Porque a nova dinâmica de reservas financeiras irá transformar o negócio de adquirentes e subadquirentes

Análise das implicações da nova regulamentação sobre recebíveis digitais para adquirentes e subadquirentes. Por Cesare Rollo Iacovone.

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Cesare Rollo Iacovone.

Os impactos da nova regulamentação referente ao registro de recebíveis de arranjos de pagamentos, chamado atualmente de “digitalização dos recebíveis”, já foram amplamente debatidos por quem acompanha o processo desde o seu início.

Algumas das expectativas presentes desde 2019, que pouco a pouco vêm se concretizando, são: (1) o achatamento dos spreads financeiros nas operações de antecipação de recebíveis de cartões, dado o novo contexto de uma livre concorrência de ofertas; (2) o custo regulatório e operacional crescente para os adquirentes e subadquirentes; e (3) a maior abundância de ofertas de crédito com garantias de recebíveis para usuários que realizam vendas com cartões, principalmente para as pequenas e médias empresas.

Uma das principais transformações da norma, que entra em vigor em abril de 2024, diz respeito à dinâmica das reservas financeiras. Essa mudança irá impactar diretamente na precificação do serviço de captura que, por sua vez, é chave para a competitividade da oferta de valor de adquirentes e subadquirentes.

Em resumo, o impacto de segunda ordem na precificação, trazido pelo reconhecimento da norma da dinâmica das reservas financeiras, é o protagonismo da gestão de riscos em duas atividades chave para o crescimento e a rentabilidade de adquirentes e subadquirentes: aquisição e retenção de usuários.

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Segundo o Art. 8º da Resolução BCB nº 264, que atualiza a Resolução nº 4734, “É facultado às instituições credenciadoras o bloqueio de valores referentes às transações por elas capturadas com o propósito de: I – constituição de reserva financeira para gerenciamento de risco de sua relação contratual com seus respectivos usuários finais recebedores”.

E ainda nos parágrafos § 2º, 3º e 4º:

  • “O bloqueio não poderá reduzir os valores financeiros de recebíveis constituídos já alocados para contratos de negociação de recebíveis de arranjo de pagamento;
  • É vedada a negociação, pela instituição credenciadora, dos valores bloqueados, incluindo a realização de antecipações pós-contratadas desses valores;
  • A reserva financeira deverá ser compatível com os riscos efetivamente incorridos nessa relação, devendo seus termos, condições e finalidades ser estabelecidos no contrato celebrado entre a instituição credenciadora e o usuário final recebedor.”

Adicionalmente, no Art. 13º da mesma resolução consta a obrigatoriedade de dar transparência dos valores brutos, dos descontos (incluindo das reservas financeiras) e subsequentemente dos valores líquidos das unidades de recebíveis. Ou seja, a transparência necessária a partir da atualização da norma de abril, fará com que as negociações considerem sempre não só o MDR, mas os valores de reservas financeiras.

Essas unidades de recebíveis que constituem a agenda livre para a negociação não poderão sofrer deduções depois de sofrer algum tipo de oneração. Sendo assim, a partir do momento em que uma unidade de recebível for negociada, o adquirente que capturou as transações que a constituem não poderá mais acessar seus valores. O impacto direto da norma é bastante claro: para proteger seu negócio dos riscos inerentes da adquirência, todos os players terão de prever qual o montante de reserva financeira que cada estabelecimento comercial deve ter, sem que essa margem o faça perder uma oportunidade para a concorrência.

As diferenças de controle de margens podem significar que o adquirente A pode ganhar os negócios não porque precificou melhor a transação, mas porque conseguiu precificar melhor os riscos desse relacionamento. Para os players que vão operar na modalidade agora tipificada de “Promessa de Cessão”, a consideração dessas reservas é ainda mais importante, dado que os prazos de avaliação são mais curtos (exemplo, no caso de antecipação automática com liquidação instantânea) e que os contratos anteriores ao credenciamento terão prioridade frente aos recebíveis constituídos, mesmo que eles estejam sujeitos aos bloqueios da promessa de cessão.

Em resumo, a gestão de riscos sempre foi importante no negócio de adquirência, principalmente de chargebacks, mas agora ela terá um papel de protagonismo na aquisição e na retenção de usuários. Nesse contexto, quais as alavancas possíveis para buscar a diferenciação?

Para a aquisição de novos usuários, o protagonismo da avaliação de riscos será baseada em (1) velocidade em definir as margens da reserva financeira, (2) acurácia do modelo, considerando que a busca é por minimizar o valor da reserva, enquanto garante a proteção dos riscos inerentes ao negócio, e (3) o aprimoramento contínuo, incluindo a consideração de margens de seus competidores para os mesmos ECs. No contexto da aquisição, será essencial a visão do “TPV global”, ou seja, a consideração do saldo de recebíveis capturados por outros adquirentes e as respectivas reservas atribuídas.

Para a retenção de usuários, o protagonismo da avaliação de riscos será baseada em (1) capacidade de recuperar dívidas de forma ágil e precisa (aluguel de maquininhas, chargebacks, etc.), (2) velocidade em acomodar menores reservas, após a construção de histórico, (3) redução dos prazos necessários para a retenção e (4) conciliação de valores de recebíveis para comprovação das margens atribuídas.

Mais do que uma oportunidade para antecipar saldos de recebíveis capturados por competidores (novas linhas de negócios), a digitalização de recebíveis irá impactar o core business dos adquirentes. Naturalmente, os players melhor preparados para o novo mercado serão aqueles que começarem a investir o mais cedo possível na iniciativa com a perspectiva de negócios, não somente do cumprimento das obrigações regulatórias.

Cesare Rollo Iacovone é fundador e CEO da Destrava Aí.

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