O índice de preços ao consumidor dos Estados Unidos (CPI) atingiu 7,5% no acumulado em doze meses até janeiro, o maior patamar em 40 anos. “Acreditamos que a inflação cairá do atual patamar de 7,5%, para 5,4% em junho, e 3,7% no final de 2022. É um cenário diferente do consenso de mercado, que espera que a inflação demore mais para cair”, destacou em relatório divulgado nesta terça-feira a XP Investimentos.
Conforme o texto, assim como em boa parte do mundo, a inflação no país está se mostrando mais alta e mais duradoura do que o esperado por diferentes motivos, entre eles: (1) o desequilíbrio nas cadeias globais de produção, com o “abre e fecha” de fábricas e portos; (2) a demanda reprimida durante os períodos mais agudos da pandemia; (3) a alta nos preços das commodities; e (4) o aumento no custo da mão de obra.
Os membros do Comitê de Política Monetária do Fed (o Fomc) passaram a demonstrar preocupação com a persistência da pressão sobre os preços, e com sua credibilidade em jogo, sinalizaram que vão começar a reverter os estímulos em breve. “Em outras palavras, o FED vai começar a subir os juros”, cita o relatório.
Aumento dos juros
Segundo os autores da análise, Alberto Bernal, estrategista internacional da XP e Francisco Nobre, economista da XP, com a persistência da alta inflação nos EUA, o Fed vem sinalizando um aumento na taxa básica de juros, terminando o ciclo de estímulos monetários mais fortes. É certo que o Fed vai elevar os juros, mas existem incertezas a respeito do ritmo de alta e os impactos nos mercados.
Eles explicam que ao subir os juros, o Fed reduz a quantidade de moeda em circulação na economia e desestimula o crédito. Também lembram que o consumo mais controlado contribui para segurar a alta de preços, reduzindo a inflação. Esse é o plano.
“E o Fed não está sozinho. Diversos países emergentes, com Chile, México e Colômbia – além, claro, do Brasil – estão subindo juros. Entre os desenvolvidos, o Banco Central da Europa (ECB) começou a sinalizar a possibilidade de um aperto monetário ainda neste ano, enquanto o Reino Unido elevou sua taxa básica de juros nas duas últimas reuniões – levando de 0,1% para 0,50%”, ressaltam.
“No nosso cenário base, acreditamos que a economia americana vai se normalizar ao longo do ano, reduzindo a pressão inflacionaria. Isso possibilita que o Fed conduza a política monetária de forma mais gradual nos próximos dois anos, chegando em 2,0% no final de 2023. Este cenário tende a ser positivo para mercados globais, principalmente para economias latino-americanas”, destacou o relatório.
De acordo com a análise, riscos relacionados a normalização da economia americana pós-pandemia e as tensões geopolíticas entre a Rússia e a Ucrânia, podem trazer volatilidade e perdas aos mercados globais em 2022.
Assim, com a inflação em queda, o Fed poderá conduzir um ajuste bastante gradual – ou seja, subir os juros aos poucos ao longo do ano. Especificamente, vemos o Fed elevando os juros básicos três vezes esse ano e quatro vezes no ano que vem, atingindo 2,0% no final de 2023. É um ajuste mais lento do que o esperado hoje pelo mercado, com base nos preços de ativos (como as taxas de títulos públicos com vencimento de longo prazo).
Neste cenário, o estudo prevê um ano forte para os mercados globais, principalmente na América Latina. Nas economias desenvolvidas, projetamos o principal índice de ações nos Estados Unidos, o S&P500, atingindo 4.900 pontos no final deste ano, enquanto as bolsas Europeias terão um ano ainda mais forte por estarem relativamente desvalorizadas.
O quadro também é positivo para as economias da América Latina, que serão beneficiados pelo preço elevado das commodities e pelo fato de seus ativos financeiros (bolsa, taxa de câmbio) estarem em patamares já bem desvalorizados.
Petróleo a US$ 140
Se as tensões geopolíticas entre a Rússia e a Ucrânia se intensificarem, o impacto sobre o preço do petróleo tende a ser bem negativo, com o preço podendo chegar a até US$140 o barril (de US$ 95 hoje). Neste caso, porque a pressão sobre os preços viria da oferta de commodities energéticas, pouco adiantaria o Fed reagir com juros mais elevados. Assim, a trajetória dos juros seria a mesma do cenário base. Mas a inflação e a aversão ao risco dos investidores seriam mais elevadas.
A economia global se defrontaria com custos de produção em alta (dada a dependência da produção global a produtos derivados de petróleo), resultando em um processo de estagflação – a combinação de recessão econômica, com altas na inflação.
Além disso, o nível de incerteza aumentaria consideravelmente, resultando em uma deterioração nas condições de financiamento, e então, uma queda adicional nas bolsas globais. Também veríamos provavelmente a saída de capital de países emergentes para desenvolvidos – por serem considerados mais seguros – levando a uma desvalorização do real (em relação ao dólar).
Menores estímulos e maiores juros no mundo reduzem a atratividade relativa de ativos em países mais arriscados, como o Brasil. Isso ocorre devido a redução do chamado diferencial de juros. Em bom português: com juros maiores lá, investidores pensam um pouco mais sobre investir aqui, onde o risco é maior.
Assim, o rumo dos juros nos EUA também impacta o rumo dos nossos juros aqui. Quanto maiores os juros por lá, menor a entrada de dólares aqui (logo, mais desvalorizada nossa moeda), o que por sua vez impacta nossa inflação. Contribuindo assim, para maiores juros por aqui também.
Se a inflação se provar mais persistente – porque a demanda continuou aquecida e/ou os problemas de oferta global se prolongaram – o Fed terá que ajustar a política monetária de forma mais agressiva. Os juros subiriam mais rápido, atingindo uma taxa final mais alta, além no nível “neutro” de 2% (aquele que equilibra a economia, sem gerar pressões inflacionárias).
Neste cenário, a curva de juros nos EUA ficaria negativamente inclinada, ou seja, juros de títulos para vencimentos curtos mais altos do que para vencimentos longos. É um sinal de que o mercado estaria antecipando uma recessão em 2023, levando a quedas adicionais nas bolsas. Com o cenário menos favorável, investidores reduziriam posições em países emergentes, afetando negativamente as moedas das economias da América Latina.