Reforma tributária: alíquota cheia compromete universalização do saneamento

Para concessionárias, aumento terá como consequência elevação média de 18% nas tarifas do setor ou redução de investimentos estimada em 26%

223
Obras de saneamento básico (Foto: EBC)
Obras de saneamento básico (Foto: EBC)

Estudo da GO Associados para a Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon/Sindcon) e a Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe) mostra que equiparar o setor de saneamento à saúde teria impacto de no máximo 0,2 pontos percentuais no imposto único padrão da reforma tributária, o IBS/CBS. Dessa forma, a alíquota passaria, por exemplo, dos 26,5% atualmente estimados para 26,7%.

Após quatro anos de bons resultados, com investimentos que estão proporcionando o aumento no acesso à água e esgoto tratados, o setor de saneamento poderá ser penalizado caso sejam mantidas as diretrizes atuais da reforma tributária, em fase de votação da regulamentação no Congresso. A carga atual de 9,25% que incide sobre o setor poderá subir para 26,5%, valor estimado para a alíquota-padrão do novo IBS/CBS.

Segundo o estudo atualizado da GO Associados, esse aumento terá como consequência uma elevação média de 18% nas tarifas do setor ou uma redução de investimentos estimada em 26%.

“O setor tem dialogado há tempos para sensibilizar o Congresso sobre a necessidade de o saneamento ter um tratamento equivalente à saúde na reforma tributária. Ter esse brutal aumento de carga tributária nesse momento é um contrassenso, à medida que o país tem uma meta de universalização para cumprir até 2033, estabelecida por lei. O novo marco legal, aliás, está em vigor há apenas quatro anos. Os bons resultados em termos de ampliação do atendimento à população poderão ser comprometidos com essa nova tributação”, avalia a diretora-executiva da Abcon/Sindcon, Christianne Dias.

Espaço Publicitáriocnseg

Segundo ela, “o aumento substancial da carga tributária para o saneamento é também totalmente contrário ao princípio de neutralidade que pauta a reforma tributária. Estaremos na contramão da igualdade social que se persegue com a reforma.”

Hoje, em virtude de sua relevância social, o saneamento é contribuinte apenas do PIS/Cofins. Com a reforma, a alíquota do setor salta de 9,25% (PIS/Cofins) para alíquota estimada de 26,5% (IBS/ CBS).

A falta de saneamento é responsável por 330 mil internações ao ano. Estima-se que o Brasil teria uma economia de R$ 25 bilhões com a melhoria das condições de saúde da população até 2040, graças à universalização do saneamento.

Para cada US$ 1 investido em saneamento, a Organização Mundial da Saúde estima um retorno de quase seis vezes, considerando os menores custos de saúde, aumento da produtividade e menor número de mortes prematuras.

Hoje, cerca de 30 milhões de pessoas não possuem acesso à água potável encanada e 88 milhões de pessoas não possuem coleta de esgoto. Do total de esgoto gerado, apenas 52% é tratado.

A reforma tributária avançou na Câmara dos Deputados com a aprovação do texto-base do Projeto de Lei Complementar 68/24 por uma larga margem de votos, contabilizando 336 a favor e 142 contra. O projeto, que teve sua origem no Poder Executivo, passou por significativas modificações ao longo de mais de oito horas de intensos debates em Plenário.

Os parlamentares agora se concentram na votação dos destaques apresentados pelos partidos, buscando alterar o substitutivo elaborado pelo relator, deputado Reginaldo Lopes (PT-MG). O foco do projeto está na regulamentação detalhada do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto Seletivo (IS), que substituirão o PIS, a Cofins, o ICMS, o ISS e parcialmente o IPI.

O texto aprovado introduziu diversas modificações significativas: restituição integral da CBS sobre energia, água e gás para indivíduos de baixa renda; fixação de alíquota máxima de 0,25% para minerais, abaixo do limite de 1% estabelecido pela emenda constitucional; redução de 30% nos impostos para planos de saúde de animais domésticos; inserção das proteínas animais na cesta básica; medicamentos não incluídos na alíquota zero terão redução de 60% na alíquota geral; e turistas estrangeiros poderão reaver os tributos pagos sobre produtos adquiridos no Brasil e levados na bagagem.

Para o advogado especialista em Direito Tributário, Rafael Cruz, socio da Fonteles Advogados Associados, a reforma não tratou bem a tributação dos alimentos.

“Foram garantidas alíquotas reduzidas apenas na fase de venda para o consumidor final e não na fase de produção. Alimentos como arroz e feijão terão custo mais caro para ser produzido, chegando de forma mais cara ao consumidor, e isso, por si só, irá trazer aumento de preços e consequentemente da inflação.”, explica.

Isso porque, atualmente, o início da cadeia produtiva de alimentos conta com incentivos fiscais de tributos federais e estaduais. Com a extinção desses incentivos – que foram conferidos apenas à venda ao consumidor final – as empresas de beneficiamento terão um custo tributário maior para produzir, onerando o preço do produto que chega aos supermercados.

O especialista lembra ainda que o mesmo ocorre com relação aos remédios.

“A etapa de fabricação ficará mais cara, e a venda ao consumidor final não terá redução suficiente para fazer frente ao aumento do custo de produção. Lembramos que as listas previstas na Constituição e nas leis que regulam a reforma, preveem que a cada cinco anos, esses produtos serão revisados. Isso quer dizer que poderemos ter mudança de faixa. É uma questão que precisamos ver como a sociedade irá se comportar em relação ao consumo desses itens”.

Leia também:

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui