Semana foi complicada para mercados de risco

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O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Foto: Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. Foto: Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A semana foi bastante complicada para os mercados de risco em todo o mundo, apesar da expectativa de novas medidas de flexibilização da política monetária e principalmente de estímulo fiscal em diferentes países. Isso, mesmo com a imunização de populações ocorrendo em diferentes países. A expansão do contágio pela Covid-19 em muitos países, duras medidas restritivas de contato social e nova cepa do vírus, assustaram os investidores em todo mundo, junto com outras situações com a expectativa de impeachment de Donald Trump.

No Brasil, situação ainda mais complicada no ambiente político, com o governo sendo pressionado por decisões na área de saúde que não acontecem, o presidente e ministro da Saúde se eximindo de culpa, bate boca político visando eleição da Câmara e Senado e, ainda, desencontros na área econômica permearam a prudência dos investidores. Assim, foi possível assistir realizações de lucros em ações líderes e rotação de ativos no mercado local, desequilíbrio no segmento de câmbio e também nos juros. Lembrando que isso ocorreu após sucessivos recordes de pontuação do Ibovespa, e também dos três principais índices do mercado americano, além de outros como o maior patamar do Nikkei dos últimos 30 anos.

Mas, certamente, o principal vetor do período foi mesmo a Covid-19. Ao longo da semana muitos países engrossaram as restrições de contato, como a França com novo toque de recolher, o Reino Unido suspendendo voos de 16 países, inclusive do Brasil, a Suécia com recorde de óbitos, hospitais nos EUA mais lotados que na primeira onda do vírus e Alemanha e Reino Unido sem saber se irão retirar o lockdown em fevereiro. Portugal promovendo novo confinamento e Israel reduzindo a pandemia pela vacinação massiva da população.

O mar de intranquilidade não parou por aí, com a Pfizer anunciando redução do fornecimento para a Europa, e a União Europeia dizendo que tinham garantido fornecimento. A União Europeia espera-se poder aplicar vacinas produzidas pela AstraZeneca. Faltam insumos para fabricação e isso me faz lembrar a aula de economia de Bolsonaro dizendo que quem fabrica é que tem que se preocupar em vender, achando compradores.

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Nesse contexto, vários foram os dirigentes que se posicionaram ao longo da semana com destaque para membros do Fed. Quase todos os dirigentes correlacionaram a recuperação da economia com a evolução do contágio, inibindo o funcionamento mais normal das economias. Quase todos, e em diferentes países, também sugerindo a necessidade de novos estímulos fiscais (há quem não disponha mais de espaço para tal, como o Brasil).

Porém, destacamos alguns posicionamentos mais tranquilos por parte da ata do BCE, falando na ata da última reunião sobre efeitos positivos das medidas tomadas anteriormente e até mais eficientes que mexer nos juros, além do rápido acionamento previsto do fundo de recuperação. Melhor ainda as declarações do presidente do Fed Jerome Powell, falando sobre a demora da inflação média chegar a meta de 2,0% e também sobre a manutenção dos juros baixos por muito tempo.

As expectativas estiveram também centradas no novo pacote de estímulo de Joe Biden de US$ 1,9 trilhão, focado no reforço do cheque cidadão complementar para US$ 2.000 (Já tinham acertado US$ 600), investimentos em infraestrutura, geração de emprego recursos para escolas e universidades reabrirem e cumprirem protocolos. Mas, os investidores esperavam ainda mais, apesar de trazer algum efeito para expansão do PIB. Já o Japão, pretende rever para pior suas projeções de crescimento, e a China tem o pior contágio de Covid-19 em 10 meses e quer vacinar pelo menos 3,5% da população até o feriado do Ano Novo que acontece em 12 de fevereiro, quando a população sem movimenta fortemente para as províncias.

A novela sobre o impeachment de Trump não teve seu capítulo final, muito embora tenha havido duas votações na Câmara americana (que tem maioria democrata) aprovando a remoção. O Senado precisa votar, mas lembramos que a posse de Biden está marcada para dia 20. A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) também divulgou seu relatório mensal mantendo a previsão de demanda global em 2021 de 5,8 milhões de barris, melhorou as projeções de PIB de 2020 e de 2021, mas espera aumento de produção fora do grupo, apesar de ter reduzido a expectativa de oferta pelo Brasil.

Na Itália, também temos confusão política com renúncia de ministros da coalisão e possibilidade de o governo de Giuseppe Conte ser dissolvido.

Em termos de indicadores de conjuntura destacamos a produção industrial do Reino Unido encolhendo 0,1% em novembro (previsão era zero), o saldo superavitário da balança comercial da Zona do Euro de 25,1 bilhões de euros em novembro e a produção industrial, surpreendendo com alta de 2,5%, quando o previsto era -0,3%. O PIB da Alemanha encolheu 5,0% em 2020 e o déficit fiscal (primeira vez desde 2011) foi de 158,2 bilhões de euros. Na China, a inflação medida pelo CPI (consumidor) em dezembro foi de 0,7%, atingindo 2,5% em 2020.Já o PPI (atacado) teve alta de 1,1% e deflação em 2020 de 1,8%. O saldo da balança comercial de dezembro foi de +US$ 78,2 bilhões e no ano de 2020 de +US$ 535 bilhões.

Nos EUA, a produção industrial registro alta em dezembro de 1,6% três vezes maior que a prevista. As vendas no varejo encolheram 0,7%, bem mais que o previsto de -0,1%. Lá, a inflação medida pelo CPI de dezembro subiu 0,4%e núcleo em +0,1%, deixando o ano de 2020 com inflação de 1,4% e o núcleo em 1,6%. O PPI teve alta em dezembro de 0,3%, e o índice de atividade de Nova Iorque mostrou queda para 3,5 pontos, vindo de 4,9 pontos e com previsão de alta para 6,0 pontos. A confiança do consumidor de Michigan também encolheu na prévia de janeiro para 79,2 pontos, quando o previsto era 79,4 pontos. Lá também tivemos o início da safra de balanços do quarto trimestre com poder de alterar pontualmente a precificação de ativos, com instituições financeiras mostrando bons resultados, mas com investidores reagindo mal no que tange à expansão de receitas.

No segmento local, muita confusão política e Bolsonaro destemperado. Também pudera, a pressão sobre o governo ficou enorme no que tange a postura de imunizar a população com vacinas. Falta tudo, e o STF cobra sobre estoques de seringas nos estados e municípios para vacinar, e ainda nem temos vacinas. O governo se atrapalha, manda avião buscar vacina na Índia, e a Índia diz que as exportações vão demorar. A Coronavac só deve ser liberada em reunião da Anvisa no domingo e governo marcando vacinação para 20/01. Enquanto isso, pacientes no Amazonas morrem sem ter oxigênio para inalar e o governo diz que fez o possível. As mortes pelo vírus já atingiram 207 mil pessoas e os número de infectados para 8,3 milhões de pessoas.

Ao longo da semana, Rodrigo Mais fez muitas críticas contra Bolsonaro. O presidente fez campanha para tentar emplacar Arthur Lira como presidente da Câmara e pressão sobre parlamentares da bancada ruralista e, no Senado, a confusão foi criada com a candidatura de Simone Tebet. Além disso, encrenca do presidente também com o presidente do Banco do Brasil, e todos sem saber se foi ou não demitido. Só lembrando que, por conta disso, os problemas na economia vão se avolumando e ainda existe o espectro de nova greve de caminhoneiros, por conta de combustíveis e acordos não cumpridos.

Na economia, a pesquisa semanal Focus do BC veio com poucas e diminutas alterações, o saldo da balança comercial estava com superávit de US$ 1,1 bilhão até 10/01, o fluxo cambial até o dia 8 positivo em US$ 1,31 bilhão (pelo canal financeiro US$ 1,26 bilhão). A inflação oficial pelo IPCA de dezembro acelerou para 1,35% (anterior em 0,89%), deixando o ano com alta de 4,50%, no teto das projeções e com difusão ampliando para 72,1% (de 66,6%). Com isso, o Forward Guidance deve cair na reunião de janeiro, e a Selic pode subir já no início do segundo semestre ou antes, se as pressões prosseguirem.

O IBGE também anunciou que o volume de serviços prestados cresceu 2,6% em novembro, mas no ano encolhe 8,3%, demorando a reagir e abaixo do período pré-pandemia. Já as vendas no varejo de novembro encolheram 0,1% e o varejo ampliado cresceu 0,6%. No ano o varejo restrito cresce 1,2% e o ampliado, por conta do setor automotivo cai 1,9%. Dezembro foi puxado para baixo por supermercado, afetado pela inflação e auxilio emergencial acabando.

No mercado acionário, destaque negativo para as ações líderes com realizações de lucros recentes e busca rápida por alguma proteção. No entanto, os investidores estrangeiros, seguindo o que aconteceu nos três últimos meses de 2020, continuaram alocando recursos na Bovespa, e até dia 13, já tinham ingressado com R$ 16,55 bilhões.

 

Perspectivas – A situação criada pela segunda onda da Covid-19 começa a mostrar sinais desalentadores para as economias, caso siga a tendência demonstrada em todos os últimos dias deste ano de 2021. Basta ver que quase todos os países, com maior ou menor agilidade estão impondo novas barreiras de contato social para evitar a ampliação da infecção e a propagação de novas variantes do vírus. Se a situação não for controlada pela imunização massiva da população, a recuperação pode minguar, e muitos países terão pouco ou nenhum espaço para flexibilizar políticas monetárias, e/ou produzir mais estímulo fiscal.

Estão certos aqueles que atribuem as expectativas do ano de 2021, ao controle do vírus, mas cada vez que proteções são levantadas, mas difícil será calibrar o reajuste das economias no pós-pandemia.

Aqui, só para variar um pouco, a situação ainda é pior com o despreparo e atraso para começar a imunizar a população, o péssimo exemplo negativista dado pelo presidente desde o início, a “campanha” contra o uso de máscaras e vacinas para um contingente de pessoas desinformadas, a falta de recursos para seguir apoiando quem necessita, os interesses comezinhos de muitos políticos, a politização da pandemia que retarda tudo, etc.

O país está cansado disso tudo e precisa mudar. Mas como? Quem fará isso? Precisamos começar a gerir o Brasil e na direção certa e não do populismo exacerbado. Precisamos de reformas, privatizações e concessões, cortes de gastos, marcos regulatórios e segurança jurídica. Precisamos dos três Poderes interagindo uníssonos. Pode ser bonito escrever isso, mas está complicado ver isso acontecendo. Primeiro temos que esperar o que acontecerá com as lideranças do Congresso, ver se as pessoas vão tomar a vacina e o governo vai começar, de fato, a governar.

Enquanto isso não ocorre, resta olhar pelo lado da análise técnica, onde não deveríamos perder o patamar de 119 mil pontos, e torcer para que novos fluxos de recursos continuem a chegar no mercado para absorver realizações, e que os indicadores da economia não desandem.

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Alvaro Bandeira

Sócio e economista-chefe do Banco Digital Modalmais

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