Discurso das finanças apátridas que não conseguem deixar o petróleo
“O brasileiro lá no estrangeiro
Mostrou o futebol como é que é
Ganhou a taça do mundo
Sambando com a bola no pé”.
(A Taça do Mundo É Nossa, Wagner Maugeri, Victor Dagô, Maugeri Sobrinho, Lauro Müller e José Maugeri Neto).
Jean Paul Terra Prates, carioca, 1968, esteve na sexta-feira, 3/2/2023, no Rio Grande do Norte, ao lado da governadora reeleita, Maria de Fátima Bezerra, potiguar, 1955, para anunciar que criará diretoria específica para “energias renováveis”, e esta será sediada naquele Estado. Obviamente foi atividade política e partidária, retribuição de Prates, que deve sua condição política de ex-senador à governadora.
É reinício de gestão petista, e Prates procura se imiscuir nela, com discursos e projetos que atendem ao partido, não ao País. Nada de novo nesta “Terra de Santa Cruz”, já declarando a dependência, não a autonomia.
O Brasil teve poucos, porém notáveis, intérpretes. E, ainda menos, políticos que lutaram pela soberania nacional. Apresentamos algumas considerações gerais sobre nossa Nação, para nos deter no caso da administração da energia.
Dois focos teve o neoliberalismo quando, advogando a causa das finanças apátridas, declarou guerra ao desenvolvimento e à humanidade nos anos 1920: a cultura e a energia. Vê-se a importância da administração da energia para qualquer nação, tenha ou não recursos próprios.
Dos intérpretes, citamos, inicialmente, o sergipano Manoel José Bomfim (1868–1932): “Na sociedade humana, todo progresso é expressão da direção que a leva” (O Brasil Nação Realidade da Soberania Brasileira, 1931).
O progresso pode levar à autonomia do País ou à sua sujeição a um poder colonizador. Daí a questão central da soberania para Manuel Bomfim. A respeito do “herói” da nossa independência, escreve Bomfim, “a vida privada de Pedro I era escandalosa, a administração péssima, e o jornalismo francamente sedicioso, faz a reserva essencial”, e adiante, “uma causa de que nunca se fez menção: que ele jamais soube ser brasileiro”.
E prossegue: “Curto de inteligência, falho de sentimento brasileiro, Pedro I não compreendeu a extensão dos feitos ligados ao ato que lhe fora ditado por José Bonifácio, e julgou poder voltar atrás do gesto do Ipiranga”. “Para ter ideia do quanto foi antinacional a política que levou o imperador a dissolver a Constituinte, basta ponderar em que o ministério seguinte ao dos Andradas, constituído por homens reconhecidamente bragantistas e chegados ao lusitanismo, como Nogueira da Gama e Carneiro de Campos, mesmo assim, esse não quis ter a responsabilidade do ato, e foi preciso que viesse um Vilela Barbosa”.
Manuel Jacinto Nogueira da Gama, marquês de Baependi, José Joaquim Carneiro de Campos, marquês de Caravelas, e Francisco Vilela Barbosa, marquês de Paranaguá, todos nascidos no Brasil, foram responsáveis pela manutenção dos interesses lusitanos no pós 7 de setembro, pelo exílio de José Bonifácio, pela prisão e perseguição dos nacionalistas, aliados dos irmãos Andrada: Xavier de Carvalho, Martiniano de Alencar, Estêvão Carneiro da Cunha entre outros.
Magnífico intérprete do Brasil, o mineiro Darcy Ribeiro (1922–1997) se autoanalisa: “Minha fala é a do cruzado que sou, sempre defendendo minhas causas ou expressando minha indignação. Seja a salvação dos índios. Seja a reforma agrária. Seja a ruindade de nossas elites. Seja o descalabro da educação brasileira. Seja a universidade necessária. Seja a malandrice neoliberal” (O Brasil como problema, 1995).
Mais de um século separam a formalidade da independência de sua realidade, ocorrida com a Revolução Civil e Militar de 1930. Porém, como se vê em nossa história, os poucos governos nacionalistas abrigam, para conseguirem governar, os inimigos da Nação em quadros públicos, ainda que com poderes limitados. Getúlio Vargas, o estadista brasileiro, teve o general alagoano Pedro Aurélio de Góis Monteiro (1889–1956), Ernesto Geisel teve o general gaúcho Golbery do Couto e Silva (1911–1987).
Se na década de 1960, as finanças apátridas investiram na área cultural, comportamental, a década de 1970 foi dedicada à energia. E o Brasil, nesta década, atingia um ápice de desenvolvimento, com os governos Médici e Geisel. E não se limitou ao “milagre brasileiro”, foi também período fértil na área tecnológica.
Exemplifiquemos com o setor que está hoje inteiramente em mãos estrangeiras e que já teve nosso País como dos poucos líderes mundiais: a informática. “A ideia de que o Brasil deveria fazer investimento estratégico para superar a dependência tecnológica disseminou-se e tornou-se predominante entre os profissionais de informática da década de 1970” (Ivan da Costa Marques, Minicomputadores brasileiros nos anos 1970: uma reserva de mercado democrática em meio ao autoritarismo, História, Ciências, Saúde – Manguinhos, RJ, maio-agosto 2003).
E, graças ao empenho acadêmico em universidades, estatais e privadas, ao empenho de órgãos e empresas públicas e privadas (Scopus, Edisa, Sid, Itautec etc.), o Brasil teve na década de 1980 os minicomputadores inteiramente fabricados no País, com hardware e software nacionais.
Costa Marques, em artigo no Institute of Electrical and Electronics Engineers – IEEE, “Brazil and its unenlightened despots: 1979/1980”, afirma: “A Política Nacional de Informática (PNI) implementada para a construção de indústria local de minicomputadores, vigente na década de 1970, foi, a que eu saiba, a primeira política industrial oficial a colocar em primeiro plano a questão da origem da tecnologia”.
No entanto, os inimigos da soberania nacional, presentes no governo Geisel, inventaram a infiltração comunista na Secretaria Especial de Informática – SEI (Decreto 84.067, de 2/10/1979) e, no governo Figueiredo, criam a Comissão Cotrim, que, com ações constrangedoras, intimidam profissionais, grampeiam telefones, implantam verdadeiro regime de terror que afasta da área os profissionais que o País preparara ao longo de mais de uma década.
Esta intimidação se espalha também pelas empresas privadas, desmobilizando a comunidade brasileira que competia tecnologicamente com as estrangeiras. Nas palavras de Ivan da Costa Marques, “nos anos 1980, o computador saiu de um mundo fechado de milhares de profissionais para um universo aberto de milhões de leigos diretamente interessados e envolvidos”.
Também na administração da energia, os anos 1970 foram fundamentais. Em 26 de abril de 1973 foi assinado o Tratado de Itaipu, instrumento legal para o aproveitamento do potencial hidráulico do Rio Paraná. Em maio de 1974 foi criada a empresa Itaipu Binacional, para construir e gerenciar a usina.
O petróleo era produzido quase inteiramente em terra e em quantidades muito inferiores à necessidade do desenvolvimento industrial brasileiro. Em 1974, graças ao saber e a ousadia do geólogo Carlos Walter Marinho Campos, é perfurado o poço 1-RJS-9A, em águas oceânicas, levando à descoberta do Campo de Garoupa e iniciando a reversão da dependência para a autossuficiência de petróleo no Brasil.
Na década de 1990, se dá a transformação do mundo ocidental; perseguida pelos capitais apátridas com a ideologia neoliberal, como sustentação teórica, e o decálogo Consenso de Washington (1989) como orientação política, no mundo da especulação, da concentração de renda e das farsas e falácias. Das peles, como dizia Darcy Ribeiro, das máscaras, como vários analistas contemporâneos.
O adeus ao desenvolvimento e à autonomia brasileiros
Com maior ou menor empenho e eficiência, todos os governos do Brasil, a partir da transição com general carioca João Baptista de Oliveira Figueiredo (1918–1999) até o recém-eleito pernambucano Luiz Inácio Lula da Silva (1945) nada fizeram para, efetivamente, dotar o País de condições autônomas e seguras de desenvolvimento e de cidadania para todo seu povo.
E por que? É razoável e indispensável questionar. Pela “ruindade” das elites? Pela “malandrice neoliberal”? Também, mas não apenas.
É por colocar na cabeça dos brasileiros um sentimento de incapacidade, de dependência, para o que não faltaram ideólogos, professores, governantes, com as exceções de José Bonifácio de Andrada e Silva, Getúlio Dornelles Vargas e Leonel de Moura Brizola, e de intérpretes como o mesmo José Bonifácio, Manoel Bomfim, Darcy Ribeiro. Muito poucos para um país de 500 anos e 215 milhões de pessoas.
Alguns tentaram, mas faltou-lhes competência ou apoio, outros naufragaram nas facilidades que os poderes coloniais sempre souberam dosar na compra das consciências e na chantagem com os mais capazes. Hoje nos vemos às vésperas de nova crise, que o poder das finanças vem provocando desde 1987, que levará o que restou do Brasil após o tsunami bolsonarista.
Concentremo-nos no presente e na administração da energia. O Brasil detém ainda a maior qualificação técnica e capacidade tecnológica nas duas mais relevantes fontes primárias: dos combustíveis fósseis e da energia das águas, a hidroeletricidade. Foram frutos das iniciativas de Vargas e da continuidade por militares formados, politica e administrativamente, em sua Era: Emilio Médici e Ernesto Geisel.
Somente a ignorância mastodôntica de um capitão de pijama é capaz de atribuir a Médici ou a Geisel qualquer laivo comunista. Mas como qualificá-los por fazer, em tudo, o oposto de seu período governamental? Embora os marxistas mais tenham obstado do que colaborado com a soberania brasileira, é dar-lhes a dimensão que nunca tiveram esta percepção tacanha de que o mal do Brasil vem da infiltração comunista. E, ainda mais, no século 21 que o país que coloca em seu partido único o nome comunista, o restringe com a qualificação do “modo chinês”. Isto é, tira-lhe o lema neoliberal da globalidade, “operários de todo mundo uni-vos”.
Esta é, na realidade, a grande diferença do mundo de hoje, que os governantes eleitos ocultam: são as condições nacionais que ditam as soluções e não as ideologias importadas.
A pesquisa por energia de origem agrícola é o projeto de futuro, com a finitude da origem fóssil, mas não é pela falácia das divulgadas questões climáticas nem ambientais. Mas o que foi fazer, no proselitismo político, o presidente Prates no Rio Grande do Norte?
Não se atribua a ignorância quem se apresenta com currículo de consultor na área de petróleo e energia, secretário de Estado de Energia, no Rio Grande do Norte, e “das 50 personalidades mais importantes do setor energético mundial, pelas duas principais revistas internacionais especializadas em energia – Recharge (europeia) e WindPower Monthly (americana). Também eleito um dos 25 mais influentes da indústria eólica mundial pela revista WindPower Monthly” (Wikipédia).
O senhor Prates continuará reproduzindo o discurso das finanças apátridas que não podem deixar o petróleo, que não existe efetivamente nos países de suas direções, mas no terceiro mundo, orientar as políticas energéticas mundiais. Há petróleo no Oriente Médio e norte da África, na Federação Russa e na América Latina (Venezuela, Brasil, México e Colômbia).
O que é apresentado como petróleo, nos Estados Unidos da América (EUA) e no Canadá, são folhelhos betuminosos de curta duração para produção e muito poluentes no processo de extração.
Chega de enganar o povo. Vamos educá-lo para que não seja vítima de ideologias e interesses antinacionais, à direita e à esquerda. Caso contrário, em quatro anos não haverá Petrobrás e continuaremos a não ter a Eletrobrás. Mas poderemos ser bons de samba e talvez voltemos a ser bons de bola.
Pedro Augusto Pinho é administrador aposentado. Este artigo reflete opinião pessoal.
O autor grafa Petrobras e Eletrobras com acento grave.