A agressiva guerra tarifária entre Estados Unidos e Canadá trará lições importantes, a curto prazo, para os demais países do continente americano, notadamente para aqueles situados ao sul da Linha do Equador, como é o caso do Brasil.
Denys Arcand – cineasta canadense – com películas criativas como A queda do Império Americano (1986), ou O Declínio do Império Americano (2019) buscava descrever os dilemas e contradições da população daquele país de dimensões continentais, dotado de grande biodiversidade e detentor da terceira maior reserva petrolífera do planeta. Numa sociedade marcada pelo domínio da mercadoria, praticar uma social-democracia inclusiva era a desafio canadense, aliás sempre destacado na filmografia do autor.
No país vizinho, a sociedade canadense enfrenta uma administração liderada por Trump, cujos objetivos inegáveis da plutocracia dirigente são o fortalecimento do dólar como moeda reserva internacional, a garantia do suprimento de fontes minerais e energéticas estratégicas, negócios lucrativos para sua grande burguesia e paulatina reindustrialização geradora de empregos de qualidade.
No Brasil, o desafio de curto prazo de sua classe dirigente é domar a alta incômoda no preço dos alimentos, cuja ação corrói a popularidade do governo. Uma família de baixa renda gasta mais de um terço de seus ganhos mensais comprando bens de primeira necessidade, cada dia mais caros e escassos.
Somos o maior produtor mundial de café, mas a prioridade pela exportação e a boa lucratividade no exterior retiram esse item crucial da mesa do trabalhador brasileiro. Outro exemplo é a carestia no preço do ovo, provocada pela gripe aviária e pelo imenso consumo na economia americana. Definir cotas de exportação, neste momento de escassez relativa, poderia ser uma saída, compensando o produtor indiretamente.
Para um salário mínimo de R$ 1.518 reais, o custo da cesta básica, em cidades importantes da região Sudeste, atinge quase R$ 900 mensais. Nesse contexto, segurança alimentar é uma variável crucial no conjunto das políticas públicas, junto com a segurança energética. Deixamos de praticar políticas públicas de estoques reguladores de bens de primeira necessidade e precisamos com urgência voltar a praticá-las.
A tradição brasileira é de baixa atividade econômica e política, entre o Natal e o Carnaval. Esse ano, a conjuntura internacional de grande turbulência negou essa “verdade”. Nessa conjuntura desafiadora, cabe à classe dirigente brasileira arregaçar as mangas e reverter esse mal-estar que vigora, mesmo diante de um país que, pelo terceiro ano consecutivo, apresenta níveis de atividade econômica bastante satisfatórios.