Os noventões do embaixador Marcos de Azambuja

Homenagem aos 90 anos do embaixador Marcos de Azambuja, um dos mais brilhantes diplomatas brasileiros, referência em relações internacionais.

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embaixador Marcos de Azambuja
Imagem: Reprodução/FGV

Um dos mais habilidosos e extraordinários diplomatas brasileiros, Marcos de Azambuja completou, no último dia 9 de fevereiro, 90 anos de idade, sendo, na ocasião, celebrado pelos familiares e incontáveis amigos. Amanhã, será igualmente homenageado pelos acadêmicos da Academia Bernardina da qual é membro fundador, com um almoço. Conversar com o Embaixador Azambuja é por demais prazeroso. Dono de uma cultura invejável, bem-humorado e generoso nos atos e ações, é uma pessoa verdadeiramente inspiradora e queridíssima.

Azambuja foi embaixador do Brasil na França, 1997-2003, e na Argentina, 1992-1997, quando eu tive o prazer de conhecê-lo, na nossa embaixada na capital portenha. Atuou como Secretário-Geral do Itamaraty, 1990-1992, coordenou a Conferência Rio 92 e chefiou a Delegação do Brasil para Assuntos de Desarmamento e Direitos Humanos, em Genebra, 1989-1990. Autor de livros e artigos e ativo palestrante sobre temas relativos a relações internacionais nos campos do desarmamento, desenvolvimento sustentável, integração regional, direitos humanos, Antártica e política espacial, mesmo aposentado, continua assediado pelas emissoras de televisão, jornais e revistas nacionais e internacionais, para fazer comentários sobre a política mundial.

Trata-se de uma verdadeira enciclopédia. E muito me honra ter assento, ao seu lado, no Conselho de Notáveis da Confederação Nacional do Comércio, Bens, Serviços e Turismo, coordenado pelo igualmente ilustre jurista Bernardo Cabral. Conviver com o nobre Embaixador Azambuja é poder beber sempre da sua sabedoria, além de apreciar sua eloquência e eterna juventude.

Carioca, Marcos Castrioto de Azambuja é filho de Dario Cavalcanti de Azambuja e Dirce Castrioto de Azambuja, casado com Lilianne Azambuja e pai de dois filhos, Pedro e Rodrigo. Diplomata de carreira, ingressou no Instituto Rio Branco, em 1956, alcançando, em fevereiro de 1958, o posto inicial da carreira, terceiro secretário. No ano seguinte, até 1963, trabalhou na sede da Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque, onde participou da 15ª e 17ª, sessões da Assembleia Geral da instituição. Ainda neste organismo, foi representante no Comitê Científico sobre Efeitos de Radiações Atômicas, em 1961.

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Em setembro do mesmo ano foi promovido a segundo secretário, transferindo-se, em 1963, para o México, onde permaneceu por três anos e atuou, inclusive, como membro da Comissão Preparatória para Desnuclearização da América Latina, em 1965. Em junho do ano seguinte alcançou o posto de primeiro secretário e retornou ao Brasil. Foi, entre 1967 e 1969, assistente do Secretário-Geral para Organismos Internacionais e membro da 21ª e 22ª Assembleia Geral da ONU, 1966 e 1967. Lotado no Brasil, participou de diversas conferências e seminários, como a Conferência dos Países Militarmente Não-Nucleares, em Genebra, Suíça, e no Seminário da ONU sobre Direitos Humanos, em Nicósia, no Chipre.

Em 1969 foi transferido para Londres, onde trabalhou por três anos. Após este período, seguiu para Buenos Aires, onde permaneceu até 1973, alcançando aí, o posto de conselheiro. Nesta função, atuou, como delegado na Conferência Plenipotenciária Sul-Americana sobre Entorpecentes, em 1972. Entre 1974 e 1983, participou de várias conferências em instituições militares, como a Escola Superior de Guerra e em escolas superiores das três Forças Armadas, além da Escola Nacional de Informação

Foi observador na Conferência de Chanceleres dos Países Não-Alinhados, em Lima, Peru, e chefe da Conferência Regional Latino-Americana Preparatória de Habitat, na Conferência da ONU sobre Estabelecimentos Humanos, em Caracas, Venezuela, em 1975. No ano seguinte, foi membro da 32ª Seção da Comissão de Direitos Humanos, em Genebra, na Suíça, e observador na Conferência de Cúpula dos Países Não-Alinhados, em Colombo, Sri Lanka. Em abril de 1977 foi promovido a ministro de segunda classe, e, em abril do ano seguinte, a ministro de primeira classe.

No final da década de 1970, o governo do general João Batista Figueiredo desenvolvia uma política de maior aproximação do Brasil com os países do chamado Terceiro Mundo. Nesse contexto, em 1979, participou da I Reunião da Comissão Mista Brasil-Iraque, em Bagdá, da I Reunião da Comissão Mista Brasil-Arábia Saudita, em Jedá, e foi observador na Conferência da Cúpula dos Países Não-Alinhados, em Cuba. Em 1980, participou da I Reunião da Comissão Mista Brasil-República Popular da China e foi delegado da I Reunião da Comissão Mista Brasil-Nigéria, na capital deste último, Lagos.

Nessa mesma cidade, em 1981, foi membro da I Reunião da Comissão Mista de Coordenação Brasil-Nigéria. Participou, ainda, das atividades relacionadas ao 13º Aniversário da Revolução de 17 de julho, que ocorrera na capital do Iraque, Bagdá, e como chefe da III Reunião da Comissão Mista Brasil-Líbia, em Trípoli. Em 1982 foi delegado na III Reunião da Comissão Mista Permanente Brasil-Moçambique para a Cooperação Econômica, Técnica e Científica, em Maputo, capital desse último.

Em 1983, chefiou a II Reunião de Trabalho Brasil-Estados Unidos da América sobre Cooperação Espacial, em Washington, e a II Reunião Consultiva do Tratado da Antártica, em Camberra, Austrália. Chefe da representação brasileira para assuntos de desarmamento, com sede em Genebra, Suíça, entre 1987 e 1990, em 1992 foi nomeado embaixador em Buenos Aires, Argentina, sucedendo o Embaixador Francisco Thompson Flores. Ocupou o cargo até setembro de 1997, sendo substituído por Felipe de Seixas Correia. Assumiu em seguida a embaixada do Brasil na França em substituição a Carlos Alberto Leite Barbosa. 

Secretário da Comissão Nacional para Assuntos Antárticos, integrou também, dentre outras, a Comissão Interministerial para os Recursos do Mar, a Comissão Brasileira de Atividades Espaciais, o Conselho da Defesa dos Direitos da Pessoa Humana e o Conselho Federal de Entorpecentes. É, atualmente, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, do Conselho Editorial da Revista “Política Externa”, do Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio, da Academia Brasileira de Artes, da Fundação Roberto Marinho e de várias outras entidades acadêmicas e Conselheiro Emérito do Centro Brasileiro de Relações Internacionais.

Do alto da sua capacidade de pensar, o ilustre diplomata sempre repete que “lutar pela paz e se esforçar por construí-la é sempre uma coisa bem-vinda, é sempre bom.” Da mesma forma, diz que “seo Brasil não for possível, o mundo é impossível.”

Ele acredita que “se o Brasil não der certo, o mundo não vai dar certo. Sem nenhuma pretensão, mas o Brasil é um microcosmo. É uma síntese de raças, de cultura, de civilizações. Se nós não dermos certo, as condições para o mundo ficam prejudicadas.” É assim que o diplomata define o papel do Brasil no século em que se vive.

Em entrevistas, Azambuja tem repetido que “o Brasil tem de jogar dentro das suas possibilidades. Nem truculência, nem tonitruância, nem excesso de protagonismo, mas também nenhum excesso de modéstia. O Brasil ainda é uma grande potência regional com projeções mundiais” e complementa: “Um país não pode viver aquém do que ele é, mas não deve viver além do que ele pode”.

Azambuja considera que, apesar de o Brasil ser uma grande potência agropecuária e territorial, o desempenho da ciência e tecnologia é intermediário. “O Brasil é um país de difícil conceituação e tem uma capacidade de ser simultaneamente muitas coisas.”

Para o diplomata, a história mostra que o Brasil erra pouco, mas é retardatário e demora muito em acertar em suas decisões. Azambuja acredita que a Nação alcançará os desenvolvimentos econômico, social e político apenas com um somatório de ações. “Estou convencido que o Brasil vai se arrumar não por uma definição central de um governo, mas por acertos setoriais. Quero dizer, pouco a pouco o país começa a dar certo num município que resolve bem a educação, noutro que resolve melhor a saúde, noutro que resolve mais a produção de alimentos. Pela sua complexidade, o Brasil não é um país que possa ser governado de uma cidade.”

O diplomata diz que os executivos brasileiros são flexíveis e abertos, “porque tudo o que não somos é um país rígido. Aqui é permitido um dinamismo social indispensável para que pudéssemos entrar num ciclo virtuoso de uns anos para cá: primeiro acertamos a mão no processo político, com o restabelecimento da democracia no final dos anos 80, depois no processo macroeconômico, com o Real e a racionalização da economia. E agora com a política inteligente de inclusão social, que incorporou numa base de prosperidade e de riqueza real um segmento da sociedade que estava totalmente esquecido.”

As consequências do crescimento global acelerado são danosas ao meio ambiente, mas, apesar dessa constatação, Azambuja se mostra esperançoso: “hoje as pessoas querem qualidade de vida com sustentabilidade. Não sou pessimista. Acho a capacidade de criação humana mais veloz do que a de destruição dos recursos físicos. Nós vamos encontrar, pouco a pouco, maneiras de fazer mais e melhor causando menos danos ao planeta”.

Azambuja é um dos diplomatas mais qualificados do Brasil de todos os tempos, um experiente negociador para temas espinhosos, como desarmamento, integração regional e desenvolvimento sustentável, e conhecedor das boas práticas de governança corporativa. 

Muita saúde e paz, nobre amigo e embaixador Azambuja, e gratidão por todos os esforços e ações que sempre empreendeu e pautaram a sua carreira, desenvolvida com enorme brilho, dinamismo, dedicação, lucidez e, sobretudo, visão de futuro.

Parabéns!

Paulo Alonso, jornalista, é reitor da Universidade Santa Úrsula.

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