Sudoeste da França: entre os Pirineus e o Atlântico

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Vinhos do sudoeste da França (foto de Míriam Aguiar)
Vinhos do sudoeste da França (foto de Míriam Aguiar)

Em breve temporada pela França, fui visitar um pouco mais das regiões vitivinícolas do sudoeste do país, cuja produção ainda é pouco conhecida no Brasil. Um dos motivos para retornar à região se trata de sua extensão e diversidade; outro é por admirar certos vinhos que chegam em reduzido volume no Brasil; e, finalmente, a curiosidade de entender as diferenças existentes entre o estilo de algumas cepas em suas regiões de origem, comparativamente às versões que temos na América do Sul.

Dessa vez, fui para as AOPs próximas de Pau, uma cidade que não é de todo grande para as nossas proporções, mas que é um centro importante para a área do sudoeste mais próxima do Atlântico e dos Pirineus. Cidade acolhedora com bela paisagem histórica e natural. Ali está colado a Jurançon, vilarejo e AOP que me motivou a conhecê-los pela qualidade dos seus vinhos brancos secos e doces. A cerca de 1 hora de Pau, se encontram ainda duas AOPs que dividem o mesmo território, mas com especialidades distintas: Madiran e Pacherenc du Vic-Bilh.

Míriam Aguiar em vinícola em Madiran (foto arquivo pessoal)
Míriam Aguiar visita vinícola em Madiran

O Madiran é voltado para produção de vinhos majoritariamente feitos da Tannat, cepa que se originou no sudoeste, mas que vem se consagrando na América do Sul, emblema da produção uruguaia e também muito utilizada no Brasil. Pacherenc du Vic-Bilh significa, em dialeto local (béarnais), “uma fileira de vinhas no velho país”. A AOP é voltada para a produção de vinhos brancos, assim como Jurançon, com cepas e estilos semelhantes, mas com certas diferenças. O vilarejo de Madiran é bem pequeno, mas rodeado de vinícolas, nada em enorme quantidade, com alguns rótulos já importados pelo Brasil.

As duas AOPs foram autorizadas em 1948. Madiran conta com uma porcentagem de aproximadamente 70% de Tannat, complementados especialmente com Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc. Apesar das dificuldades em amenizar a estrutura tânica desta cepa campeã em taninos, ali há uma boa sinergia entre clima e solo para o seu desenvolvimento.

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A região conta com a proteção da cadeia dos Pirineus, a sul, e a moderação do oceano Atlântico, a oeste, que leva umidade aos vinhedos, provocando leves precipitações no verão. Assim, há uma variação climática entre os dias, que permite o prolongamento da maturação da Tannat, não só em nível tecnológico (evolução dos ácidos e açúcares do suco da uva), mas também em nível fenólico, permitindo que compostos presentes na casca, como antocianos (coloração) e taninos amadureçam corretamente.

Em relação aos solos, há uma presença de três principais vertentes em áreas distintas: argilo-calcário, argilo-cascalho e seixos (pedregoso) – o primeiro é mais frio e absorvente, o segundo, intermediário, e o último, mais quente. O estudo mais preciso dessas constituições permite uma adequada orientação das plantações dos vinhedos e contínuo acompanhamento, visando equilibrar as insolações com os padrões do solo.

Essa maturação hoje se apresenta bem calculada e elevou significativamente a qualidade dos vinhos, que, no passado, tinham uma imagem de excessivamente duros. Pude verificar in loco como os vinhos já se apresentam suavizados quando disponibilizados ao mercado, apesar de sua boa estrutura e potencial de longevidade. Pude sentir também um ótimo equilíbrio provocado pela boa acidez, prova disso é que muitos vinhos que chegam a 14% e 14,5% de álcool nos surpreendem por não provocarem uma sensação de muito corpo.

Foi na região do Madiran que foi criado o método de micro-oxigenação durante a produção de vinhos, hoje largamente utilizado no mundo inteiro, embora nem todos a defendam ali. Já a passagem dos vinhos tintos por barrica pelo período de um ano parece comum: há um bom uso da madeira, sem aporte aromático excessivo, valorizando a expressão da fruta e tornando o paladar mais acessível. Outras AOPs que se destacam no uso da cepa Tannat são Saint Mont e Irouléguy, a primeira colada a Madiran, e a segunda, mais a sul, junto dos Pirineus.

Sigo falando sobre essas regiões e seus produtores nos próximos artigos.

 

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