Os impactos e as mudanças na tabela do Imposto de Renda

Segundo Richard Domingos, se o governo tivesse corrigido todos os valores da tabela do Imposto de Renda, o impacto da reforma seria ainda mais positivo.

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A reforma do Imposto de Renda, proposta pelo governo do presidente Lula, tem gerado intensos debates sobre as mudanças na tributação dos brasileiros. O projeto de lei, enviado ao Congresso no dia 18 de março, busca ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda para até R$ 5 mil mensais, com a criação de uma isenção parcial entre R$ 5 mil e R$ 7 mil. Esta medida, que cumpre uma das promessas de campanha do presidente Lula, visa aliviar a carga tributária de muitos brasileiros, especialmente aqueles com rendimentos mais baixos.

De acordo com as estimativas, a medida representará uma perda fiscal de R$ 27 bilhões anuais. Embora esse valor seja menor que os R$ 32 bilhões anteriormente calculados, o impacto será significativo. A mudança, que isentará cerca de 32% dos trabalhadores, entrará em vigor em 2026, caso o Congresso aprove a proposta ainda neste ano. A expectativa é que a isenção beneficie milhões de brasileiros, promovendo um aumento na renda disponível das famílias.

No entanto, apesar do caráter positivo da reforma, é importante observar que a proposta não resolve todos os problemas históricos da tabela do Imposto de Renda. Segundo a minha análise, a proposta do governo traz alguns avanços, mas também ressalvas que precisam ser consideradas com atenção.


A compensação para a perda de arrecadação

A principal questão, que vai gerar discussões no Congresso, é a compensação dos R$ 27 bilhões de perda de arrecadação, uma vez que a isenção beneficiará uma parcela significativa da população. Para mitigar essa perda, o governo propôs a criação de uma tributação mínima para os mais ricos. Os contribuintes que ganham acima de R$ 1,2 milhão por ano vão pagar, ao menos, 10% de imposto, enquanto a faixa entre R$ 600 mil e R$ 1,2 milhão terá uma alíquota mínima que será progressiva até alcançar o patamar de 10%.

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A operacionalização dessa nova cobrança será detalhada em breve, mas o desenho preliminar prevê uma abordagem em três etapas: primeiro, o contribuinte calculará a sua renda global anual para definir a alíquota aplicável; segundo, será calculada a base de incidência do tributo, excluindo valores mobiliários isentos, como LCIs (Letras de Crédito Imobiliário) e LCAs (Letras de Crédito do Agronegócio); por fim, o imposto devido será ajustado de acordo com os valores já retidos ao longo do ano.

Além disso, uma das mudanças importantes será a tributação de lucros e dividendos, que passarão a ser tributados na fonte, mesmo no caso de pagamentos feitos ao exterior. A retenção será obrigatória para valores superiores a R$ 50 mil mensais por empresa.


As reservas em relação ao ajuste na tabela

Embora o aumento da faixa de isenção seja uma boa notícia para os contribuintes, é importante destacar que o ajuste proposto ainda é limitado em relação à correção das deduções. Em estudo realizado pela Confirp Contabilidade, a tabela progressiva do Imposto de Renda, entre 1996 e 2024, foi corrigida em 151,02%, enquanto a inflação medida pelo IPCA, no mesmo período, foi de 470,68%, sendo que essa diferença gerou uma defasagem de 127,34%.

Se a tabela tivesse sido corrigida pelos índices de inflação, o limite atual de isenção de R$ 2.259,20 seria de R$ 5.136,12, ou seja, mais que o dobro. Com isso, apenas pessoas com rendimentos tributados acima de R$ 77.041,84 estariam obrigadas a declarar Imposto de Renda, ao invés do limite atual de R$ 33.888,00.

Valores dedutíveis, como despesas com instrução e dependentes, também ficaram abaixo dos índices da inflação, o que prejudica o real impacto positivo da medida. Por exemplo, a dedução com despesas de instrução, que atualmente é de R$ 3.561,50, seria de R$ 9.701,56, e a dedução com dependentes, que é de R$ 2.275,08, seria de R$ 5.163,35, caso tivessem sido corrigidas pela inflação. Isso demonstra uma defasagem significativa que impacta, diretamente, a capacidade do sistema tributário de aliviar a carga tributária das famílias de baixa renda.


A falta de ajuste nas deduções

Apesar do aumento da faixa de isenção, o governo deixou de ajustar outros aspectos cruciais da tabela, como o limite anual de desconto simplificado e as deduções específicas. A falta de correção desses itens pode diminuir a eficácia da reforma, uma vez que a maioria dos contribuintes ainda dependerá das deduções para reduzir o valor do imposto a ser pago.

Assim, se o governo tivesse corrigido todos os valores pela inflação, o impacto da reforma seria ainda mais positivo, aliviando a carga tributária de um número maior de brasileiros.

Embora reconheça o esforço do governo em criar uma reforma que traga alívio para a população, é importante destacar que esta é uma medida paliativa, que não resolve os problemas estruturais do sistema de tributação. O aumento da faixa de isenção é um passo positivo, mas para que a reforma atinja seu pleno potencial, é necessário um ajuste mais profundo e abrangente, especialmente nas deduções e na tabela progressiva.

É essencial que o governo reavalie esses pontos e implemente ajustes adicionais para garantir que a reforma seja realmente eficaz e alcance todos os contribuintes de forma justa. A expectativa é que, após a aprovação do Congresso, novas medidas possam ser tomadas para melhorar ainda mais a tributação e garantir benefícios efetivos para os brasileiros.

A mudança na tabela do Imposto de Renda é um avanço, mas ainda há muito a ser feito para corrigir as distorções do sistema e promover um alívio real para a classe trabalhadora. É importante que os contribuintes se mantenham informados e busquem orientação especializada para que possam se adequar às novas regras e garantir que os seus direitos sejam respeitados.

Richard Domingos é diretor executivo da Confirp Consultoria Contábil (confirp.com), presidente da Associação Grupo Alliance (grupoalliance.com.br), especialista em gestão de empresas e contador com pós-graduação em Direito Tributário Empresarial.

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