O Senado realizou ontem mais uma audiência sobre os impactos da reforma tributária (PLP 68/2024) nos setores de comércio e serviços. O segundo dia de debate na Comissão de Assuntos Econômicos reuniu o representante da Confederação Nacional de Serviços (CNS) e de outras instituições e entidades de classe.
O presidente da CNS, Luigi Nese, enfatizou a necessidade de desonerar a folha de pagamentos para o setor de serviços.
“O Senado precisa travar a regulamentação da reforma tributária enquanto o governo não apresentar a proposta de desoneração. Sem isso, o setor sofrerá um impacto violento”, afirmou. A Emenda Constitucional 132, aprovada em dezembro de 2023, estipulava o prazo de 90 dias para o envio, pelo governo, do Projeto de Lei que regulamenta a desoneração.
A proposta da CNS objetiva zerar a contribuição patronal para todas as empresas do país; reduzir a contribuição dos trabalhadores, que passaria a variar entre 4,5% e 11,0%, de acordo com a faixa salarial; zerar a contribuição ao Incra e o salário educação; bem como a aplicação de um tributo sobre depósitos à vista nos bancos, a contribuição previdenciária.
Nese reforçou, ainda, a importância do setor de serviços, responsável por aproximadamente 70% do PIB brasileiro (2021), expôs o déficit acumulado de mais de R$ 345,6 bilhões do Regime Geral da Previdência Social e citou as vantagens da desoneração da folha de pagamentos, a exemplo do fim da sonegação, o aumento de competitividade e exportações e o crescimento econômico.
Em solicitação ao senador Izalci Lucas (PL-DF), que presidiu a audiência, enfatizou a importância de cobrar ao Executivo informações confiáveis sobre a alíquota prevista na reforma tributária, estimada, até o momento, em 26,5%.
Entre as várias idas e vindas que a discussão sobre a reforma tributária navegou nas últimas décadas, sempre houve a dúvida se ela se concentraria na redução da carga ou na simplificação do caótico sistema de cobrança de impostos. A solução obtida pelo Congresso se concentrou no segundo pressuposto, o da simplificação. Mas um estudo recente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) indica que, quando estiverem totalmente em vigor, as novas regras podem levar a uma economia de R$ 112,6 bilhões por ano para a para a indústria de transformação.
O impacto das distorções hoje existentes no sistema tributário da indústria equivale a 2,9% do faturamento anual do setor, de aproximadamente R$ 145,5 bilhões por ano. Com a reforma, a redução potencial de custos é de 77%, para R$ 32,9 bilhões ao ano. Uma vez implementada, o principal custo para indústria, o de tributos não dedutíveis, que chega a R$ 71,3 bilhões, será zerado.
“A implantação total da reforma tributária irá proporcionar maior competitividade à indústria nacional. Esse é um primeiro passo no sentido de aumentar a presença brasileira na economia global”, afirma José Maurício Caldeira, sócio conselheiro da Asperbras Brasil, que atua em diversos segmentos da indústria e do agronegócio.
Caldeira lembra que a mudança não irá ocorrer da noite para o dia, mas depende da regulamentação da reforma e de um período de transição, pois só estará totalmente em vigor em 2033. Dentre os aspectos relativos à indústria de transformação, José Maurício Caldeira vê como um acerto a redução do peso da burocracia.
Ainda segundo ele, a modernização, que simplifica o sistema tributário, traz um alento para o setor produtivo. Permite à indústria de transformação alocar recursos humanos e financeiros em sua atividade fim. Porém, há grandes entraves ainda a serem superados como o Custo Brasil, que atinge todos que vivem, trabalham, consomem ou produzem no país em R$ 1,7 trilhão por ano, segundo cálculo do Movimento Brasil Competitivo (MBC) em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Indústria Comércio e Serviços (MDIC). Equivale a 20% do Produto Interno Bruto nacional e é maior do que o PIB de vários vizinhos na América do Sul, como Paraguai, Bolívia, Uruguai, Venezuela e Peru.
“É como uma bola de ferro amarrada nos pés do empresário brasileiro”, compara José Maurício Caldeira.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI), em conjunto com as 27 federações estaduais de indústria e com 74 associações industriais, divulgou a Declaração pelo Desenvolvimento da Indústria e do Brasil. No documento, o setor industrial apresenta os 10 princípios orientadores para impulsionar a agenda de desenvolvimento do país. Cinco deles têm relação direta com o Custo Brasil: sistema tributário moderno e eficiente; custo de capital; recursos humanos capacitados para a nova economia; qualidade regulatória; e energia e transportes mais baratos e eficientes. Dentre todos eles, o Brasil começa a enfrentar agora a modernização do sistema tributário.
Além disso, o estudo da Fiesp recomenda que seja adotado o recolhimento do imposto no momento do recebimento da venda, chamado de recolhimento pelo regime de caixa, que acaba com o descasamento de prazo. O custo de R$ 15,5 bilhões anuais de hoje seria zerado.
A Fiesp também defende que a substituição tributária seja mantida somente nos produtos que efetivamente tenham as características de “alta relevância para arrecadação e concentração de produção”, tais como combustíveis, cigarros, medicamentos e bebidas alcóolicas. Se isso for contemplado pela reforma, os custos cairão de R$ 13,6 bilhões para R$ 5,1 bilhões ao ano.
Se as duas recomendações da entidade forem acatadas, o custo total das disfunções do sistema tributário cairá ainda mais, dos R$ 32,9 bilhões pós-reforma para R$ 8,9 bilhões pós-reforma e com ajustes.