Nesta semana dedicada à celebração do Dia dos Povos Indígenas, de 16 a 22 de abril, apesar de algumas ações do Governo Federal e do Supremo Tribunal Federal editadas em respeito aos direitos humanos dos povos indígenas, na verdade, o aumento do desmatamento e conflito por terras, a demora na demarcação das terras indígenas, o aumento de doenças em comunidades indígenas decorrentes da falta de alimentos e água contaminada pela mineração e agrotóxicos, a escalada da violência contra líderes e povos indígenas por madeireiros, garimpeiros e pistoleiros, a invasão de terras indígenas e o índice crescente de morte de crianças Yanomami por malária e desnutrição, além do persistente racismo estrutural, demonstram uma crise humanitária longe de ser solucionada.
Apesar de, em setembro de 2023, o Supremo Tribunal Federal (STF) ter derrubado a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, o Congresso Nacional, em dezembro de 2023, rejeitou o veto do presidente da República ao projeto de lei do marco temporal das terras indígenas (PL 490/07), fazendo crer que a discussão voltará ao STF para exame da constitucionalidade da Lei 14.701/23. Enquanto isso, os projetos de demarcação não concluídos continuam aguardando.
Apesar disso, o presidente da República assinou, nesta última quinta-feira, em solenidade no Ministério da Justiça pelo Dia dos Povos Indígenas, 18 decretos de homologação das terras indígenas Aldeia Velha (BA), que beneficiam o povo Pataxó, e Cacique Fontoura (MT), habitada por Iny Karajá.
O Governo Federal, bem como o Judiciário, vêm tentando atender ao direito constitucional dos indígenas ao usufruto das terras ocupadas tradicionalmente em caráter permanente e necessárias às suas atividades produtivas, necessárias à sua reprodução física e cultural segundo seus usos, costumes e tradições, e imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar (CF, art. 231 §1º).
Não obstante, a luta para vencer a invisibilidade e o preconceito sobre povos indígenas vem sendo assumida em outras frentes, e uma delas é constituída pela fala das mulheres indígenas nos seus diversos biomas, trazendo um espaço de representação e o questionamento do papel das indígenas na luta sobre seus direitos. Para dar visibilidade a essas vozes femininas, sobretudo no âmbito educacional, foi criada em 2023 uma cartilha pela ANMIGA (Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade). A ideia de corpo-território carrega heranças ancestrais, espirituais e toda a sabedoria coletiva desses povos, como vemos por essa fala: “Nós construímos nesse corpo-território desde que somos criança, desde o nosso nascimento. Então, quando pensamos o corpo-território da mulher indígena, é com tudo que a compõe e, principalmente, a partir dessa coletividade, nossas experiências conjuntas que vão dando suporte uma para a outra” (in: Mulheres: Corpos-Territórios Indígenas em Resistência!, por Braulina Baniwa, Joziléias Kaiang e Giovana Macuxi).
A importância do corpo indígena não estar separado do território significa que a luta pela demarcação de terras visa proteger a própria existência, pois carrega a ancestralidade e a educação recebida por meio dos ancestrais, permitindo às gerações mais novas dar continuidade a esse conhecimento milenar. Cuidar desses corpos-territórios dos seis biomas brasileiros que resistem a um processo sistemático desde a invasão é falar em “reflorestarmentes”, desde os nossos corações até nossas mentes. Feliz semana aos povos indígenas e à luta pela preservação de seus corpos-territórios, que acaba por ser uma luta pela preservação de toda humanidade.
A publicação da cartilha pode ser acessada aqui.