Nos falta organização política nacionalista e lideranças
Religião
A República Popular da China (RPCh) é sabidamente o país onde a maioria absoluta da população não professa qualquer religião (52,2%), e 21,9% declaram seguir as “religiões tradicionais”. Mircea Eliade, cientista romeno, dos mais renomados estudiosos das religiões, considera esta “religião tradicional” um sistema mitológico de fatos e figuras, a sustentar rituais, que congregam núcleos familiares e pequenos grupamentos, para conforto das angústias do nascer, viver e morrer (História das Crenças e das Ideias Religiosas, 1969).
Max Weber, alemão, pai da sociologia, célebre pelo estudo das éticas econômicas das religiões, considera o “tradicionalismo” a disposição de aceitar o cotidiano e crer que este se constitui em norma inviolável de conduta. Especificamente em relação à China, escreveu: “Inexistiam cidades, como Florença, que criassem uma moeda-padrão e indicassem ao Estado os rumos da política monetária” (Ética Econômica das Religiões Mundiais – Confucionismo e taoísmo, 1917).
A partir destas constatações e análises de grandes pensadores, cabe a pergunta: qual a importância do Vaticano para as definições políticas e econômicas da RPCh?
Uma doutora pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul considerou relevante para sua tese as relações do Vaticano com Pequim, que certamente é nenhum, para poder listar os 22 “bispos e sacerdotes na prisão, em isolamento, e condenados nos campos de trabalho”, em 2005 (Diplomacia e Religião, editado em 2008 pela Fundação Alexandre de Gusmão). João Paulo II e Bento XVI, mencionados e citados na Introdução de seu trabalho, afastaram muitos mais religiosos de suas paróquias e missões, quando não lhes retiraram privilégios sacramentais ou lhes impuseram “silêncio obsequioso”, porque adotavam a Teologia da Libertação.
Bélgica
O Reino da Bélgica é uma Monarquia Constitucional Federal Parlamentarista em 30.526 km² de solo europeu, com densidade populacional de 380 habitantes/km² (2021). O federalismo se explica facilmente por existirem duas etnias e grupos linguísticos: flamengos e valões, havendo ainda população de idioma alemão. Além do idioma e tradições, valões e flamengos tiveram desenvolvimento econômico desigual, o que motivou o fim do sistema unitário, a partir do final do século 20 e concluído há uma década.
A página “DadosMundiais.com” relativa à Bélgica informa que as fontes fósseis e as potencialmente renováveis se equivalem: 35% e 36%, respectivamente, na participação do suprimento belga de energia. O terço restante vem da nuclear e da hidrelétrica.
A energia eólica offshore teve crescimento acelerado na década passada; torres mais elevadas e materiais mais resistentes permitiram avançar na colocação de torres no mar do Norte, em direção às ilhas britânicas. Esta fonte respondeu por 44 dos 67 bilhões de kWh fornecidos.
No entanto há diversas incongruências nas estatísticas. Um quadro, apresentado pela mesma fonte coloca a participação de energias renováveis, em 2019, em pouco mais de 10%.
A Bélgica sempre aparece como país exitoso na substituição das fontes de energia tradicionais por menos poluentes. E aparenta que toda Europa está seguindo este caminho. O que esconde esta propaganda?
Petróleo – As reservas
Primeiramente, vamos usar fonte europeia, a BP Statistical Review of World Energy, edição do 70º aniversário, em 2021. Entre 2010 e 2019, as reservas de óleo cresceram extraordinariamente (237%) na América do Sul, transformando a Venezuela no país de maiores reservas mundiais. Mas não foi só isso. O pré-sal está subavaliado, pois suas reservas são dadas pelos geólogos como, no mínimo, cinco vezes maiores do que a BP Review assinala. Também os levantamentos geofísicos e as descobertas nas costas norte do subcontinente, da Venezuela às Guianas e na Margem Equatorial Brasileira, fazem esperar ser a América do Sul o Oriente Médio dos próximos anos.
Na África, se constata o crescimento de 36%, chegando em 2019 a 125 bilhões de barris. O Oriente Médio ainda registra a maior reserva, 836 bilhões de barris, com crescimento de 23%. A Comunidade de Estados Independentes (CEI), onde a Rússia é o principal país, também aumentou as reservas em 22%.
Enquanto isso, a Europa reduziu em um terço suas reservas, a América do Norte, sem as “tar sands”, também as têm menores, e as da Ásia e Pacífico são pequenas neste contexto mundial.
Petróleo – O consumo
Quanto à demanda por petróleo líquido, entre 2010 e 2019, houve acréscimo do consumo na América do Norte, de 23,634 para 24,852 milhões de barris por dia. A Europa se manteve na grandeza pouco superior aos 15 milhões/dia, havendo crescimentos mais significativos na Ásia e na África. O mundo aumentou o consumo de óleo em 13,5%, atingindo mais de 100 milhões de barris/dia.
Conclusão: há demanda por petróleo, e a fonte para atender está migrando das áreas sob controle euro-estadunidense para as rebeldes repúblicas sul-americanas e para os “satélites da Rússia”.
Assim se cria o pavor do fim do mundo pelo clima e se disfarça, ilude que a civilização, construída com petróleo barato, não pode, sem mudança tecnológica e novos hábitos de consumo, descartá-lo de uma hora para outra. E para manter a geopolítica dominadora euro-estadunidense.
A grande mudança
O Brasil precisa, com urgência, colocar em discussão a questão nacional como fundamental para compreender sua sociedade e promover sua adequação às novas condições de vida. O que vem a ser a questão nacional?
Há sempre, em cada momento histórico, um tipo de demanda que é tratada isoladamente; este é o raciocínio tradicional, que separa como independentes as unidades políticas, técnicas, psicológicas, sociais etc. Quando as une é sob um manto extraterreno, de pensamento místico, onde a posição do homem é subalterna.
Assim ocorreu o desenvolvimento até o século 20. Populações menores, recursos aparentemente suficientes, relações sociais mais íntimas e menos complexas, tecnologia mecânica e energia animal.
De repente ocorre uma explosão: o crescimento passa ser geométrico, a demanda explode, a energia precisa ser muito mais eficiente, surge o uso do petróleo, e a compreensão do todo passa a ser indispensável, não é suficiente juntar as partes pois o todo tem características próprias.
A chave do novo conhecimento é a mensagem, e esta passa a ter tratamento matemático. A Sociedade passa a ser vista como uma troca intensa e constante de mensagens; não basta entender seus conteúdos, é preciso que ela se movimente na forma correta. Simultânea à guerra que encerrou o passado, a denominada I Grande Guerra, ou Guerra Civil Europeia, surge uma nova sociedade industrial onde o trabalho, e não o capital, passa a comandar.
A velocidade das mudanças produz pouca reflexão e muita ação. As disfunções são inúmeras. O poder destronado não se conforma e se apropria das transformadoras tecnologias: a cibernética e a compreensão sistêmica.
A questão nacional é integradora, fruto da evolução, da cultura das novas relações. A cultura do todo, do conjunto que o homem não pode esquecer, contempla a compreensão do meio artificial, criado pelo homem no curso da sua vida de relações com o meio físico e o meio social.
Não é uma ordem transcendente, mas sociológica (Abraham Moles).
A contestação desta visão holística e das ações integradoras é a ênfase nas diferenças, na desagregação das demandas, no individualismo exacerbado. Se colocar a monetização da vida, dos sentimentos, de tudo, a este fracionamento ter-se-á o neoliberalismo; o poder que busca a hegemonia universal, a globalização.
Multipolaridade
Soberania política e independência econômica são conceitos que sempre devem estar juntos (Ernesto “Che” Guevara, 20/3/1960). Sem economia própria, se está infiltrado pelo capital estrangeiro, o País submete-se à tutela externa; se não houver força do povo para garantir a soberania das decisões, acabar-se-á despojado do que produziu, do fruto do trabalho nacional, para os colonialistas. E não é fácil desmentir a permanente propaganda dos meios de comunicação, que se articulam desde o exterior, para construir irrealidades e deturpar falas e ações nacionalistas.
Bandung (1955)
Em abril de 1955, na cidade de Bandung, na Indonésia, 29 países – 15 da Ásia, 8 do Oriente Médio e 6 da África – além de representantes dos movimentos de libertação nacional da Argélia e da Tunísia, se reuniram e estabeleceram dez pontos para a defesa contra o colonialismo e o imperialismo.
O mundo de então era dominado por duas potências: Estados Unidos da América (EUA) e União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) – o mundo bipolar.
Estas potências agiram prontamente contra a formação da terceira força com assassinatos de lideranças, patrocínio de golpes de estado e de movimentos oposicionistas aos governos nacionalistas. A emergência da corrente internacional para maior equilíbrio político feneceu.
Terceira Via (1980)
A divisão do mundo em capitalismo e socialismo não solucionava questões específicas dos países. O pós-guerra mostrou que havia questões nacionais, o mundo dispunha então de novas tecnologias e de sistemas de conhecimento mais adequados às diversidades físicas e sociais das nações. Surge como opção entre os dois sistemas a social-democracia. Porém, como critica com precisão o economista brasileiro José Luís Fiori, “o resultado foi uma geleia ideológica, com propostas extremamente vagas e imprecisas”.
Não foi mero acaso que esta geleia surgiu nas potências ocidentais. A Terceira Via uniu o líder trabalhista britânico Tony Blair e figuras como Bill Clinton (EUA), Lionel Jospin (França), Gerhard Schröder (Alemanha), Massimo D’Alema (Itália) entre outros. Como era desejo dos líderes da bipolaridade, naufragaram as questões nacionais.
Iniciativa Cinturão e Rota (2013)
A Rota da Seda teve início em 200 a.C. como rede de comércio entre a China, partes da África e da Europa, composta por rotas terrestres e marítimas. A Iniciativa Cinturão e Rota (BRI) começa em 2013, hoje compartilhada por 145 países, sendo 44 da África, 42 da Ásia, 29 da Europa, 20 da América Latina e Caribe e 10 da Oceania, além de 30 organizações plurinacionais. Lembrando que a Organização das Nações Unidas (ONU) congrega 193 estados-membros, pode-se concluir que a Iniciativa do Cinturão e Rota se transformou numa defesa da multipolaridade, sustentada pelo comércio, pela cooperação econômica e intercâmbios culturais, respeitando as autonomias de todos Estados Nacionais.
Brasil: questão nacional, multipolaridade e suas energias
Dos quase cinco séculos organizado como país, apenas 10% de sua existência, com muita boa vontade, o Brasil foi país soberano e independente. Sua situação em quase todo tempo foi de colônia, ora formal, subordinada a Portugal, ora informal subordinada a potências imperiais, Reino Unido e EUA, ora submetida a ideologia estrangeira, religiosa, ou como vivemos, desde a última década do século 20, colônia de capitais apátridas, neoliberal.
Porém nada nos falta. É verdade? Pois não precisamos fazer eco aos países sem petróleo, pois temos reservas que nos garantem por um século; não precisamos mendigar empréstimos, pois temos terra, povo e recursos tecnológicos para produzir tudo que necessitamos; temos recursos de água doce, somos, todo país, cortado por rios, que nos fornecem água, energia, saneamento básico e irrigação; temos temperaturas que possibilitam as diversas agriculturas; por que aceitar a colonização?
Porque não temos consciência de nossa grandeza, porque nos falta organização política nacionalista e lideranças que, verdadeiramente, não por slogans importados, coloquem o Brasil onde o Estadista Getúlio Vargas já o manteve, e os inimigos do Brasil Independente, por isso, o chamam de ditador.
Pedro Augusto Pinho é administrador aposentado, atual presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet).