O Ministério da Fazenda publicou recentemente cinco novas portarias que estabelecem regras para o mercado de apostas de quota fixa no Brasil. As medidas incluem exigências para que os jogos sejam certificados e também criam mecanismos de monitoramento e fiscalização mais rigorosos. A regulamentação busca trazer mais segurança e transparência para o mercado, tornando as operações mais seguras tanto para operadores quanto para consumidores.
O setor das bets faturou cerca de R$ 12 bilhões em 2023, um aumento expressivo em relação aos R$ 7 bilhões de 2020. Esse crescimento está relacionado ao aumento da popularidade das apostas esportivas, especialmente impulsionado pelo avanço das plataformas online. Esse crescimento rápido chamou a atenção das autoridades, que decidiram reforçar as regras para garantir que as operações sejam feitas de maneira segura e dentro da lei, protegendo a todos os envolvidos.
Para a advogada Paula Martin, especialista em Direito Tributário e sócia do MBC Advogados, essas novas regras são um marco importante para o setor.
“As portarias trazem mais clareza sobre as responsabilidades dos operadores e garantem que as diretrizes do Ministério da Fazenda sejam seguidas. Isso cria um ambiente mais seguro”, afirma.
Entre as mudanças mais significativas, está a exigência de que todos os jogos online sigam os critérios da Portaria SPA/MF nº1.207/2024. Os operadores precisam garantir que os apostadores saibam exatamente as possibilidades de ganho antes de fazer uma aposta.
Além disso, a Portaria SPA/MF nº1.231/2024 exige que os operadores ofereçam ferramentas para limitar o tempo e o valor das apostas, ajudando a evitar transtornos de jogo e proteger a saúde mental dos apostadores.
“A preocupação com a saúde foi levada a sério nessas portarias. A criação de limites de tempo e recursos disponíveis para jogar ajuda a evitar o vício, permitindo uma experiência de aposta com contenção de danos”, explica a advogada.
As novas regras também reforçam a fiscalização do setor. A Portaria SPA/MF nº1.225/2024 define como o governo vai monitorar e garantir que as apostas sejam feitas de forma legal. Já a Portaria SPA/MF nº1.233/2024 detalha o processo de punição para empresas que não seguirem as novas regras, com a aplicação de multas e outras sanções dependendo da gravidade das infrações.
“Esse reforço na fiscalização é essencial para dar mais transparência ao mercado. Além disso, cria uma maior confiança entre os consumidores, que agora podem ter certeza de que estão apostando em um ambiente legal e seguro”, destaca Paula.
Por fim, a Portaria SPA/MF nº1.112/2024 estabelece regras claras para que o dinheiro arrecadado com as apostas seja repassado ao Tesouro Nacional. Os operadores são obrigados a seguir um procedimento específico para esses repasses, garantindo que tudo seja feito de maneira transparente. “Essas novas regras são essenciais para manter o equilíbrio financeiro do setor, além de garantir que as empresas sigam as leis fiscais”, pontua.
Com a implementação das novas portarias, o mercado de apostas de quota fixa no Brasil ganha uma regulamentação mais robusta, visando a trazer maior segurança tanto para os operadores quanto para os jogadores.
Essas portarias, além de estabelecer diretrizes claras para operadores, também visam a atender as demandas crescentes por mais proteção aos consumidores. Segundo especialistas, é importante que os operadores cumpram rigorosamente as novas regras para garantir que o mercado continue em crescimento. “A regulamentação é um passo importante, mas o cumprimento das regras por todos é fundamental para que o setor não só cresça, mas também se mantenha sustentável e seguro”, destaca a advogada.
As apostas esportivas se tornaram a nova febre brasileira. Hoje, segundo dados de mercado, praticamente um quarto da população aderiu às chamadas bets, e o crescimento é exponencial. Já a estimativa do Banco Central projeta que cerca de 24 milhões de pessoas físicas participaram de jogos de azar e apostas.
Para Jhonata Emerick, CEO da Datarisk e doutor em IA pela USP, sejam 20, 30, 50 milhões ou mais, o cenário existe e precisa ser encarado de frente: essa dinâmica tem comprometido a renda das famílias e vai ter consequências diretas na saúde das instituições financeiras. Para se ter uma ideia, o número de apostadores cresce mais rápido do que o número de pessoas contaminadas no pico da pandemia.
O Banco Central tem alertado sobre o impacto das apostas esportivas na economia. De acordo com o relatório da autoridade monetária, o valor médio mensal transferido para apostas chega a R$ 3 mil entre pessoas com mais de 20 anos, um dado preocupante considerando que a renda média do brasileiro é de apenas R$ 3.200, conforme levantamento recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
“Apesar de o Banco Central ainda indicar um cenário relativamente estável em termos de inadimplência e empréstimos problemáticos, um estudo da CNC revelou que, no primeiro semestre de 2024, 1,3 milhão de pessoas entraram em inadimplência devido ao jogo online. Esse comportamento reflete diretamente nas decisões de consumo: muitos apostadores estão priorizando as apostas em detrimento de compras essenciais, como acessórios, vestuário, lazer, alimentos (tanto em supermercados quanto fora de casa), internet, contas de serviços públicos, produtos de beleza itens de higiene e até medicamentos”, diz Jhonata.
A pesquisa “Bets e inadimplentes: A relação dos inadimplentes com apostas no Brasil”, conduzida pela Serasa em parceria com o instituto Opinion Box, revela que 46% dos inadimplentes já realizaram apostas pelo menos uma vez. Dentre eles, 44% apostaram com o objetivo de quitar dívidas. Além disso, 13% dos inadimplentes admitiram ter deixado de pagar contas para poder apostar.
“Estatísticas obtidas pela Datarisk durante o processo de criação de suas análises destacam a influência da convivência com apostadores no mesmo núcleo familiar. Quando uma pessoa possui um parente que aposta, a probabilidade de também adotar esse comportamento aumenta em cerca de 77%. Esse efeito é ainda mais pronunciado quando os pais são apostadores, elevando a probabilidade para aproximadamente 216%. Neste momento, para quem atua no sistema financeiro, torna-se imprescindível utilizar os insights gerados por dados e inteligência artificial (IA) para apoiar a tomada de decisão em todo o ciclo de crédito. A aplicação da IA busca mitigar possíveis dificuldades de pagamento, especialmente em situações como concessão de crédito ou vendas parceladas. Para ilustrar, algumas análises indicam que as apostas são mais comuns entre homens (70,8%), com idade média de 34 anos. Quase metade dos apostadores (47,8%) está na faixa etária de 25 a 40 anos. Além disso, o score revelou que 63,9% dos apostadores possuem vínculo empregatício em regime CLT, com uma média salarial de 4,7 salários-mínimos”, avalia o especialista.
Segundo Isaac Sidney, presidente da Febraban, caso o ritmo atual de desgaste do orçamento familiar devido às apostas permaneça, haverá um impacto abrangente na economia brasileira, prejudicando desde pequenos negócios até grandes corporações. Ele alertou que essa situação pode desencadear uma crescente onda de endividamento, excluindo milhões de brasileiros do mercado de crédito e acarretando sérias repercussões nas taxas de inadimplência, nos riscos financeiros e nos custos de crédito.