Por que as projeções do PIB estão sendo revistas para cima?

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Carlos Pedroso, Daniel Xavier, Luis Otavio Leal e Marco Caruso (foto divulgação)
Carlos Pedroso, Daniel Xavier, Luis Otavio Leal e Marco Caruso (foto divulgação)

Conversamos com quatro economistas sobre as razões pelas quais as projeções do PIB estão sendo revistas para cima. Se no final de 2021 o mercado projetava um crescimento de 0,36% do PIB para 2022, a última projeção divulgada é de um crescimento de 1,98%. Essas informações são dos boletins Focus divulgados pelo Banco Central.

Carlos Pedroso (foto divulgação MUFG Brasil)
Carlos Pedroso, economista-chefe do banco MUFG Brasil

Os indicadores mensais de atividade divulgados ao longo do primeiro semestre surpreenderam positivamente. Enquanto o setor industrial ainda enfrenta dificuldades com a falta de componentes e o crédito caro, o setor de serviços, que tem o maior peso no PIB, foi beneficiado no início do ano pelo aumento do salário mínimo, o pagamento do Auxílio Brasil e a melhoria da pandemia com a vacinação que permitiu aumentar a circulação das pessoas, inclusive com as empresas voltando ao trabalho presencial, mesmo que parcialmente. Além disso, o mercado de trabalho também mostrou números bons de recuperação, dando alguma sustentação à renda.

Porém, ao longo dos dois primeiros trimestres, a atividade começou a sentir os efeitos da inflação, corroendo o poder de compra da população, e o aumento dos juros promovido pelo BC que entrou no terreno restritivo no 3T21 e 4T21, e, devido ao impacto defasado sobre a atividade, somente agora começa a afetar mais negativamente a atividade. Isso vai provocar uma desaceleração no resultado do PIB, tanto que do crescimento de 1% no 1T22, projetamos crescimento de 0,5% no 2T22.

Os próximos trimestres serão mais desafiadores. De positivo temos o aumento do Auxílio Brasil para R$ 600, que deve sustentar um pouco a demanda e os números ainda positivos do mercado de trabalho. No entanto, o BC continuou subindo os juros, e o ambiente externo tornou-se mais negativo com a expectativa de desaceleração global. Assim, trabalhamos com crescimento de 0,3% no 3T22 e retração de 0,2% no 4T22.

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Contudo, o bom desempenho do 1T22 e 2T22 já garantiu um bom crescimento do PIB para o ano inteiro de 2022. Nossa projeção atual é de crescimento de 1,7%, mas com viés de alta. O PIB do 2T22 será divulgado no início de setembro e nesta oportunidade reveremos nossa projeção, que pelo cenário descrito hoje, pode ficar em torno de 2%.

Daniel Xavier (foto divulgação Banco ABC Brasil)
Daniel Xavier, gerente do departamento econômico do Banco ABC Brasil

Recentemente, diversos indicadores domésticos de atividade foram publicados aqui no Brasil e, em nossa avaliação, se mostraram compatíveis com um desempenho acima do esperado da economia no 1T22 – especialmente no segmento de serviços (PMS) – e um sólido carregamento estatístico (+2%) para o PIB anual.

Quanto aos dados de comércio (PMC), a despeito de terem surpreendido para menor em maio, o seu carry no 2T22 continuou positivo em +1,2% (vendas ampliadas). Além disso, a expansão tem se mostrado mais difusa entre as diferentes atividades que compõem o varejo. É um aspecto digno de nota, uma vez que também é observado nas atividades industriais (PIM-PF) e de serviços.

Assim, entendemos que a despeito de duas quedas consecutivas no “PIB mensal” (IBC-BR) em abril e maio, a tendência geral dos dados de atividade no 2T22 seguiu eminentemente positiva, indicando expansão da ordem de +0,7% do PIB total no trimestre – conforme medido nas Contas Nacionais (IBGE).

Além disso, projetamos preliminarmente alta de +0,5% na margem para o IBC-BR de junho – movimento compatível com diferentes dados antecedentes já divulgados. Essa perspectiva, em paralelo com os estímulos fiscais adicionais recém-promulgados, ratifica a nossa (nova) projeção de +2,2% para o crescimento do PIB em 2022. Isso explica também as maiores projeções do FOCUS para o PIB do ano.

Para 2023, por outro lado, espera-se que o aperto nas condições financeiras (locais e globais), bem como a perda de ímpeto da economia mundial contribuam para a desaceleração do PIB do Brasil para +0,6%.

Luis Otavio Leal (foto divulgação Banco Alfa)
Luis Otavio Leal, economista-chefe do Banco Alfa

Podemos dividir a resposta em duas partes, mas com ambas tendo um fator em comum: as medidas tomadas pelo governo. A primeira “leva” de revisões para o PIB de 2022 ocorreu quando saiu o PIB do 1T22 muito melhor do que o esperado (1% vs 0,50%), impulsionado pelo reajuste do Auxílio Brasil, do salário mínimo e da antecipação do 13º dos aposentados e pensionistas do INSS. Isso levou a dois movimentos de alta nas projeções para o PIB para o ano. A primeira, totalmente estatística, tem relação com o fato de que o carrego estatístico do 1T22 para o ano ser praticamente total, com essa diferença de 0,5 p.p. sendo repassada totalmente para as projeções de 2022.

O segundo motivo é que o mercado se deu conta de que as medidas do governo estavam efetivamente impulsionando o consumo. A recuperação da Pesquisa Mensal do Comércio (PMC) era uma outra evidência, de forma a que o 2T22 começou a ser revisado para cima devido a liberação dos R$ 1.000,00 do FGTS. Isso levou a um reforço do movimento vindo da surpresa do resultado do 1T22.

A segunda onda de revisões é mais recente e deverá continuar, sendo que o motivo é a PEC dos benefícios. Muito se fala sobre o impacto fiscal que ela terá, entretanto, mais relevante deverá ser o incremento no consumo que ela trará. Os valores ao redor de R$ 41 bilhões que sairão das contas do governo provavelmente se refletirão, quase que integralmente, em aumento no consumo. Isso deverá impulsionar o PIB do 3T22. Antes desta PEC, esperávamos uma queda de 0,10% neste período com relação ao 2T22, número que foi revisado para uma alta de 0,2% após a sua aprovação. Com isso, a nossa projeção para o ano passou de 1,8% para 2% e, certamente, esse valor pode ser considerado piso para as projeções.

Marco Caruso (foto divulgação Banco Original)
Marco Caruso, economista-chefe do Original

Resumidamente, as projeções sofreram revisões de alta pelo bom desempenho da atividade no 1T22, acima do esperado pelo mercado. Esse cenário pode ser explicado em grande parte pelo impulso fiscal do governo com objetivo de sustentar a economia no curto prazo, através de políticas de transferência de renda [liberação do FGTS, antecipação do 13º do INSS, Auxílio Brasil, corte de impostos – IPI, ICMS]; e continuidade da construção de obras públicas*.

Outro ponto de destaque é o mercado de trabalho. O bom desempenho inicial do varejo – apesar de já observarmos certa desaceleração nos resultados de maio e junho com o peso da Selic sobre crédito – e serviços impulsionaram a contratação de trabalhadores. A população ocupada cresceu tanto em vagas informais quanto formais (evidenciada também pelos dados do Caged), o que contribui para uma taxa de desemprego que recua de 9,8% para 9,3% em junho, chegando a patamares de 2015. Assim, a aceleração da população ocupada com a surpresa do avanço dos salários reais, ainda que marginalmente, contribui para uma massa salarial maior do que o esperado, o que poderia se traduzir em maior consumo.

Entretanto, a economia deve sentir os efeitos defasados da política monetária no segundo semestre, o que deve se intensificar até o 1T23, uma das razões de queda para projeções do PIB no ano que vem.

 

*Apesar da construção civil ainda transparecer desempenho positivo em função da construção privada de conjuntos residenciais e profissionais (efeitos defasados de uma Selic a 2% no início de 2021), um dos destaques para o setor no PIB do 1T22 foram as obras públicas.

Coordenação: Jorge Priori

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