Enquanto aqui se adora fixar regras, nos outros países as negociações não envolvem a participação do Estado.
Em termos estruturais, o que deveria ser priorizado para que o Brasil melhorasse o seu ambiente econômico?
Sem dúvida nenhuma, resolver o problema fiscal, devolvendo a flexibilidade da gestão orçamentária através do fim de qualquer vinculação de gastos e do salário mínimo a aposentadorias e pensões, além da implementação de medidas que produzam quedas permanentes de despesa, ainda que no longo prazo, como uma reforma administrativa.
Com relação aos cortes, eles tinham que ser permanentes. Por exemplo, se o ministério da Fazenda propusesse um novo ajuste fiscal, ele não seria muito diferente, em sua fragilidade, do atual. Isso porque não há margem para cortar, e quando se corta, isso tem caráter temporário, como a não realização de concursos, a não criação de carreiras e a não geração de promoções. Como esses ajustes fiscais não têm natureza permanente, eles não resolvem.
Por mais que já tenham se passado mais de 30 anos da sua experiência como ministro da Fazenda, na sua avaliação, quais são as dinâmicas negativas da economia brasileira que não mudam?
Os privilégios. O Brasil é um país de privilégios desde Portugal. Veja a Reforma Tributária. Como proposta, ela era a melhor reforma tributária do mundo. O que aconteceu? O Congresso entupiu a reforma de privilégios.
Uma característica do projeto da reforma tributária era a alíquota única. Como todo mundo ia pagar a mesma alíquota, os ricos disseram que a reforma estaria impondo um custo a diversos serviços, como educação, saúde, turismo e cultura, quando, na verdade, o custo era para eles, já que o imposto sobre consumo é pago pelo consumidor. Isso porque, basicamente, os serviços são consumidos pelas classes mais abastadas. Hoje, quem compra um bem, paga 18% de ICMS, e quem contrata um serviço paga 5% de ISS, ou seja, os serviços pagam menos de 30% da alíquota de ICMS. É por isso que era uma justiça tributária fazer com que os ricos pagassem uma proporção de imposto sobre o consumo igual a dos pobres, mas eles só vão pagar 60% da alíquota.
Os advogados, através da OAB, conseguiram uma coisa incrível. Eles só vão pagar 70% da alíquota base. Com isso, entraram de carona economistas, arquitetos, jornalistas, engenheiros, médicos, enfermeiros, enfim, todo mundo, mas enquanto isso, os pobres vão pagar 100% da alíquota.
Felizmente, o básico da Reforma, que vai ter impacto na produtividade, não foi afetado, ou seja, a alíquota única será a mesma em todo o território nacional, mesmo que seja 60%. Não vai ser o caos de hoje. Além disso, os investimentos vão ser isentos e os créditos acumulados das exportações vão ser devolvidos, no máximo, um mês depois. Isso vai ter um grande efeito na eficiência, na produtividade e no potencial de crescimento econômico, mas do ponto de vista da desigualdade, a Reforma Tributária consolidou o império do privilégio na sociedade brasileira.
Nós temos também a cultura dos benefícios para um certo grupo. Por exemplo, até hoje a indústria automobilística brasileira, que já tem mais de 70 anos, é tratada como uma indústria infantil, como se ainda estivesse no começo, sendo atendida por incentivos fiscais. Como o Brasil gasta de 5% a 6% do PIB com incentivos fiscais, nós estamos falando de R$ 500 bilhões a R$ 800 bilhões. Isso é um privilégio, já que no Brasil não existe a cultura de avaliação de programas. Isso porque quando um programa entra, ele não acaba mais, mesmo que não esteja dando certo. Veja o caso da Zona Franca de Manaus, cujo benefício está garantido até 2073.
Como o Congresso é inteiramente permeável a lobbys, tudo isso entrou na Reforma Tributária, manchando o seu lado social. Esses hábitos, essa cultura, não são diferentes hoje do que eram na minha época.