Há uma rachadura em tudo. É assim que a luz entra clareando nossa capacidade de compreender a realidade concreta. A pandemia atingiu duramente os trabalhadores pouco qualificados, tanto nos países ricos como nos países em desenvolvimento. Demissões em massa ocorreram no setor de serviços, especialmente em setores como turismo, varejo, lazer e hotelaria, serviços de recreação e de transporte.
Em dezembro, a OIT publicou um relatório mostrando como os aumentos salariais estão diminuindo significativamente. As pessoas mais afetadas são as mulheres, os jovens e os trabalhadores de menor remuneração: um em cada seis operários deixou de trabalhar em maio, e os que continuam trabalhando viram suas horas reduzidas em quase 23%.
Nesse contexto, vale lembrar que nenhum país quebra. Seu povo, sim, fica mais pobre, e mais explorado, Os ricos estão mais ricos. As multinacionais mais fortes, mas quebrar, nenhum país quebra.
A crise avança na terra da jabuticaba e do juro alto. Com um pequeno detalhe: o setor de finanças foi o único, entre os 200 maiores grupos econômicos do país, a registrar aumento no lucro líquido, de 27%, em 2019. Os demais setores: Comércio (-6,8%), Indústria (-7,8%) e Serviços (-34,8%) retroagiram significativamente. O ditame das finanças reforça a ideologia promotora da autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira, que negam direitos legítimos aos trabalhadores. O deus-mercado se torna o lugar da verdade.
Vidas perdidas, empregos perdidos e pequenas empresas fechadas devem ser nosso foco. O universal exclusivo entre nós é a mercadoria e não mais os direitos e a proteção do trabalho e da vida digna. Na chamada sociedade do contágio – um teatro do absurdo – ser otimista parece falta de educação e sinônimo de estar alheio ao sofrimento dos outros. Tem ainda o choque de preços, na forma de tarifas de água e esgoto mais caras, botijão de gás e alimentos de primeira necessidade.
As elites sempre fazem as transições por cima e o sistema de conciliação de classes não traz saída para a população pobre. Nesse quadro, nos restaria lutar por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e completamente livres. Com a proximidade da vacina as esperanças renascem, pois afinal é verão, e o sol brilha forte.
Ranulfo Vidigal é economista.
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