Aguardando sua votação final, a reforma do Código Civil pode transformar muitos dos aspectos das rotinas empresariais e, ao contrário do seu objetivo inicial, gerar ainda mais insegurança jurídica. As mudanças previstas para as sociedades limitadas, por exemplo, podem impactar quase um terço das organizações do país. Conforme o Mapa das Empresas, do Governo Federal, cerca de sete das 22 milhões de práticas empresariais são sociedades limitadas, representando três a cada 10 empresas do país.
“Estamos falando de um universo do segundo maior perfil de estruturação empresarial do país, atrás apenas dos Empresários Individuais, que somam 14,7 milhões”, ressalta o advogado especialista em Direito Tributário, Jorge Coutinho. “Entre elas, encontra-se a Sociedade Limitada Unipessoal (SLU), que se caracteriza pela existência de um sócio único no quadro social. Nessa modalidade, ao contrário dos empresários individuais, há a separação do patrimônio do sócio único daquele da sociedade limitada unipessoal, oferecendo maior proteção ao empresário frente aos riscos das atividades negociais”, explica.
O texto da reforma do Código Civil prevê que a SLU só possa ser composta por pessoas físicas, retirando esse direito de pessoas jurídicas. “Não me parece adequado estabelecer um instrumento multifuncional e destinado para fomento econômico, tão típico do direito privado, apenas às pessoas físicas. Até mesmo porque a SLU foi adotada por diversas pessoas jurídicas desde a Lei da Liberdade Econômica, de 2019, e o texto não prevê quais as consequências práticas da modificação, apenas prazo de dois anos para a adequação à nova legislação”, afirma Coutinho.
As Sociedades Limitadas Unipessoais foram adotadas por muitas pessoas jurídicas para diversos fins, como planejamento sucessório, constituição de holdings, entre outros propósitos. “Existiam diversas hipóteses para a adoção deste instrumento, que permitiu a estruturação de atividades por meio de uma sociedade regularmente constituída”, esclarece o especialista em Direito Tributário.
“Embora as SLUs tenham surgido, principalmente, para otimizar a operação dos pequenos e médios empreendedores, possibilitando que esses criassem uma sociedade sem que houvesse a necessidade de sócios, essa também se mostrou um instrumento relevante para criação de estruturas empresariais para pessoas jurídicas. A possível mudança com a reforma do Código Civil coloca em risco jurídico diversas dessas complexas organizações desenhadas nos últimos cinco anos”, diz o especialista.
Ressalta-se que, em dezembro de 2022, houve a extinção do tipo societário Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (Eireli), sendo que as existentes foram reenquadradas automaticamente pela Receita Federal como Sociedade Limitada Unipessoal (SLU). “Se não revista, a reforma poderá gerar uma grande insegurança jurídica no país”, complementa Jorge Coutinho.
Já pesquisa realizada pela MaisMei mostrou que apenas 17% dos gestores que optam por esse regime de tributação buscam serviços de profissionais de contabilidade. Os serviços mais demandados são a declaração de impostos (53,22%), seguido de emissão de nota fiscal (22,63%). Embora menos demandados, dicas de negócios (8,62%) e planejamento financeiro (5,71%) também aparecem como uma oportunidade de mercado para contadores e escritórios de contabilidade.
O levantamento analisou 5.640 microempreendedores cadastrados no aplicativo da empresa, que é destinado a auxiliar e realizar tarefas de gestão do MEI, para entender o perfil médio destes gestores.
Kályta Caetano, head de Contabilidade da MaisMei, avalia que o cenário pode ser positivo, dependendo do ponto de vista, mas que a baixa procura por profissionais que auxiliam na hora de organizar as finanças é preocupante.
“Sabemos que o regime de tributação do MEI foi pensado para ser mais acessível em termos de custos e tarefas burocráticas simplificadas. Considerando isso, podemos entender que a maioria dá conta de realizar essas tarefas por conta própria, porém é sempre mais prudente ter o auxílio de um profissional para avaliar aspectos como média mensal de faturamento, para não ultrapassar o teto anual (atualmente em R$ 81 mil); e regularização de contribuições em atraso” explica.
Dentro do recorte dos microempreendedores que recorrem aos serviços contábeis, 66% só o fazem quando necessitam.
De acordo com o mesmo levantamento, 23,49% dos microempreendedores individuais (MEI) do país, quase um quarto, não sabem que possuem benefícios previdenciários como auxílio por incapacidade temporária e até mesmo o direito à aposentadoria.