A privatização da Sabesp tem sido motivo de intensos debates sobre seus impactos na qualidade do serviço, nas tarifas e na saúde pública. Reconhecida por sua eficiência e lucratividade, a Sabesp sempre foi um modelo mundial no setor de saneamento básico. Contudo, sua transição para o setor privado gerou preocupações significativas sobre os reais benefícios dessa mudança para a população.
A privatização e suas consequências
Em 23 de julho de 2024, o Governo de São Paulo privatizou 32% das ações da Sabesp, arrecadando R$ 14,8 bilhões e reduzindo sua participação para 18%. A justificativa principal foi atrair investimentos privados para modernizar a infraestrutura e ampliar os serviços oferecidos. No entanto, a decisão de privatizar uma empresa que sempre foi eficiente, lucrativa e estratégica no saneamento básico levanta questionamentos sobre sua real necessidade.
Embora eu não seja contra a privatização de serviços públicos por princípio, acredito que o mais importante seja a qualidade do serviço prestado à população, independentemente de ser público ou privado. No caso específico da Sabesp, fui contra sua privatização porque se trata de uma empresa lucrativa e modelo no setor. Além disso, ela desempenha um papel essencial no cuidado com o saneamento básico, que é diretamente ligado à saúde pública e à prevenção de doenças.
Outro ponto de preocupação é que a Sabesp opera praticamente como um monopólio paulista. Sua privatização pode colocar em risco a universalização do acesso a comunidades vulneráveis, pois o setor privado, focado no lucro, pode priorizar áreas mais rentáveis.
Aumento de 600% nos salários dos dirigentes: quem vai pagar a conta?
Recentemente, foi anunciado um reajuste de 600% nos vencimentos dos dirigentes da Sabesp, elevando o teto da remuneração anual para R$ 65 milhões. Essa decisão levanta um questionamento essencial: de onde sairão os recursos para cobrir essa despesa milionária? Há duas alternativas principais:
Reajuste de tarifas – Se os custos forem repassados diretamente aos consumidores, o aumento no preço da água e do serviço de saneamento pode ser ainda maior do que o já registrado após a privatização. Isso tornaria a conta de água mais cara para os paulistas, onerando especialmente as famílias de baixa renda.
Redução de investimentos em saneamento – Outra possibilidade é que a empresa ajuste seus investimentos em infraestrutura, diminuindo o ritmo de expansão dos serviços e limitando melhorias em regiões periféricas e municípios menores. Isso poderia comprometer a universalização do acesso à água tratada e saneamento básico.
O aumento exorbitante da remuneração dos dirigentes contrasta com o discurso de eficiência e otimização do serviço pós-privatização. Enquanto os consumidores já enfrentam reajustes tarifários, a destinação de recursos para pagamento de altos salários gera preocupação sobre a real prioridade do novo modelo de gestão da Sabesp.
A epidemia de norovírus e a relação com o saneamento
No verão de 2025, o litoral paulista enfrentou um grave surto de norovírus, uma infecção viral altamente contagiosa que causa sintomas severos de gastroenterite, como diarreia, vômitos e febre. Estudos apontaram que a água pode ter sido um dos principais vetores da proliferação do vírus, especialmente em regiões onde o saneamento básico enfrenta desafios. A falta de investimentos adequados durante o período de transição para o modelo privatizado pode ter contribuído para a disseminação da doença, evidenciando como um saneamento básico robusto é essencial para prevenir crises de saúde pública.
Impactos na saúde pública e sobrecarga do sistema
A qualidade da água distribuída tem impacto direto na saúde pública. Quando falhas no saneamento ocorrem, aumenta-se a incidência de doenças relacionadas à água, como doenças gastrointestinais e outras enfermidades infecciosas. Essa situação leva a uma maior demanda pelos serviços públicos de saúde, que são custeados pelos impostos da população. Assim, mesmo após a privatização, o Estado continua arcando com os custos das crises sanitárias, enquanto os consumidores enfrentam o peso de tarifas mais altas.
As comunidades de baixa renda são as mais vulneráveis a esses impactos. A dificuldade de arcar com contas mais caras e a exposição a água de qualidade inadequada acabam forçando essas populações a buscar o sistema público de saúde com mais frequência, sobrecarregando postos e hospitais que já operam no limite de sua capacidade.
Reflexões sobre o futuro
A privatização da Sabesp é um marco que exige acompanhamento atento. Embora haja promessas de maior eficiência e modernização, preocupações legítimas permanecem sobre o impacto financeiro nas tarifas, a qualidade do serviço e a universalização do acesso ao saneamento. O surto de norovírus no litoral paulista serve como um alerta sobre a vulnerabilidade de serviços essenciais quando decisões econômicas se sobrepõem ao bem-estar coletivo.
Além disso, a recente decisão de aumentar a remuneração dos dirigentes reforça a necessidade de fiscalização rigorosa sobre como os recursos estão sendo empregados. Se os reajustes tarifários ou a redução de investimentos forem utilizados para custear esses altos salários, quem pagará a conta será, mais uma vez, a população.
A água é um direito fundamental e sua gestão deve priorizar o interesse público acima de qualquer objetivo econômico. O que está em jogo não é apenas um modelo de gestão, mas a garantia de que todos os cidadãos, independentemente de sua condição social, tenham acesso a um saneamento básico de qualidade e a tarifas justas.
Mario Covas Neto é advogado e vereador por dois mandatos na cidade de São Paulo.
Vocês escrevem isso como se todas as favelas e comunidades tivessem água e esgoto e que o setor privado fosse explodir tudo. Décadas de descaso, esgoto a céu aberto, falta de água pelo estado, poluição de rios e mares, veja o Guarujá. E agora é tudo culpa do setor privado? O que o governo fez para mudar os cenários?
Mario eu era criança adolescente ainda e naqueles tempos já corria livremente esgotos a céu aberto adentrando nas praias da nossa baixada…não estou espantado não….a nossa população é muito acomodada e não tem a mínima vontade de lutar por melhorias seja em qualquer segmento….abracos.
Não conheço os termos da privatização da Sabesp mas imagino que hajam regras bastante claras e obrigatórias no quesito expansão, implantação de novas redes e recolhimento de efluentes para ETEs com responsabilidade contratual. Não acredito que estas regras não tenham sido contempladas. De outra parte, acredito que SABESP privatizada vai envidar esforços em eliminar ao máximo as perdas de agua tratada que chega a ridículos 20% do total entregue aos usuários. Isto sim está fazendo parte dos custos. Também o roubo com ligações clandestinas tem que ser combatido com o rigor da lei. Assim, não vai ser necessário aumento de valor no metro cúbico consumido. Já existe na conta de agua um escalonamento de preços diferenciados para pequenos consumidores e isto por si só contempla a camada de menor renda já que consomem menos agua. Privatização é eficiência…. O Estado geralmente tem péssima gerencia e pior, usa politicamente estas empresas.
Privatização já! O Governo brasileiro não consegue fazer o básico que é saúde, educação e segurança e ainda quer cuidar da água? Deixa pra qualquer empresa decente fazer.